Governo apenas garante salário base quando os contratos colectivos caducarem
Parceiros sociais começam a discutir as novas propostas de alteração ao Código do Trabalho na próxima terça-feira. Em cima da mesa está a possibilidade de reduzir ou retirar benefícios aos trabalhadores, quando os contratos colectivos caducam.
Actualmente, a lei prevê que quando os contratos colectivos caducam, os trabalhadores mantêm a “retribuição” - com todas as componentes que lhe estão associadas, o tempo de trabalho e a categoria, assim como os regimes de protecção social alternativos à Segurança Social. Na proposta que enviou aos patrões e sindicatos, o Governo altera um pormenor que faz toda a diferença. Em vez de retribuição, passa a referir “retribuição base”, uma mudança que terá implicações directas no salário que o trabalhador leva para casa no final do mês.
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Actualmente, a lei prevê que quando os contratos colectivos caducam, os trabalhadores mantêm a “retribuição” - com todas as componentes que lhe estão associadas, o tempo de trabalho e a categoria, assim como os regimes de protecção social alternativos à Segurança Social. Na proposta que enviou aos patrões e sindicatos, o Governo altera um pormenor que faz toda a diferença. Em vez de retribuição, passa a referir “retribuição base”, uma mudança que terá implicações directas no salário que o trabalhador leva para casa no final do mês.
As convenções colectivas (negociadas entre sindicatos e associações de empregadores ou empresas) estabelecem melhores condições de trabalho e salariais, incluindo subsídios de turno, de penosidade (por trabalhos pesados), pagamento acima da lei do de trabalho nocturno ou das isenções de horário de trabalho, entre outros. Agora, mesmo que essas convenções caduquem, os trabalhadores têm a garantia de que essas condições se mantêm. No futuro, apenas têm assegurada a retribuição base. Em relação ao resto, ou perdem as regalias (é o caso do subsídio de turno ou do subsídio de prevenção, que não está previsto no Código do Trabalho), ou passam a receber de acordo com o que prevê a lei.
Fausto Leite, advogado especialista em legislação laboral, alerta que esta alteração legislativa “terá impactos significativos nas empresas públicas”, onde os contratos prevêem um conjunto alargado de “benesses remuneratórias”. “O que permanece é apenas a retribuição base. Tem um alcance prático muito grande e retira muito do que é o lado bom de uma convenção”, sintetiza Tiago Cortes, advogado na sociedade PLMJ.
Na prática, a proposta do Governo vem prever uma nova situação em que é permitido reduzir o salário, nota Pedro Furtado Martins, advogado e professor na Universidade Católica. É que o Código do Trabalho diz que o empregador está proibido de diminuir a retribuição “salvo nos casos previstos” na lei. Até agora, um dos casos mais comuns de redução salarial era o lay off (quando as empresas suspendem os contratos individuais de trabalho em situações de crise).
A alteração ao artigo 501º do Código do Trabalho promete muita polémica com os sindicatos. É que associada à redução dos salários, o Governo acelera a caducidade dos contratos colectivos. Tal como o PÚBLICO já tinha adiantado, o Governo aceitou a proposta das confederações patronais e vai alterar os prazos de vigência das convenções. Agora, as cláusulas que determinam que a convenção só caduca quando for substituída por outra têm a validade de cinco anos, contado após a última publicação integral da convenção ou da apresentação de uma proposta de revisão dessa mesma cláusula. Esse prazo passará a ser de dois anos. Já os 18 meses durante os quais os contratos colectivos se mantém válidos após a denúncia passarão para seis meses.
A proposta em cima da mesa é a mesma que foi enviada ao Governo por todas as confederações patronais e tem a oposição dos sindicatos. Já em relação ao pagamento do trabalho extra, o ministro do Emprego, Pedro Mota Soares, não aceitou a proposta dos patrões e foi moderado.
A suspensão das normas das convenções colectivas de trabalho relativas às horas extraordinárias vai ser prolongada por mais cinco meses (os patrões pediam mais dois anos). Os trabalhadores vão continuar a receber um acréscimo por cada hora além do horário normal que oscila entre os 25% e os 50%, quando em alguns casos os contratos colectivos previam acréscimos entre 50% e 100%.
Suspensão em caso de crise
Outra das propostas enviadas pelo Governo aos parceiros sociais também já tinha sido anunciada: a possibilidade de suspender as convenções colectivas em situação de crise empresarial e desde que essa medida “seja indispensável para assegurar a viabilidade e a manutenção dos postos de trabalho”.
De acordo com a proposta de lei ontem conhecida, passa a ser possível - por motivos de mercado, estruturais, tecnológicos, catástrofes ou outras situações graves - que o empregador e as comissões intersindicais ou de sindicatos acordem a suspensão das convenções ou de algumas das suas normas. O acordo tem de ser por escrito e ser publicado no Boletim do Trabalho, referindo o período durante o qual se mantém a suspensão.
O regime é muito semelhante ao do lay off; a grande diferença é que só poderá haver suspensão mediante um acordo. Para os advogados consultados pelo PÚBLICO, o regime coloca à partida várias questões, nomeadamente o facto de apenas se falar em comissões de sindicatos. “Então e nas empresas em que não há essas comissões como é que se faz”, questiona Furtado Martins.