Jardim Gonçalves diz que a União Bancária europeia "não se vai efectivar"
Para o ex-presidente e fundador do BCP, no 25 de Abril a "independência imediata" das ex-colónias teria de ser dada pois Marcello Caetano "não estava a conseguir resolver o problema da autodeterminação".
Já sobre a descolonização, no pós-25 de Abril, defende que “não se pode censurar ninguém”, pois “não havia condições” para seguir outro caminho.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Já sobre a descolonização, no pós-25 de Abril, defende que “não se pode censurar ninguém”, pois “não havia condições” para seguir outro caminho.
O ex-presidente do maior banco privado português durante dez anos, e hoje com 79 anos, viu prescreverem várias contra-ordenações imputadas pelo Banco de Portugal e pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, por alegada prestação de informações falsas (as chamadas “contas inverídicas”), entre 2000 e Março de 2005, e ainda por manipulação e perturbação do mercado bolsista. Um tema que não aborda na entrevista ao jornal i, apesar de ter ainda correrem contra si acções movidas pelo Ministério Público por burla em co-autoria.
Jardim Gonçalves defende que o processo de União Bancária europeia não se vai “efectivar, porque há muitos países importantes que não a querem, como a Alemanha” e duvida mesmo da sua necessidade, pelo menos enquanto não se ajustarem outros problemas.” O grande objectivo da União Bancária é permitir que os bancos e os utilizadores finais do crédito sejam avaliados pelos seus méritos e não estejam sujeitos ao risco de estarem sedeados num país [daí, ser necessário que todos estejam sujeitos aos mesmos critérios de supervisão e de apoio].
“Se não se criarem condições para os devedores pagarem, os credores ficam com um problema grave”, acredita o ex-presidente do BCP, que liderou o grupo até 2005, e que lembra que “os países importantes” e “nossos credores” teriam falado “com mais delicadeza em relação a nós”, se Portugal não tivesse assumido “essa dívida, que ficou nos bancos portugueses”, o que “enfraqueceu a capacidade de diálogo, de negociação.”
Já no que se refere ao sistema de supervisão bancária europeia [a união bancária inclui a supervisão única, centrada no Banco Central Europeu], o ex-banqueiro afirma: “Tenho dúvidas que o mercado não se ressinta da supervisão, que é muito difícil feita à distância” e “estas coisas precisam de proximidade, de conhecimento directo da gestão”. Por isso, há risco de tudo “acontecer numa linha de democracia cega, que não vai dar saúde às instituições”. A 15 de Abril, no Parlamento Europeu, os eurodeputados votaram em definitivo três peças legislativas fundamentais à edificação da União Bancária que arranca em Novembro.
Apesar de não se pronunciar na entrevista sobre a actual situação do sistema financeiro, incluindo a do banco que fundou, o BCP, que reportou um prejuízo de 740 milhões de euros em 2013, nota que, independentemente da banca ser privada ou nacionalizada, quem “domina os bancos chega a todo o lado”.
Jardim Gonçalves pronuncia-se ainda sobre o 25 de Abril e defende que o processo de descolonização em Portugal não poderia ter sido diferente, porque teria de ser sempre dada a “independência imediata”. “Antes, muita gente do MPLA entendia que devia haver independência, ou um estatuto completamente diferente, que o governo nunca aceitou. Era a política de Salazar, do Minho a Timor”, refere o ex-banqueiro que cumpriu o serviço militar durante quatro anos em Angola, quando “já era evidente que o governo não estava a conseguir resolver o problema da autodeterminação, que era vento dominante”.
Jardim Gonçalves sublinha que “os Estados Unidos apoiavam, a União Soviética apoiava e Portugal não estava a conseguir, diplomaticamente, resolver o tema”. “A guerra colonial não era uma guerra clássica, era de guerrilha” e “no momento em que há o 25 de Abril não há qualquer hipótese de existirem conversações, tinha de haver independência imediata.”
Para o ex-presidente do BCP, o 25 de Abril “está acabado, já teve o seu momento” e que lhe “parece bem que se recorde” a revolução, para que “sirva de reflexão para fazer melhor”.