A adolescente
François Ozon nunca será o génio que demasiado prematuramente chegou a ser anunciado. Mas está a tempo, porque habilidade não lhe falta, de ser um artesão sólido, fiável e, em consequência, estimável. Jovem e Bela é o seu segundo filme seguido (depois de Dentro de Casa, eficaz incursão num universo hitchcoclo-chabroliano) a fazer-nos acreditar nisso.
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François Ozon nunca será o génio que demasiado prematuramente chegou a ser anunciado. Mas está a tempo, porque habilidade não lhe falta, de ser um artesão sólido, fiável e, em consequência, estimável. Jovem e Bela é o seu segundo filme seguido (depois de Dentro de Casa, eficaz incursão num universo hitchcoclo-chabroliano) a fazer-nos acreditar nisso.
Longe dos gestos grandiloquentes que o fizeram notar (8 Mulheres) e confundir com um “Fassbinder francês”, parece ter adoptado um tom menor, francamente menos ostensivo, a tender para o laconismo e para o silêncio. Esse é um dos segredos de Jovem e Bela - as elipses, os silêncio explicativos; os outros dois são a sua queda para filmar raparigas jeunes et jolies (como já sabíamos desde a Ludivine Sagnier de Swimming Pool) e a forma, bastante inteligente, com que conta uma história de iniciação sexual de contornos um pouco extremos conciliando delicadeza e algum desaforo, vitalismo e uma certa sombra, para fazer de Jovem e Bela um conto de passagem à idade adulta capaz de descobrir, para além de um “sentido” que permanece saudavelmente indefinido, uma amplitude emocional que nem por ser ambígua deixa de ressoar como profundamente justa.Conheçam então Marine Vacth, rosto primaveril perfeitamente à altura do título do filme, e o seu mergulho indiferente na prostituição de luxo. Essa indiferença é a chave do filme, e aquilo que Ozon, que nunca explica por que razão a miúda se mete naquela vida, procura no seu rosto durante as muitas cenas de sexo (aliás bem filmadas, na justa medida entre naturalidade e sensualidade “de cinema”). Há corpos, mas é como se nunca os houvesse até haver um corpo morto - o de um cliente que morre em plena função. O filme vira aí, e faz virar a sua personagem, como se o sexo se tornasse subitamente um assunto grave, “des-virtual”, onde a inocência deixa de ter lugar. Mas dizer isto é já incorrer em delito de interpretação, que se arrisca a manchar o essencial do filme: o contraste entre a luz, “jovem e bela”, irradiada por Marine Vacth, e o suave negrume, feito de fotografia cinzenta (o encontro, no fim, com a personagem de Charlotte Ramplin), em que Ozon a vai progressivamente envolvendo.