O tímido que se transcende através da música
Chega tarde ou mesmo a tempo, dependerá das perspectivas e do grau de exposição à música do norueguês Terje Olsen, mais conhecido por Todd Terje. O próprio ironiza com o facto denominando o primeiro álbum com o título It’s Album Time. E ironiza porque há dez anos que dá que falar, cotando-se ao lado do compatriota Lindstrom como principal representante da cena neo-disco nórdica, tendo lançado uma mão cheia de máxi-singles e re-edits, mas nunca um álbum. Porquê? Muita preguiça, alguma falta de confiança e o facto de ter sido pai há um ano, tem dito nas entrevistas com a habitual franqueza desarmante.
É verdade. Já foi há dez anos que, ao lado dos compatriotas Hans-Peter Lindstrom, Prins Thomas e Bjorn Torske ou o duo sueco Studio, foi ancorado na reavaliação da música disco. Nessa altura era estudante de física e nos tempos livres actuava como DJ, sonhando viver da música. Acabou por cumprir o desejo. Antes aprendera piano na escola, embora o seu despertar para a música tivesse acontecido no coro da igreja de Mjondalen, vila nos arredores de Oslo, onde cresceu.
Durante a década passada o homem de 33 anos com bigode dourado teve tempo para lançar música sua e recriar a alheia, percorrer as praias de Ibiza e do resto do mundo e lançar sucessos para as pistas mais selectas. O ano passado até produziu temas para os Franz Ferdinand, para já não falarmos do facto de Robbie Williams se ter baseado no seu single de 2004, Eurodans, para o êxito Candy. Mas álbum da sua autoria, nem vê-lo.
Em 2010, depois de lançar dois singles originais pensou-se que isso seria o prenúncio de um álbum. Mas não, voltou tranquilamente para os re-edits, utilizando uma série de pseudónimos (Tangoterje, Chuck Norris, Pitbullterje ou Wade Nichols), providenciando a releitura de temas de gente tão diferente como Michael Jackson, Chic, Thin Lizzy, The Bangles ou Paul Simon.
O momento clarificador parece ter sido o lançamento, em 2012, de It’s The Arps EP, na sua editora, a Olsen. Foi a partir daí que o imperativo de um longa-duração se começou a desenhar. E ele aí está, repleto de sintetizadores cósmicos, ambientes exóticos quase a tombarem para o ilustrativo e ritmos evolutivos sintéticos. Há espaço para a celebração dançante e para o enlevo tranquilo, como Johnny and Mary, original de Robert Palmer que é recriado com a voz do convidado Bryan Ferry.
A colaboração aconteceu depois do filho de Bryan Ferry ter convidado Terje para este criar uma remistura para um tema do pai. O par acabou por se conhecer em Oslo, tendo aí gravado com Terje a surpreender-se com os conhecimentos do ex-Roxy Music. Ao que parece sabia tudo sobre sintetizadores analógicos e como operar com eles, o que não é comum, disse numa entrevista.
A medida das proporções
Nem tudo é novo no álbum. Há versões de quatro temas que já eram conhecidos, mas isso não diminui um disco onde Todd Terje mostra ser um músico-produtor sólido na diversidade. Em entrevista recente ao The Guardian recordava que quando começou não podia proporcionar à audiência apenas música house: “tinha que levar funk, disco, bossa ou música latina.”
Essa variedade sente-se no álbum, com pormenores de salsa em temas como Svensk sas, ou do jazz de fusão em Alfonso muskedunder, por exemplo. Aliás essa descontracção quase insolente é uma das marcas de alguém que não parece nada interessado em corresponder às expectativas de quem se identifica apenas com um tipo de música. O seu propósito é divertir-se, proporcionado prazer, sem grande autoconsciência.
Mas isso não significa abdicar dos valores criativos mais exigentes. A música disco de Terje é mais espacial que excessiva, embora não resista a um efeito de sintetizador, a um arranjo mais faustoso ou a uma percussão mais eloquente. Mas o que o distingue é a exacta medida das proporções. Mesmo quando o humor entra em acção, as longas digressões instrumentais que propõe, são polidas e equilibradas. A instrumentação é orgânica, as texturas luxuriantes e os adornos orquestrais e a acção rítmica tanto levam ao frenesim, como ao envolvimento pacificador. É como se esperássemos por um clímax que acaba por nunca acontecer.
É como se o sentido épico de alguns temas fosse permanente. É o que acontece com Delorean dynamite, o tema onde se sente de forma mais evidente a influência do veterano Giorgio Moroder que, o ano passado, voltou à ribalta, em grande parte por causa dos franceses Daft Punk, com quem colaborou.
Terje diz-se um tímido. Precisa da mediação da música, e da sua actividade de DJ, para se transcender. “O sítio onde me sinto mais confortável é a minha casa. É também por isso que demorei tanto tempo a lançar este álbum. Gosto de estar na sombra. Para além disso agora tenho um bebé, o que é uma óptima desculpa para estar em casa e fazer música.”
Pelo menos nos próximos meses é pouco crível que venha a conseguir estar muito tempo em casa. Aguarda-o uma digressão de promoção ao novo álbum, onde pela primeira vez actuará ao vivo – estará a 6 de Junho no festival Primavera Sound do Porto.
Para a mesma diz que tem comprado equipamento novo, embora o seu propósito de sempre seja fazer música que soa estranhamente antiquada, no sentido mais saudável da expressão.
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Chega tarde ou mesmo a tempo, dependerá das perspectivas e do grau de exposição à música do norueguês Terje Olsen, mais conhecido por Todd Terje. O próprio ironiza com o facto denominando o primeiro álbum com o título It’s Album Time. E ironiza porque há dez anos que dá que falar, cotando-se ao lado do compatriota Lindstrom como principal representante da cena neo-disco nórdica, tendo lançado uma mão cheia de máxi-singles e re-edits, mas nunca um álbum. Porquê? Muita preguiça, alguma falta de confiança e o facto de ter sido pai há um ano, tem dito nas entrevistas com a habitual franqueza desarmante.
É verdade. Já foi há dez anos que, ao lado dos compatriotas Hans-Peter Lindstrom, Prins Thomas e Bjorn Torske ou o duo sueco Studio, foi ancorado na reavaliação da música disco. Nessa altura era estudante de física e nos tempos livres actuava como DJ, sonhando viver da música. Acabou por cumprir o desejo. Antes aprendera piano na escola, embora o seu despertar para a música tivesse acontecido no coro da igreja de Mjondalen, vila nos arredores de Oslo, onde cresceu.
Durante a década passada o homem de 33 anos com bigode dourado teve tempo para lançar música sua e recriar a alheia, percorrer as praias de Ibiza e do resto do mundo e lançar sucessos para as pistas mais selectas. O ano passado até produziu temas para os Franz Ferdinand, para já não falarmos do facto de Robbie Williams se ter baseado no seu single de 2004, Eurodans, para o êxito Candy. Mas álbum da sua autoria, nem vê-lo.
Em 2010, depois de lançar dois singles originais pensou-se que isso seria o prenúncio de um álbum. Mas não, voltou tranquilamente para os re-edits, utilizando uma série de pseudónimos (Tangoterje, Chuck Norris, Pitbullterje ou Wade Nichols), providenciando a releitura de temas de gente tão diferente como Michael Jackson, Chic, Thin Lizzy, The Bangles ou Paul Simon.
O momento clarificador parece ter sido o lançamento, em 2012, de It’s The Arps EP, na sua editora, a Olsen. Foi a partir daí que o imperativo de um longa-duração se começou a desenhar. E ele aí está, repleto de sintetizadores cósmicos, ambientes exóticos quase a tombarem para o ilustrativo e ritmos evolutivos sintéticos. Há espaço para a celebração dançante e para o enlevo tranquilo, como Johnny and Mary, original de Robert Palmer que é recriado com a voz do convidado Bryan Ferry.
A colaboração aconteceu depois do filho de Bryan Ferry ter convidado Terje para este criar uma remistura para um tema do pai. O par acabou por se conhecer em Oslo, tendo aí gravado com Terje a surpreender-se com os conhecimentos do ex-Roxy Music. Ao que parece sabia tudo sobre sintetizadores analógicos e como operar com eles, o que não é comum, disse numa entrevista.
A medida das proporções
Nem tudo é novo no álbum. Há versões de quatro temas que já eram conhecidos, mas isso não diminui um disco onde Todd Terje mostra ser um músico-produtor sólido na diversidade. Em entrevista recente ao The Guardian recordava que quando começou não podia proporcionar à audiência apenas música house: “tinha que levar funk, disco, bossa ou música latina.”
Essa variedade sente-se no álbum, com pormenores de salsa em temas como Svensk sas, ou do jazz de fusão em Alfonso muskedunder, por exemplo. Aliás essa descontracção quase insolente é uma das marcas de alguém que não parece nada interessado em corresponder às expectativas de quem se identifica apenas com um tipo de música. O seu propósito é divertir-se, proporcionado prazer, sem grande autoconsciência.
Mas isso não significa abdicar dos valores criativos mais exigentes. A música disco de Terje é mais espacial que excessiva, embora não resista a um efeito de sintetizador, a um arranjo mais faustoso ou a uma percussão mais eloquente. Mas o que o distingue é a exacta medida das proporções. Mesmo quando o humor entra em acção, as longas digressões instrumentais que propõe, são polidas e equilibradas. A instrumentação é orgânica, as texturas luxuriantes e os adornos orquestrais e a acção rítmica tanto levam ao frenesim, como ao envolvimento pacificador. É como se esperássemos por um clímax que acaba por nunca acontecer.
É como se o sentido épico de alguns temas fosse permanente. É o que acontece com Delorean dynamite, o tema onde se sente de forma mais evidente a influência do veterano Giorgio Moroder que, o ano passado, voltou à ribalta, em grande parte por causa dos franceses Daft Punk, com quem colaborou.
Terje diz-se um tímido. Precisa da mediação da música, e da sua actividade de DJ, para se transcender. “O sítio onde me sinto mais confortável é a minha casa. É também por isso que demorei tanto tempo a lançar este álbum. Gosto de estar na sombra. Para além disso agora tenho um bebé, o que é uma óptima desculpa para estar em casa e fazer música.”
Pelo menos nos próximos meses é pouco crível que venha a conseguir estar muito tempo em casa. Aguarda-o uma digressão de promoção ao novo álbum, onde pela primeira vez actuará ao vivo – estará a 6 de Junho no festival Primavera Sound do Porto.
Para a mesma diz que tem comprado equipamento novo, embora o seu propósito de sempre seja fazer música que soa estranhamente antiquada, no sentido mais saudável da expressão.
Todd Terje
It’s Album Time
Olsen Records