EUA acusam Rússia de partilhar pouca informação sobre suspeito do atentado em Boston

Washington admite que começou a investigar Tamerlan Tsarnaev depois de Moscovo ter alertado para a sua "radicalização", em 2011, mas queixa-se de falta de "informações específicas ou adicionais".

Foto
O atentado em Boston matou três pessoas e fez 264 feridos Dominick Reuter/Reuters

O documento em causa faz uma avaliação da forma como as várias agências de serviços secretos e a polícia federal (FBI) actuaram nos meses e anos que antecederam o atentado, e de que forma partilharam a informação de que dispunham com a polícia de Boston  a região onde ambos os suspeitos residiam.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

O documento em causa faz uma avaliação da forma como as várias agências de serviços secretos e a polícia federal (FBI) actuaram nos meses e anos que antecederam o atentado, e de que forma partilharam a informação de que dispunham com a polícia de Boston  a região onde ambos os suspeitos residiam.

O relatório, que foi avançado pelo jornal The New York Times e que será enviado ao Congresso ainda nesta quinta-feira, confirma o que a Comissão de Segurança Interna da Câmara dos Representantes já tinha avançado em Março passado: os serviços secretos russos (FSB) alertaram os Estados Unidos em 2011, por escrito, para os seus receios sobre o mais velho dos irmãos Tsarnaev, morto na sequência da perseguição policial que se seguiu ao atentado. Djokhar, o irmão mais novo, foi detido e aguarda julgamento.

A cúpula do FSB disse explicitamente ao FBI que Tamerlan se tinha "radicalizado" e que poderia "regressar à Rússia e alistar-se em grupos terroristas". A informação avançada por Moscovo há três anos (dois anos antes do atentado em Boston) descrevia também o jovem nascido na república russa da Kalmikia, no Cáucaso do Norte, como "um seguidor do islão radical e um crente fervoroso", que mudara "drasticamente desde 2010, enquanto se preparava para sair dos Estados Unidos e juntar-se a grupos clandestinos".

Apesar destas informações, o relatório conjunto dos inspectores-gerais da Comunidade de Serviços Secretos dos EUA (que supervisiona 17 agências), do Departamento de Segurança Interna, do Departamento de Justiça e da Central Intelligence Agency (CIA) conclui que Moscovo poderia ter colaborado mais.

"Eles [as autoridades norte-americanas] chegaram à conclusão de que os russos não forneceram toda a informação que tinham na altura. Com base em tudo o que estava à sua disposição, o FBI fez tudo o que podia", lê-se no The New York Times, que cita um "responsável de topo americano que foi informado sobre o relatório".

Tal como se pode ler na conclusão das investigações da Comissão de Segurança Interna da Câmara dos Representantes, apresentada no mês passado, também o documento dos inspectores-gerais do Governo e dos serviços secretos norte-americanos sublinha que o FBI começou a investigar Tamerlan Tsarnaev assim que recebeu as primeiras informações de Moscovo.

Tamerlan tinha um ficheiro em seu nome no FBI. Havia informações dos serviços secretos russos de que poderia estar a preparar-se para se juntar a grupos terroristas. Ele, o seu pai, a sua mãe e colegas foram questionados por agentes da polícia federal norte-americana, que também viajaram até à república russa do Daguestão, no Cáucaso do Norte, onde Tamerlan Tsarnaev estivera meses antes do atentado. Apesar de o seu nome estar incluído numa lista de suspeitos (os russos tinham pedido aos norte-americanos que os avisassem se Tamerlan saísse do país), o jovem não foi questionado no aeroporto quando partiu para a Rússia, onde esteve entre Janeiro e Julho de 2012.

A investigação do FBI sobre Tamerlan Tsarnaev foi oficialmente encerrada em finais de Junho de 2011, quando as autoridades concluíram que não havia suspeitas suficientes da sua ligação a grupos terroristas. Na carta em que informaram Moscovo sobre as suas conclusões, os agentes federais norte-americanos pediram "mais informações específicas ou adicionais" que pudessem indicar que Tamerlan constituía uma ameaça, mas os serviços secretos russos não responderam, segundo o relatório revelado esta semana pelo The New York Times – uma informação que já constava do relatório do próprio FBI sobre o caso.

"Se eles soubessem o que os russos sabiam, provavelmente poderiam ter feito mais no âmbito do nosso protocolo de investigação, mas teriam conseguido impedir o atentado? É muito difícil afirmar isso", disse um outro "responsável de topo" ao The New York Times.

Mas as acusações de insuficiente partilha de informação não partem apenas de Washington em relação a Moscovo; entre as várias agências de serviços secretos e a polícia norte-americana também há queixas. De acordo com o relatório da Câmara dos Representantes, em Maio de 2013, o comissário da polícia de Boston, Edward Davis, disse que não tinha conhecimento de que Tamerlan Tsarnaev tinha sido investigado pelo FBI dois anos antes.

Mais de uma década depois dos atentados de 11 de Setembro de 2001, e quase um ano depois das revelações sobre as operações de espionagem em larga escala da Agência de Segurança Nacional norte-americana (justificada, em grande parte, com a necessidade de detectar antecipadamente possíveis planos terroristas), o relatório da Câmara dos Representantes recomendou, entre outras coisas, o reforço da "cooperação com as autoridades policiais locais" e o "melhoramento dos sistemas de alertas e notificações".