Ele não exige, mas dão-lhe...
Jardim Gonçalves é um banqueiro muito pio, muito cristão e beato da Opus Dei, que um dia chegará ao Inferno e não era bem isso que esperava… mas tudo bem: convence o Diabo a voar no Falcon que o BCP lhe paga e os dois desfrutarão as penas da eternidade num off-shore de clima agradável, com suite c/jacuzzi de 7 estrelas e reforma adequada a mafarricos (170 mil euros por mês, com menos não se come). Ah, e cinco carros e dois motoristas e 40 seguranças privados, pagos por alguém há-de pagar. Ele só quer aquilo a que tem direito, por amor de Deus.
Aos 79 anos, o fundador do primeiro banco privado português (BCP) depois do 25 de Abril usou, de novo, o imenso capital de prestígio que conquistou no capítulo das cenas que desprestigiam Portugal: fez prescrever, com atrasos e recursos na secretaria dos tribunais, a multa de um milhão de euros do Banco de Portugal. E ainda os nove anos de inibição de exercício de funções bancárias. E mostrou-se ofendido com a Justiça, por não poder provar a sua inocência! Era “tudo o que menos queria”. Vimos a cara de tristeza de um homem que dantes pendurava do nariz aquele esgar-réptil luminoso, o sorriso de um milhão de euros (livre de impostos). Agora só receia a repetição do ataque ao seu bom-nome, com novas prescrições: o arquivamento dos processos criminais (instaurados pelo DIAP). Todos os julgamentos que poderiam dar prisão (hipótese só para reinar…). Faltam poucos meses para tudo ficar em águas de bacalhau dourado, no país à beira-mar roubado.
Jardim Gonçalves é, como se acaba de provar, uma dessas figuras maiores do que a vida: põe os comentadores e as biografias a abusarem de exclamações e metáforas forçadas, tal é a inveja dos fracos perante a sua grandeza! Entretanto, discípulos do mestre como João Rendeiro (BPP, o das “rentabilidades garantidas… mas só para mim”) e Oliveira e Costa (BPN, mais conhecido como “o totó da pulseira electrónica”) meteram os papéis para assinarem um contrato de investimento semelhante com a Justiça portuguesa. Tem uma taxa de juro e um spread muito favorável: milhões roubados, prescrições garantidas.
Segundo fontes diamantíferas por nós contactadas, Gonçalves estará a preparar o futuro a breve prazo. Se a CMVM (Comissão de Mercados de Valores Mobiliários) mostrar má vontade e insinuar mais coisas feias, o banqueiro centrará o seu impenetrável trabalho na criação da comissão da PSVC (Pessoas Sem Vergonha na Cara). Os estatutos são claros e decorrem da coerência de Jardim Gonçalves. Ele não exige nada… as coisas é que são assim. Sempre que lhe falam de coisas desagradáveis, pouco espirituais, ligadas àquilo com que se compram os melões, diz:
— O banco faz aquilo que entende. O assunto não é meu. Eu não exijo nada.
Era assim que o senhor respondia, ao Diário Económico, em Outubro de 2012, quando se percebeu o curioso valor da reforma. E que ele e a mulher andavam a passear pelo mundo em avião privado. E depois apresentou em tribunal contas de mais de 400 mil euros por mês, quando o BCP lhe cortou este subsídio mínimo.
Jorge Jardim Gonçalves nasceu no Funchal em 1935 e formou-se em Engenharia Civil no Porto. Antes de optar por ser rico, muito rico, oh, como sou rico, tudo isto é meu, meu, meu, ah, ah, ah!, chegou a dar aulas de hidráulica. Aí terá desenhado as alavancas e os sistemas para, primeiro com brilho, depois metendo água, erguer um império financeiro. Construiu um banco moderno com o dinheiro dos outros mas meteu na cabeça que o dinheiro era mesmo dele. E da sua família: uma vez o filho mais novo esturrou 12,5 milhões em negócios de gargalhada e o papá decidiu perdoar até ao último cêntimo. As coisas descobriram-se e Jardim teve de cobrir o calote do estroina.
Um pai extremoso, bom católico. Ficou famosa a carta que escreveu ao Expresso, incomodado por terem escrito que o seu primeiro serviço de prata fora comprado a prestações. Não foi, foi a pronto, esclareceu o banqueiro, delicadamente. A palavra de um ex-combatente em Angola chegava.
Quanto à sua primeira sanita de ouro: também foi comprada a pronto, algures num palácio devoluto do Médio Oriente. Mas esta informação pode estar viciada. Ser tão rigorosa como as contas que o banqueiro apresentava aos accionistas e ao então governador do Banco de Portugal, Vítor Constâncio, que nunca viu nada de errado porque se esqueceu dos óculos em casa.
E agora de novo livre, por prescrição, da proibição de práticas bancárias, quando surge uma grande notícia para a Europa. O Parlamento Europeu e a União chegaram, esta semana, a acordo para a criação de um mecanismo único de liquidação de bancos. O objectivo é proteger os contribuintes dos prejuízos de bancos inviáveis ou em dificuldades. Portugal tem a oferecer a expertise de dois homens notáveis; o financeiro Jardim Gonçalves e o hoje vice-presidente do Banco Central Europeu, Vítor Constâncio. Se é para liquidar, é para liquidar.