O exemplo não deve vir de cima

O sangue que corre nas veias de todos tem a mesma cor, não há sangue azul nem direitos discriminatórios de nascença

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Christian Charisius/Reuters

O exemplo não deve vir de cima, o que seria suposto seria vir de todos os lados. Ou seja, num sistema republicano democrático, não deveriam existir cidadãos mais obrigados a dar o exemplo que outros, quer estejam “em cima ou em baixo”, pois isso é contrário os princípios fundamentais do próprio sistema.

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O exemplo não deve vir de cima, o que seria suposto seria vir de todos os lados. Ou seja, num sistema republicano democrático, não deveriam existir cidadãos mais obrigados a dar o exemplo que outros, quer estejam “em cima ou em baixo”, pois isso é contrário os princípios fundamentais do próprio sistema.

De um modo geral, o uso da expressão “o exemplo tem de vir de cima” pode significar várias coisas. Pode significar que não assimilámos os princípios basilares do nosso sistema político: sem ordens, castas ou distinção de direitos e deveres entre cidadãos. Quase sempre numa república – à excepção dos fascismos e outros extremismos totalitaristas -, mas muito mais numa democracia, os cidadãos são todos iguais perante a lei, e a todos é exigida a mesma ética cívica, com os tais mesmos direitos e deveres. O sangue que corre nas veias de todos tem a mesma cor, não há sangue azul nem direitos discriminatórios de nascença. Este ideal de igualdade não permite formar hierarquias e elites que tenham, ou a quem seja obrigada, uma moralidade ou ética superior.

Obviamente que, apesar dos esforços de coesão e igualdade social, são muitos os factores, para além das características biológicas e psíquicas dos indivíduos, que reforçam as desigualdades. Provavelmente, não poderia ser de outra forma, pois as engenharias sociais para atingir uma igualdade ideal são sempre castradoras da diversidade, criatividade e liberdade. Resta encontrar o ponto de equilíbrio e justiça.

Mesmo havendo “os de cima” e “os de baixo”, nas sociedades contemporâneas que se dizem democráticas e capazes de garantir igualdade de oportunidades, com base no estado de direito e mérito pessoal, esses postos não são permanentes, havendo relativa mobilidade social. Isto para dizer que as elites governativas são temporárias, e, apesar da nomenclatura, são apenas cidadãos como todos os demais. Não são de uma espécie à parte superior, nem são escolhidos e ungidos por direitos divinos.

São simplesmente cidadãos. Tendo esse estatuto estão então obrigados à mesma moralidade que todos os restantes. Se lhes exigíssemos mais do que a nós mesmos estaríamos a colocar-nos num papel de subserviência e a minar a própria democracia, criando um novo tipo de aristocracia e desigualdade. Por isso, primeiro que tudo, numa democracia madura: o exemplo tem de vir de dentro, de cada pessoa e de todos os lados. Só assim se pode exigir que venha de cima. Só assim se pode começar a exigir uma democracia melhor. O resto - todos aqueles exemplos negativos que conhecemos - são consequências.