Ucrânia acusa Rússia de invasão no Leste, Moscovo veta resolução da ONU
Escalada de tensão em vésperas do referendo à secessão da Crimeia.
A Ucrânia diz que com 80 soldados, quatro helicópteros e três carros de combate blindados a Rússia invadiu uma zona para além da península da Crimeia, Strilkove, na região de Kherson (sudeste).
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A Ucrânia diz que com 80 soldados, quatro helicópteros e três carros de combate blindados a Rússia invadiu uma zona para além da península da Crimeia, Strilkove, na região de Kherson (sudeste).
“O ministério ucraniano dos Negócios Estrangeiros declarou que se trata de uma invasão militar pela Rússia e pede à parte russa a retirada imediata das suas forças militares do território da Ucrânia”, diz a nota de Kiev.
Se estas acusações forem verdadeiras, esta seria “uma escalada escandalosa”, disse a embaixadora dos EUA nas Nações Unidas, Samatha Power.
A Rússia deu entretanto a indicação mais forte de que poderá mesmo expandir a invasão para além da província semi-independente da Crimeia, que vai domingo a referendo sobre a secessão ou maior autonomia. “A Rússia está a receber muitos pedidos de protecção de cidadãos pacíficos” na Ucrânia, dizia um comunicado do Ministério dos Negócios Estrangeiros. “Estes pedidos serão considerados.”
O comunicado mencionava directamente membros do Sector Direito, o grupo nacionalista que esteve presente nas manifestações anti-Ianukovich, o presidente derrubado. “Estamos a receber informações alarmantes de que mercenários do Sector Direito […] deixaram Kharkov para Donetsk e Lugansk”, diz o comunicado do ministério.
Antes, Kiev tinha acusado “agentes russos” de estarem por trás de confrontos no Leste da Ucrânia. Morreram três pessoas em manifestações a favor e contra Moscovo nas cidades de Donetsk e Kharkov e a Ucrânia teme que Moscovo possa usar a violência contra os russófonos nesta parte da Ucrânia para justificar uma invasão.
A intervenção militar da Rússia na Crimeia seguiu-se à queda do presidente ucraniano, Viktor Ianukovich, após meses de instabilidade política e protestos populares por este não ter assinado um acordo comercial com a União Europeia e preferir uma aproximação à Rússia.
Moscovo vetou este sábado, sem surpresa, uma resolução do Conselho de Segurança que pretendia declarar inválido o referendo marcado para domingo na Crimeia, com vista à separação da Ucrânia.
O projecto de resolução sobre o referendo na Crimeia recebeu 13 votos a favor e a abstenção da China mas foi rejeitado pela Rússia, que usou o direito de veto.
Os EUA e União Europeia consideram o referendo – que será realizado neste domingo sem jornalistas ou observadores – ilegal, e ameaçaram com sanções.
Ninguém duvida do resultado. O correspondente do diário britânico The Guardian em Moscovo, Shaun Walker, entrevistou Sergei Aksionov (proclamado primeiro-ministro da Crimeia) que disse esperar a introdução do rublo, a moeda russa, na terça ou quarta-feira, no início de um período com duas moedas até à completa integração com a Rússia, dentro de uns seis meses.
Enquanto isso, em Moscovo decorria um protesto contra a acção russa na Ucrânia que terá juntado 50 mil pessoas, entre as quais duas ex-Pussy Riot, Maria Aliokhina e Nadejda Tolokonnikova, que depois de terem passado quase dois anos na prisão fotaleceram o activismo contra o Presidente, Vladimir Putin, e contra as restrições de liberdade na Rússia. Os manifestantes gritaram slogans como “A ocupação da Crimeia é uma desgraça para a Rússia”. Noutra acção de rua, cerca de 15 mil pessoas manifestaram-se a favor da intervenção russa na Crimeia.
Para a revista britânica Economist, a intervenção russa na Ucrânia marca um novo período na Rússia pós-soviética. A questão, explica, é agora onde vai parar Moscovo – na fronteira com a Crimeia ou já dentro da Ucrânia continental?
A revista compara este momento com a invasão da Checoslováquia em 1968. Na altura, “os tanques esmagaram não só os reformadores checos, mas também as esperanças entre os russos de construir um socialismo mais humano em casa”. Agora, “a escapada russa na Ucrânia consolida o seu próprio estado autoritário, dependente de petróleo, e fundamentalmente fraco”.