Nas redes sociais, a influência de cada um vai muito além do que se pensava
Uma equipa de cientistas portugueses mostrou que, nas redes online como o Facebook ou o Twitter, a influência das opiniões e atitudes dos utilizadores se faz sentir até aos amigos dos amigos dos seus amigos.
O efeito que a partilha de opiniões, emoções, modas, atitudes ou preconceitos de um ser humano pode ter sobre as diversas escolhas feitas pelos seus familiares e amigos não é em si uma novidade. Mas o que já é mais surpreendente é a existência de uma espécie de “influência social à distância”, capaz de surtir o seu efeito sobre um círculo muito maior de pessoas, quer as conheçamos, quer não.
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O efeito que a partilha de opiniões, emoções, modas, atitudes ou preconceitos de um ser humano pode ter sobre as diversas escolhas feitas pelos seus familiares e amigos não é em si uma novidade. Mas o que já é mais surpreendente é a existência de uma espécie de “influência social à distância”, capaz de surtir o seu efeito sobre um círculo muito maior de pessoas, quer as conheçamos, quer não.
Há já alguns anos que diversos estudos têm vindo a sugerir que, nas sociedades humanas, a influência de cada um sobre os seus pares era muito mais extensa do que se poderia imaginar. Mais precisamente, com base num estudo sobre saúde cardiovascular, realizado ao longo de décadas junto da população da localidade de Framingham, no Massachusetts (EUA), dois cientistas norte-americanos, James Fowler e Nicholas Christakis, concluíam que existiam, entre os elementos da rede de participantes no estudo, “três graus de influência” ao nível de aspectos tão díspares como o consumo de tabaco ou de álcool, a obesidade, o espírito de cooperação, a solidão ou a felicidade.
Por exemplo, no caso da obesidade, essa regra dos três graus de influência manifestava-se da forma seguinte: não só o facto de uma pessoa ter um amigo obeso fazia aumentar o seu próprio risco de obesidade, como também o facto de ter um amigo de amigo obeso e mesmo um amigo de amigo de amigo obeso (o tais três graus de influência). Claro que a intensidade do risco diminuía à medida que a “distância social” entre as pessoas aumentava, mas mesmo assim, a obesidade surgia como algo susceptível de ser transmitido de forma remota entre desconhecidos, simplesmente pelo facto de estarem ligados entre si por contactos sociais comuns.
Hoje, em dia, “estudos deste tipo já mostraram como as redes sociais afectam a propagação das questões de saúde, das ideias, dos comportamentos criminais, das decisões económicas, dos níveis de desempenho escolar ou de cooperação, entre outros traços humanos”, escrevem no seu artigo Flávio Pinheiro, Marta Santos, Francisco Santos e Jorge Pacheco, numa colaboração do Instituto para a Investigação Multidisciplinar da Universidade de Lisboa, do Instituto Superior Técnico e das universidades de Aveiro e do Minho.
Mais ainda: o estudo de uma comunidade de caçadores-recolectores da Tanzânia também revelou a presença, embora mais limitada, deste tipo de influência à distância. Por estas razões, os cientistas portugueses quiseram ir mais longe, tentando determinar se o fenómeno seria ou não omnipresente nas sociedades humanas e nas teias de relações que se formam dentro delas.
“A regra [dos três graus de influência] foi proposta com base num resultado empírico e, no nosso entender, era importante saber até que ponto este resultado era verdadeiramente geral (ou não)”, disse Jorge Pacheco ao PÚBLICO. “O que fizemos foi testar isso – e concluímos, com surpresa, que o resultado é bem mais geral do que seria de esperar.”
Para isso, explica-nos ainda este investigador, simularam três mecanismos diferentes de propagação da informação: o da propagação de doenças (processo de contágio), o da propagação de escolhas eleitorais ou de boatos; e o da propagação da cooperação entre pares. Por outro lado, também estudaram redes com diversas estruturas, como por exemplo “redes sociais pequenas, do tipo rede de emails de uma escola ou pequena universidade” ou ainda redes sociais muito maiores “como o Facebook e o Twitter”, diz Jorge Pacheco.
“Estudámos quatro classes de redes diferentes, que sabemos conduzem a dinâmicas bem diferentes quando servem de suporte aos três processos de propagação de informação que considerámos”, explica ainda. “Ou seja, acho que criámos, teoricamente, as condições mais propícias a testar a generalidade ou não da regra [dos três graus de influência]. E depois, corremos durante muito tempo as simulações computacionais e analisámos os muitos Gigabytes de dados.”
Conclusão: independentemente do processo de propagação da informação e em grande parte independentemente da estrutura da rede social, o grau de influência individual situava-se à volta de três. “A regra dos três graus de influência tem efectivamente o dom da ubiquidade”, resume Jorge Pacheco.
“Se nós somos assim, isso terá certamente muitas aplicações – como sempre, para o bem e para o mal”, acrescenta o cientista. “Por exemplo, o trabalho da NSA [a agência de segurança norte-americana] na era pós-Edward Snowden poderá ser mais fácil do que pensávamos”. Porquê? Porque ao saber onde procurar nas redes – e agora, até que distância –, a NSA poderá aumentar a eficácia dos seus algoritmos de vigilância dos cidadãos.
Por outro lado, “se estivermos à procura do primeiro evento de um novo surto epidémico, os padrões de [influência] talvez nos possam fornecer informações importantes que nos levem mais rapidamente à origem da epidemia”, permitindo um melhor controlo da sua propagação. “E na área do marketing ou nas campanhas políticas, poderá ser possível desenhar processos mais eficazes” para influenciar o maior número de pessoas possível. Admirável mundo novo…