Parlamento aprova recomendação "mínima" para grupo de trabalho sobre acordo ortográfico

Proposta final de Ribeiro e Castro, Michael Seufert e Mota Amaral foi bastante amputada em relação à inicial para poder contar com o apoio do PSD.

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Carta aberta enviada ao Governo pede a revogação do Acordo Ortográfico Miguel Madeira

A bancada do CDS-PP votou dividida: dos 24 deputados, sete votaram a favor da recomendação, ao lado do PSD e dos Verdes. Os restantes 14 deputados votaram contra, acompanhando o PS e o Bloco. O PCP absteve-se. Com Ribeiro e Castro e Michael Seufert votaram os centristas Teresa Caeiro, Teresa Anjinho, José Lino Ramos, Inês Teotónio Pereira e Rui Barreto.

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A bancada do CDS-PP votou dividida: dos 24 deputados, sete votaram a favor da recomendação, ao lado do PSD e dos Verdes. Os restantes 14 deputados votaram contra, acompanhando o PS e o Bloco. O PCP absteve-se. Com Ribeiro e Castro e Michael Seufert votaram os centristas Teresa Caeiro, Teresa Anjinho, José Lino Ramos, Inês Teotónio Pereira e Rui Barreto.

O diploma chegou à votação final bastante amputado em relação ao seu figurino inicial – o que motivou críticas do PS e do Bloco sobre o sentido e eficácia da iniciativa. Primeiro, na quinta-feira à noite, tinham caído os dois parágrafos que previam a possibilidade deste grupo de trabalho poder vir a propor a revogação, suspensão ou revisão da aplicação do acordo ortográfico. Fora esta a condição para o PSD deixar passar a proposta.

Já esta sexta-feira de manhã, o texto sofreu mais cortes: caíram os considerandos, o prazo de funcionamento do grupo de trabalho – que obrigava a que tivesse mesmo que apresentar conclusões – e até a denominação do projecto de resolução foi mudado. Em vez da inicial “reavaliação da aplicação” do acordo ortográfico, o título diz agora apenas “acompanhamento da aplicação”.

José Ribeiro e Castro defendeu que a aplicação do acordo tem estado envolto em “problemas políticos de efectivação” e “problemas técnicos” que é preciso ultrapassar. Citou Adriano Moreira para dizer que “a língua portuguesa não é nossa, mas também é nossa”, pelo que é preciso “ter plasticidade e inteligência no equilíbrio entre os elementos normativos e o trabalho de linguistas” e de todos os especialistas e utilizadores da língua, como docentes ou escritores.

Apesar de ter havido um grupo de trabalho sobre o assunto, que funcionou na Assembleia da República em 2013, o deputado centrista diz não ter tirado as conclusões que outros tiram e que é “precipitado” defender simplesmente a saída de Portugal do acordo ortográfico. Mas considera fundamental ultrapassar os problemas para aumentar a adesão de todos ao acordo.

Apoio modesto do PSD
A social-democrata Rosa Arezes veio dar um apoio moderado aos três deputados. Avisou que o partido está “empenhado para que a aplicação do acordo possa prosseguir com naturalidade”, recordou que se está já numa fase de transição com a utilização corrente do novo acordo em quase todos os organismos públicos “sem sobressaltos”. Mas admitiu a “necessidade de limar algumas arestas e a importância de proceder a melhoramentos”.

Na declaração de voto que no final da votação anunciou - como o fizeram também as bancadas do PSD e a do CDS-PP e outros parlamentares em nome individual -, o deputado do PSD José Mendes Bota considerou que a solução que o seu partido admitiu deixar passar é "o mínimo dos mínimos dos mínimos, fraca, não vinculativa e que nada fará para inverter o rumo traçado por este estranho consenso político rendido às conveniências económicas, diplomáticas e operacionais".

O centrista Telmo Correia veio justificar a oposição da bancada a esta proposta de dois dos seus deputados com o argumento da “noção de responsabilidade”, tendo em conta o “percurso que já foi feito” e o “esforço de entidades, editores, escolas” no processo de implementação do acordo nos últimos anos.

O deputado citou Fernando Pessoa que disse que “a minha pátria é a língua portuguesa”, mas fazendo questão de acrescentar que o poeta falou na “língua e não na ortografia”. Em resposta a Ribeiro e Castro, Telmo Correia também citou Adriano Moreira para salientar que se a “língua portuguesa é um instrumento da nossa soberania, Portugal e a soberania não são donos da língua. Apenas a partilham com outros Estados de língua oficial portuguesa”. Sobre as “dificuldades” levantadas pelo Brasil, que tem adiado a entrada em vigor efectiva dos termos do acordo, Telmo Correia respondeu com uma pergunta: “Se nós temos receio sobre as dúvidas ou dificuldades que o Brasil levanta, porque levantamos também? O interesse de Portugal é liderar o acordo ortográfico. E por isso eu votarei contra.”

Crítico da proposta encabeçada por Ribeiro e Castro, o socialista Carlos Enes veio defender o Brasil e os restantes países que ainda não aplicam o acordo dizendo que o estão a fazer “ao seu ritmo”. Considerou que a perspectiva deve ser a de “caminhar com segurança, limar arestas, obter mais consensos”. Realçando que o corpo do acordo “não é uma Bíblia sagrada”, defendeu que uma eventual revisão do mesmo deve ser feita a longo prazo, e que o vocabulário ortográfico comum – a ser usado por todos os países – “está em fase de ultimação para ser conhecido ainda este ano”. “Compete ao Governo providenciar que tal aconteça”, rematou, empurrando a questão para o Executivo.

Projectos do PCP e Bloco chumbados
O PCP foi bem mais longe que a proposta dos três deputados da direita e apresentou um projecto de resolução que previa a criação de um Instituto para a Língua Portuguesa e a possibilidade de Portugal se desvincular do acordo se, até final de 2016, não houver um vocabulário comum e um acordo comummente aceite. Foi chumbado com os votos contra do PSD, PS e CDS-PP; o Bloco absteve-se.

O deputado comunista Miguel Tiago recordou que o PCP foi o único partido que não votou o segundo protocolo modificativo ao acordo e que implicava a entrada em vigor da actual versão. Na altura, o partido “suscitou dúvidas e teceu críticas que, depois destes anos, não foram respondidas”, nem mesmo com o trabalho do grupo que propôs e que funcionou no Parlamento durante sete meses, em 2013.

O comunista afirmou que a sociedade portuguesa se mantém dividida sobre a questão, que “não foi assegurada qualquer espécie de convergência ortográfica”, e que “a longo prazo a divergência é crescente, de acordo com a oralidade”. Recusou as dificuldades que colocam por se voltar atrás e defendeu a necessidade de um “faseamento para a desvinculação”. “A existência de um mau acordo ortográfico e de ausência de política da língua é catastrófica”, criticou Miguel Tiago. Que avisou ser impossível “continuar a fingir que nada se passa”. “Progresso e acordo sim, mas não a qualquer preço. O acordo ortográfico deve ser para a salvaguarda da língua e não para o interesse de editores e distribuidores.”

Também o projecto de resolução do Bloco, que recomendava ao Governo a “revisão técnica” do acordo, acabou chumbado. Luís Fazenda disse que o seu partido “continua a ver vantagens na aproximação ortográfica” entre as várias grafias da língua portuguesa. Mas “há uma suspeição sobre a conclusão, desenvolvimento e aplicação do acordo, em especial de que o Brasil chegue ao fim do prazo sem essa aplicação plena”.

Por isso, há que fazer agora uma avaliação para que “Portugal não fique com grafia isolada”, defende o BE. Mas é preciso fazer mais do que se propunha o grupo de trabalho proposto pelos deputados da direita, que Luís Fazenda classificou de “perfeitamente desnecessário” por, depois de tantas amputações à proposta inicial, não fará mais do que o grupo que trabalhou no Parlamento. “O tempo é agora de fixar algumas condições deste processo e exigir ao Governo que seja lesto nos seus contactos políticos e diplomáticos”, defendeu.