Estado português tem mais de 12.000 milhões de euros “parados” no BCE
Finanças avançam esta quinta-feira com operação de recompra, com o objectivo de usar um excedente de tesouraria que está a render muito pouco ao Estado nos cofres do banco central.
De acordo com os dados do boletim estatístico do Banco de Portugal, os passivos da autoridade monetária portuguesa face à administração central (na prática os depósitos que o Estado realiza junto do BCE) têm vindo a registar, desde a chegada dos fundos da troika em meados de 2011, uma tendência de subida. Nos anos anteriores o seu valor era praticamente nulo, mas o volume elevado dos empréstimos da troika permitiu que Portugal acumulasse excedentes, que na sua maioria são colocados no banco central.
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De acordo com os dados do boletim estatístico do Banco de Portugal, os passivos da autoridade monetária portuguesa face à administração central (na prática os depósitos que o Estado realiza junto do BCE) têm vindo a registar, desde a chegada dos fundos da troika em meados de 2011, uma tendência de subida. Nos anos anteriores o seu valor era praticamente nulo, mas o volume elevado dos empréstimos da troika permitiu que Portugal acumulasse excedentes, que na sua maioria são colocados no banco central.
Com as emissões de dívida no mercado que o Estado conseguiu entretanto realizar, na primeira metade de 2013 e nos primeiros meses de 2014, este valor subiu ainda mais. No final do passado mês de Janeiro, os passivos do Banco de Portugal face à administração central ascendiam a 12.819 milhões de euros. Em Fevereiro (mês para o qual ainda não há dados disponíveis), como os excedentes do tesouro aumentaram, os depósitos feitos no banco central ainda terão subido mais.
O grande problema destes depósitos que são feitos no BCE pela Agência para a Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública (IGCP) é que praticamente não oferecem qualquer rendimento. Neste momento, a taxa de depósito praticada pelo BCE é de 0%, estando os responsáveis da entidade sedeada em Frankfurt a ponderar mesmo passar a aplicar taxas de juro negativas.
O Estado também coloca parte dos seus excedentes de tesouraria em depósitos bancários, que não terão rendimentos muito superiores, uma vez que os bancos conseguem obter fundos de curto prazo a um valor muito reduzido junto do BCE.
No total, os excedentes de tesouraria do Estado podem ascender, nesta fase, a um valor que supera os 20.000 milhões de euros. No final de 2013 eram, segundo números do IGCP, de 15.300 milhões de euros. Entretanto, nos dois primeiros meses do ano, foram realizadas duas emissões de OT num valor global de 6400 milhões de euros. O IGCP está ainda a apontar para que o Estado acabe o ano de 2014 com um excedente de tesouraria de 14.600 milhões de euros.
Tentar a recompra
Ter um montante tão elevado quase “parado”, com rendimentos muito reduzidos, representa uma perda grande de dinheiro para as contas públicas, uma vez que os excedentes apenas são conseguidos através de emissões de dívida feitas a uma taxa média anual próxima de 4%. É isto que leva a que o IGCP tenha decidido efectuar esta quinta-feira uma operação de recompra de títulos de dívida pública. Numa recompra, o que acontece é que o Estado amortiza, em antecipação, obrigações que tinha emitido e que que deveriam chegar ao seu prazo final mais tarde.
No caso da operação que irá agora ser realizada, em causa estão dois títulos, um no valor de 5870 milhões de euros com maturidade em Outubro deste ano e outro no valor de 9242 milhões de euros que deveria ser amortizado em Outubro de 2015.
Não se sabe ainda qual será o valor final da recompra que irá ser acordada entre o Tesouro português e os investidores, mas a consequência será uma diminuição do excedente de tesouraria do Estado e, em simultâneo, uma redução das necessidades de financiamento futuras da República.
O Governo, numa estratégia decidida em conjunto com a troika, tem optado por acumular excedentes de tesouraria elevados, principalmente agora que se aproxima o final do programa de assistência financeira. A ideia por trás desta estratégia é, à semelhança do que fez a Irlanda, garantir desde logo que o país tem dinheiro suficiente nos seus cofres para se dar ao luxo de, caso as condições nos mercados se deteriorem, não ter de procurar novos financiamentos.
Estes excedentes de tesouraria são vistos como uma espécie de seguro criado pelo próprio país que pode servir de substituto para um programa cautelar. A grande desvantagem é que comporta custos elevados.
Indiferente para a Moody’s
Vários analistas de mercado e entidades como a agência de rating Fitch têm vindo a defender que um programa cautelar seria a melhor solução para Portugal, quer pela segurança que daria aos investidores, quer pelo facto de implicar menos custos.
Esta quarta-feira, contudo, responsáveis da Moody’s presentes em Lisboa afirmaram que a opção de Portugal por um programa cautelar ou pela criação de uma almofada financeira pelo Tesouro não fará muita diferença na decisão sobre o rating português que deverá ser tomada pela agência no início do próximo mês de Maio.
"A ideia por trás de uma linha de crédito cautelar é precisamente a de que o ideal é mesmo não ser usada", disse a analista da Moody’s responsável por Portugal, lembrando que no caso da Irlanda a opção foi a de criar uma almofada financeira própria que garantisse ao país que tinha o financiamento necessário para um período longo de tempo. "Não se consegue dizer que uma coisa é melhor do que a outra", afirmou Kathrin Muehlbronner, embora reconhecendo que uma decisão sobre o rating português não será tomada sem saber qual será a decisão de Portugal nesta matéria.
A Moody's passou, em Novembro, a tendência do rating português de "negativo" para “estável”. Mantém a nota, contudo, em nível "lixo". Uma passagem para nível de investimento no futuro é ainda encarada com muita prudência pela analista da Moody's. "Reconhecemos que já se iniciou uma recuperação e que Portugal fez reformas importantes", disse Kathrin Muehlbronner, afirmando ainda que o risco de reestruturação da dívida é agora muito mais reduzido.
No entanto, mostrou ainda uma grande preocupação: "Os rácios da dívida são muito altos, [o que exige] mais crescimento económico e défices reduzidos." "Ainda há muito a fazer e a consolidação orçamental vai ter de continuar por muitos anos", afirmou a analista.
Em comparação com a Irlanda, cujo rating a Moody's já colocou em nível de investimento, Kathrin Muehlbronner salientou duas diferenças. Primeiro, o facto de a Irlanda estar a conseguir taxas de juro de 3,5% com um crescimento de 2%, ao passo que Portugal tem taxas de 5% com um crescimento abaixo de 1%. "Isso torna a análise da sustentabilidade da dívida completamente diferente para os dois países."
Depois há diferentes perspectivas quanto ao crescimento futuro da economia para a Irlanda e para Portugal. "A Irlanda é um país em que temos mais confiança de que o modelo de crescimento baseado nas exportações pode funcionar", explicou.