Viu-se pela primeira vez um vírus artificial a tentar entrar numa célula
Uma técnica de imagem inédita permitiu seguir o rasto a diminutas partículas parecidas com vírus e ver as suas interacções com células-alvo.
Normalmente, para visualizar um vírus a interagir com uma célula, é preciso recorrer às técnicas de microscopia electrónica que matam a célula. Mas agora, Kevin Welsher e Haw Yang, da Universidade de Princeton (EUA), conseguiram visualizar a “dança” de vírus artificiais em redor de fibroblastos vivos em cultura no laboratório (os fibroblastos são células da pele).
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Normalmente, para visualizar um vírus a interagir com uma célula, é preciso recorrer às técnicas de microscopia electrónica que matam a célula. Mas agora, Kevin Welsher e Haw Yang, da Universidade de Princeton (EUA), conseguiram visualizar a “dança” de vírus artificiais em redor de fibroblastos vivos em cultura no laboratório (os fibroblastos são células da pele).
As partículas de “vírus”, construídas de raiz pelos autores, eram na realidade minúsculas bolas de poliestireno equipadas com ainda mais diminutos fragmentos de material semicondutor que, ao emitirem luz, podiam ser detectados e seguidos por uma câmara de vídeo.
Com um diâmetro de cerca de 100 nanómetros (milionésimos de milímetro) – as partículas eram comparáveis em tamanho a vírus verdadeiros. E como a sua superfície tinha também sido "semeada" com moléculas de uma proteína do invólucro do VIH, elas comportavam-se como vírus da sida. De facto, este tipo de partículas (que têm a vantagem de ser inócuas), é hoje utilizado para simular infecções virais porque, tal como os verdadeiros vírus, estes vírus artificiais conseguem, graças às proteínas virais “espetadas” na sua superfície, ligar-se às células-alvo vivas e penetrar nelas.
O desafio aqui consistiu em filmar o que se passava em múltiplas escalas ao mesmo tempo. “As nanopartículas são pequenas e rápidas, enquanto as células são relativamente grandes e quase não se mexem”, diz Welsher em comunicado da sua universidade. O problema, explica Yang no mesmo documento, pode ser comparado a tentar fazer um vídeo de um colibri a voar de flor em flor num jardim. Se focarmos a câmara no colibri, o fundo fica desfocado; se a focarmos nas flores, é o pássaro que fica desfocado.
Para contornar o obstáculo, os cientistas utilizaram portanto duas câmaras – uma para seguir o rasto as partículas de vírus artificial e a outra para filmar as células e o seu entorno numa série de planos diferentes, de forma a reconstituir a “paisagem” 3D de fundo. E quando juntaram os dois tipos de imagens, obtiveram um nível de resolução sem precedentes da interacção partícula-célula.
No vídeo, vê-se uma partícula “viral” a mexer-se rapidamente e de forma errática até detectar a célula. A partir daí, o seu comportamento muda: a partícula explora mais lentamente a superfície celular, à procura de um ponto de entrada. Não o encontrando, afasta-se novamente. (Noutros registos, o vírus artificial acaba por conseguir entrar).
“O que o Kevin fez de realmente diferente foi capturar uma imagem tridimensional de uma partícula do tamanho de um vírus a atacar uma célula viva, ao passo que em microscopia electrónica, a imagem é bidimensional e as células estão mortas”, diz ainda Yang.
Segundo este cientista, a nova tecnologia poderá vir a ser aplicada ao desenvolvimento de novos antivirais, ao permitir ver esses potenciais medicamentos a entrarem nas células. E também poderá ser útil para o estudo da forma como os receptores de superfície das células interagem com os vírus, para tentar travar as infecções virais.