Elevado uso de tranquilizantes é “problema de saúde pública”, diz Infarmed
Portugueses usam muito mais medicamentos para a ansiedade e insónia do que os italianos, os noruegueses e os dinamarqueses.
Ao longo deste período, o que aumentou e muito no grupo dos psicofármacos foi a utilização de antidepressivos e de antipsicóticos, revela este estudo ontem divulgado. Entre 2000 e 2012, o consumo de antidepressivos calculado em doses diárias por mil habitantes mais do triplicou e o de antipsicóticos cresceu 170%. A venda de ansiolíticos, sedativos e hipnóticos (vulgarmente designados tranquilizantes) aumentou 6%, mas este continua a ser o subgrupo com maior utilização em Portugal (96 doses diárias por mil).
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Ao longo deste período, o que aumentou e muito no grupo dos psicofármacos foi a utilização de antidepressivos e de antipsicóticos, revela este estudo ontem divulgado. Entre 2000 e 2012, o consumo de antidepressivos calculado em doses diárias por mil habitantes mais do triplicou e o de antipsicóticos cresceu 170%. A venda de ansiolíticos, sedativos e hipnóticos (vulgarmente designados tranquilizantes) aumentou 6%, mas este continua a ser o subgrupo com maior utilização em Portugal (96 doses diárias por mil).
Na comparação com três países europeus (Itália, Noruega e Dinamarca) efectuada no estudo, é no consumo de tranquilizantes que Portugal se destaca. Tanto na Noruega (com 62 doses diária por mil habitantes), como em Itália (53) e na Dinamarca (31) a utilização de tranquilizantes é bastante inferior.
Relativamente aos antidepressivos, os dinamarqueses usam-nos mais do que os portugueses, mas os italianos consomem muito menos. Nos antipsicóticos não há grandes diferenças entre estes países.
“O aumento dos níveis de utilização pode dever-se a uma utilização mais prolongada destes fármacos, a novos utilizadores devido a uma melhor taxa de diagnóstico, maior acessibilidade dos medicamentos ou introdução de novas indicações terapêuticas”, pondera a especialista do Infarmed.
Mas Cláudia Furtado lembra que “o facto de Portugal apresentar dos maiores níveis de utilização de benzodiazepinas [designação científica dos tranquilizantes]” já veio “realçado no relatório do International Narcotic Board [Organização Internacional de Controlo de Estupefacientes]” em 2004 . “As benzodiazepinas são fármacos com um bom perfil de segurança e efectivos nas indicações para as quais estão aprovados, quando administrados por curtos períodos de tempo”, refere. No entanto, o seu uso crónico, “para além dos riscos de dependência, tem efeitos ao nível das capacidades psicomotoras, estando demonstrado que aumenta o risco de fracturas e acidentes de viação”, avisa.
“Há, de facto, um consumo desregulado, muito continuado de benzodiazepinas em Portugal, quando as guidelines internacionais recomendam que não sejam tomadas por mais do três ou quatro semanas”, reconhece o coordenador do Programa Nacional para a Saúde Mental, Álvaro Carvalho. O psiquiatra recorda, a propósito, que no relatório “Portugal: Saúde Mental em Números”, apresentado no ano passado, já se chamava a atenção para este problema. No documento sublinhava-se que os tranquilizantes mais consumidos (alprozolam e lorazepam) são justamente os que apresentam maior risco de dependência.
É um problema de saúde pública? É, admite Álvaro Carvalho, que lamenta que ainda “não seja valorizado pelos doentes, nem às vezes pelos médicos”. “O que seria previsível era que o a um aumento do consumo de antidepressivos correspondesse uma diminuição de benzodiazepinas, o que não se verificou em Portugal”, sustenta.
Para perceber por que motivos é que os portugueses recorrem tanto a este tipo de medicamentos seria necessário “fazer um estudo sociológico e antropológico”, advoga o psiquiatra, para quem a solução poderia passar por “uma regulamentação mais adequada”, eventualmente por “uma redução da comparticipação destes medicamentos”.
“Este é um problema demasiado complexo para se analisar apenas com uma série de números”, contrapõe a presidente da Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental, Luísa Figueira. Para retirar conclusões era preciso perceber se estes medicamentos “foram vendidos com ou sem receita médica, saber quantos são os doentes, onde estão”, defende. “A situação não está suficientemente estudada”, diz.