Salários em Portugal ainda deveriam baixar entre 2% e 5%, defende Bruxelas

Comissão Europeia calcula que é necessário mais ajustamento salarial para colocar endividamento externo a nível sustentável.

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Durão Barroso e Passos Coelho Foto: Eric Fededberg/AFP

Bruxelas começa por assinalar que “desde 2010 Portugal registou um ajustamento significativo nos custos unitários de trabalho nominais”. Este indicador mostra qual é o custo assumido pela empresa com os seus trabalhadores por cada unidade produzida. Segundo os cálculos da Comissão Europeia, entre o primeiro trimestre de 2010 e o terceiro trimestre de 2013, os custos unitários de trabalho caíram 5,3%. Analisando apenas o sector privado, a queda foi de 6%, uma vez que em 2013, no sector público, sentiu-se o efeito da reposição dos subsídios de férias e de Natal.

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Bruxelas começa por assinalar que “desde 2010 Portugal registou um ajustamento significativo nos custos unitários de trabalho nominais”. Este indicador mostra qual é o custo assumido pela empresa com os seus trabalhadores por cada unidade produzida. Segundo os cálculos da Comissão Europeia, entre o primeiro trimestre de 2010 e o terceiro trimestre de 2013, os custos unitários de trabalho caíram 5,3%. Analisando apenas o sector privado, a queda foi de 6%, uma vez que em 2013, no sector público, sentiu-se o efeito da reposição dos subsídios de férias e de Natal.

Apesar desta correcção salarial acentuada desde a chegada da troika, a Comissão chega à conclusão de que é preciso ir mais longe. Por duas razões: o elevado nível de endividamento externo da economia e a taxa de desemprego. Bruxelas parte do princípio que uma redução do nível salarial ajuda a melhorar a situação nesses dois indicadores.

O endividamento externo de Portugal foi em 2013 de 114% do PIB.  Embora reconheça que para este indicador estabilizar o actual nível salarial já é o adequado, a Comissão considera que, “dado o elevado nível de endividamento, uma estabilização pode não ser suficiente para garantir uma redução das vulnerabilidades [de Portuga] relacionadas com a sua posição externa".

Assim, calcula que “para atingir um patamar alternativo de redução do endividamento a metade até 2023, os salários ainda estão entre 2% e 5% sobreavaliados”, consoante o crescimento do PIB nominal que é considerado. Nestas contas, a Comissão assume que a produtividade – outro factor que pode influenciar o saldo com o exterior – cresce de acordo com as previsões actuais.

A lógica seguida nestes cálculos é a de que uma redução do nível salarial de uma economia acaba por gerar um aumento da competitividade das suas empresas face ao exterior, resultando numa melhoria do saldo comercial, com mais exportações e menos importações. Esta recomendação da Comissão Europeia sai no mesmo dia em que o Banco de Portugal revela que a balança portuguesa com o exterior registou em 2013 um excedente de 2,6% do PIB. Este valor representa uma melhoria face aos 0,3% registados em 2012 (o primeiro ano de excedente após vários anos de défice elevados). Um dos principais contributos veio das exportações de serviços, e, em particular, do turismo, que cresceram 7,5%.

Para além do desequilíbrio externo, a Comissão Europeia diz também que “Portugal precisa de garantir uma moderação salarial suficiente para absorver o desemprego”. Neste caso, o que é feito no relatório é estimar o impacto que o nível salarial tem na procura de emprego por parte das empresas.

A conclusão a que Bruxelas chega é que “uma redução de um ponto percentual na taxa de desemprego requer uma redução dos salários reais de cerca de 2,4%”. Como o objectivo, neste caso, é colocar a taxa de desemprego ao nível da taxa de desemprego estrutural, a redução salarial pedida é de cerca de 5%.

No relatório publicado na quarta-feira, o Fundo Monetário Internacional também voltou a assinalar que as reformas realizadas na legislação laboral ainda não produziram todos os efeitos desejados para devolver a competitividade a Portugal. O fundo, contudo, defendeu que a aposta deveria centrar-se agora nas reformas dos mercados de produto (reduzindo as rendas dos sectores não sujeitos a concorrência externa, por exemplo), aliviando mais a exigência ao nível das reformas do mercado laboral.

No relatório desta quinta-feira, a Comissão Europeia apresenta uma análise bastante menos crítica do que o FMI sobre os dados da recuperação da economia registados por Portugal nos últimos trimestres. Em relação às reformas estruturais, afirma que Portugal já adoptou um leque muito variado de medidas, mas assinala que a aplicação efectiva das reformas "é essencial” e que “mais reformas serão necessárias”, nomeadamente ao nível da flexibilidade dos mercados de produto e laboral.

Moderação salarial vai continuar


O Governo português tem insistido que o ajustamento salarial já foi feito. Ainda assim, durante a 11.ª revisão que hoje começa, o Governo deverá apresentar os resultados do relatório elaborado no final do ano passado sobre a descentralização das negociações salariais e sobre as formas de promover  a “flexibilidade salarial”.

A moderação salarial é para manter. O salário mínimo deverá continuar congelado nos 485 euros e mantêm-se as restrições à extensão dos efeitos dos contratos colectivos (nomeadamente dos aumentos salariais) às empresas não filiadas nas associações que os assinaram.

De acordo com o memorando de entendimento, qualquer aumento do salário mínimo só poderá ocorrer, se isso for justificado “por desenvolvimentos económicos e no mercado de trabalho” e desde que seja “acordado no quadro” das revisões do programa português. Já a extensão dos contratos colectivos deverá obedecer aos critérios previstos na resolução do Conselho de Ministros 90/2012.

Além disso, e de acordo com o relatório da décima avaliação elaborado pela Comissão Europeia, divulgado esta quinta-feira, o Governo comprometeu-se a apresentar até ao final de Fevereiro uma “análise independente para saber se é desejável reduzir a sobrevivência dos contratos colectivos que caducaram e não foram renovados”.

Em causa estão as convenções ou contratos colectivos que têm uma cláusula que prevê que eles só cessam se forem substituídos por outro contrato. A lei prevê que essa cláusula cessa passados cinco anos desde a denúncia da convenção por uma das partes que a assinaram, desde a última publicação integral da convenção ou desde a apresentação de uma proposta de revisão que inclua essa cláusula.

Este prazo é muito contestado pelas confederações patronais, nomeadamente pela Confederação Empresarial de Portugal (CIP).