Stuart Hall (1932-2014), um pioneiro do multiculturalismo que marcou várias gerações
Os trabalhos de Stuart Hall sobre questões de raça, género e identidade marcaram o debate intelectual da esquerda britânica desde os anos 1950 até hoje.
“A obra de Stuart Hall influenciou várias gerações de teóricos da cultura e da política, incluindo a actual” e “as suas análises continuam ainda hoje a ser profundamente importantes quer para académicos, quer para activistas políticos de esquerda”, afirmou ao PÚBLICO, num depoimento enviado por e-mail, o sociólogo e teórico da comunicação Peter Golding, responsável pelas áreas de investigação e inovação na universidade inglesa de Northumbria. Uma influência que fica a dever-se à contínua actividade intelectual de Hall, designadamente como colaborador regular, acrescenta Golding, da “muito lida revista Soundings”, uma publicação académica de estudos políticos assumidamente situada à esquerda.
Para o historiador Geoff Eley, Hall “foi o pensador crítico mais importante da esquerda que emergiu da efervescência dos anos 1960 e 1970”. Também numa declaração escrita, o professor da universidade norte-americana do Michigan disse ao PÚBLICO que Hall “combinou de modo muito lúcido” as “mais difíceis áreas da alta teoria”, o “senso comum”, o “alcance visionário”, a “precisão da análise política contemporânea” e “um espírito excepcionalmente generoso em todas as formas de comunicação”.
O impacto da obra de Hall, e em particular os seus textos sobre questões de raça, género, sexualidade e identidade, ultrapassou largamente os círculos académicos. E o mesmo se pode dizer dos seus estudos dos anos 1970 sobre o discursos dos meios de comunicação social, que mostraram as ligações entre os media o preconceito racial, como Encoding and Decoding in the Television Discourse (1973).
Este último tinha por base “uma tentativa inovadora de começar a teorizar a produção, a circulação e a recepção de ideias, imagens e significados gerados no seio dos meios de comunicação de massas contemporâneos”, explica Geoff Eley, “à medida que são recebidos e negociados por indivíduos e colectivos”.
Nos anos 1980, foi um dos principais colaboradores do jornal Marxism Today, cuja crítica do thatcherismo influenciou líderes trabalhistas como Neil Kinnock ou Tony Blair, mas nos últimos anos mostrava-se cada vez mais pessimista em relação à esquerda britânica e ao Partido Trabalhista em particular. Numa entrevista dada há dois anos ao diário The Guardian, afirmava: “A esquerda está em apuros: não tem ideias e não tem uma perspectiva própria e autónoma”.
Nascido em 1932 em Kingston, no seio de uma família jamaicana de classe média, Hall mudou-se com a mãe para o Reino Unido em 1951, tendo estudado, como bolseiro, na universidade de Oxford. Socialista, esteve ligado, com outros intelectuais marxistas, como o historiador comunista E. P. Thompson ou Ralph Miliband – pai dos actuais dirigentes trabalhistas Edward e David Miliband – ao lançamento de jornais e revistas de esquerda, como The New Reasoner ou a New Left Review.
Professor de estudos dos media no Chelsea College, publicou em 1964, com Paddy Whannel, The Popular Arts, que rapidamente se tornaria uma obra de referência e que está na origem do convite que lhe foi dirigido nesse mesmo ano, por Richard Hoggart, para integrar o Centre for Contemporary Cultural Studies (CCCS) da universidade de Birmingham, quartel-general do que viria a ser conhecido, no âmbito dos Estudos Culturais, como a escola de Birmingham.
Stuart Hall substituiu Hoggart na direcção em 1968 e permaneceu na instituição até 1979, quando assumiu o cargo de professor de sociologia na Open University, que manteve até se reformar. No final de Junho, a universidade de Birmingham assinalará os 50 anos do CCCS através de uma conferência na qual Hall participaria, juntamente com académicos como Geoff Eley, Lawrence Grossberg, Jo Littler, Jackie Stacey ou Richard Johnson, outro dos fundadores do centro.
“Ele era um professor extraordinário – não apenas na sala de aula, no auditório e no mundo institucional da universidade, mas no sentido mais amplo da pedagogia pública e política”, sublinha Geoff Eley. O “espírito de amplo calibre” e o eclectismo colocaram-no “acima dos debates muitas vezes ásperos e destrutivos entre a esquerda intelectual”.
Eley lembra que Hall era capaz de “pensar simultaneamente dentro de uma ampla variedade de tradições de pensamento contemporâneo, demonstrando ao mesmo tempo e de forma concreta o valor de tentar construir e sustentar uma conversa não-sectária”.
Entre as suas obras mais conhecidas, contam-se, além das já referidas, Situating Marx: Evaluations and Departures (1972), o seu contributo para o volume colectivo Policing the Crisis (1978), The Hard Road to Renewal (1988), Resistance through Rituals (1989), Modernity and Its Future (1992), Questions of Cultural Identity (1996), Cultural Representations and Signifying Practices (1997) ou Visual Cultural (1999).
Em 2013, John Akomfrah realizou um documentário sobre a vida de Hall e o seu legado intelectual, intitulado The Stuart Hall Project.
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“A obra de Stuart Hall influenciou várias gerações de teóricos da cultura e da política, incluindo a actual” e “as suas análises continuam ainda hoje a ser profundamente importantes quer para académicos, quer para activistas políticos de esquerda”, afirmou ao PÚBLICO, num depoimento enviado por e-mail, o sociólogo e teórico da comunicação Peter Golding, responsável pelas áreas de investigação e inovação na universidade inglesa de Northumbria. Uma influência que fica a dever-se à contínua actividade intelectual de Hall, designadamente como colaborador regular, acrescenta Golding, da “muito lida revista Soundings”, uma publicação académica de estudos políticos assumidamente situada à esquerda.
Para o historiador Geoff Eley, Hall “foi o pensador crítico mais importante da esquerda que emergiu da efervescência dos anos 1960 e 1970”. Também numa declaração escrita, o professor da universidade norte-americana do Michigan disse ao PÚBLICO que Hall “combinou de modo muito lúcido” as “mais difíceis áreas da alta teoria”, o “senso comum”, o “alcance visionário”, a “precisão da análise política contemporânea” e “um espírito excepcionalmente generoso em todas as formas de comunicação”.
O impacto da obra de Hall, e em particular os seus textos sobre questões de raça, género, sexualidade e identidade, ultrapassou largamente os círculos académicos. E o mesmo se pode dizer dos seus estudos dos anos 1970 sobre o discursos dos meios de comunicação social, que mostraram as ligações entre os media o preconceito racial, como Encoding and Decoding in the Television Discourse (1973).
Este último tinha por base “uma tentativa inovadora de começar a teorizar a produção, a circulação e a recepção de ideias, imagens e significados gerados no seio dos meios de comunicação de massas contemporâneos”, explica Geoff Eley, “à medida que são recebidos e negociados por indivíduos e colectivos”.
Nos anos 1980, foi um dos principais colaboradores do jornal Marxism Today, cuja crítica do thatcherismo influenciou líderes trabalhistas como Neil Kinnock ou Tony Blair, mas nos últimos anos mostrava-se cada vez mais pessimista em relação à esquerda britânica e ao Partido Trabalhista em particular. Numa entrevista dada há dois anos ao diário The Guardian, afirmava: “A esquerda está em apuros: não tem ideias e não tem uma perspectiva própria e autónoma”.
Nascido em 1932 em Kingston, no seio de uma família jamaicana de classe média, Hall mudou-se com a mãe para o Reino Unido em 1951, tendo estudado, como bolseiro, na universidade de Oxford. Socialista, esteve ligado, com outros intelectuais marxistas, como o historiador comunista E. P. Thompson ou Ralph Miliband – pai dos actuais dirigentes trabalhistas Edward e David Miliband – ao lançamento de jornais e revistas de esquerda, como The New Reasoner ou a New Left Review.
Professor de estudos dos media no Chelsea College, publicou em 1964, com Paddy Whannel, The Popular Arts, que rapidamente se tornaria uma obra de referência e que está na origem do convite que lhe foi dirigido nesse mesmo ano, por Richard Hoggart, para integrar o Centre for Contemporary Cultural Studies (CCCS) da universidade de Birmingham, quartel-general do que viria a ser conhecido, no âmbito dos Estudos Culturais, como a escola de Birmingham.
Stuart Hall substituiu Hoggart na direcção em 1968 e permaneceu na instituição até 1979, quando assumiu o cargo de professor de sociologia na Open University, que manteve até se reformar. No final de Junho, a universidade de Birmingham assinalará os 50 anos do CCCS através de uma conferência na qual Hall participaria, juntamente com académicos como Geoff Eley, Lawrence Grossberg, Jo Littler, Jackie Stacey ou Richard Johnson, outro dos fundadores do centro.
“Ele era um professor extraordinário – não apenas na sala de aula, no auditório e no mundo institucional da universidade, mas no sentido mais amplo da pedagogia pública e política”, sublinha Geoff Eley. O “espírito de amplo calibre” e o eclectismo colocaram-no “acima dos debates muitas vezes ásperos e destrutivos entre a esquerda intelectual”.
Eley lembra que Hall era capaz de “pensar simultaneamente dentro de uma ampla variedade de tradições de pensamento contemporâneo, demonstrando ao mesmo tempo e de forma concreta o valor de tentar construir e sustentar uma conversa não-sectária”.
Entre as suas obras mais conhecidas, contam-se, além das já referidas, Situating Marx: Evaluations and Departures (1972), o seu contributo para o volume colectivo Policing the Crisis (1978), The Hard Road to Renewal (1988), Resistance through Rituals (1989), Modernity and Its Future (1992), Questions of Cultural Identity (1996), Cultural Representations and Signifying Practices (1997) ou Visual Cultural (1999).
Em 2013, John Akomfrah realizou um documentário sobre a vida de Hall e o seu legado intelectual, intitulado The Stuart Hall Project.