Râguebi, um jogo para gente bem-educada

Devemos deixar claro a marca que distingue a comunidade “rugbística”: a vitória, sendo importante e o objectivo de cada equipa, não é o mais importante

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Reuters

Nós, gentes do râguebi, gostamos, mostrando o diferente que nos sentimos, de publicitar a definição do jogo no conceito de ser "um jogo de rufias jogado por gente bem-educada". E embora já não seja apenas de cavalheiros porque, como também sabemos, os homens não são mais os únicos na modalidade, continuam a existir profundas razões para o definirmos assim.

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Nós, gentes do râguebi, gostamos, mostrando o diferente que nos sentimos, de publicitar a definição do jogo no conceito de ser "um jogo de rufias jogado por gente bem-educada". E embora já não seja apenas de cavalheiros porque, como também sabemos, os homens não são mais os únicos na modalidade, continuam a existir profundas razões para o definirmos assim.

Desde sempre o jogo de râguebi tem mostrado uma ética própria subordinada a um conjunto de valores que se estabelecem no seu "Código do Jogo" que, hoje em dia, está integrado nas Leis do Jogo. De facto, existe toda uma maneira de estar que se pretende diferente e tradutora de uma cultura distinta em que o respeito, o "fair-play", o espírito colectivo de equipa, o companheirismo, a abnegação, o sacrifício, a disciplina, a boa educação, constituem algumas das componente de valores e atitudes que formatam a envolvência do jogo.

E assim sendo, é natural que possamos utilizar, com orgulho, a marca da diferença - um amigo meu, médico e frequentador internacional de estádios de futebol, viu, pela primeira vez, um jogo de râguebi (França-All Blacks) no centenário da FFR: não julgava possível, dizia, a confraternização permanente entre os espectadores adversários que o rodeavam e que vestiam camisolas diferentes - com as cores das suas equipas. Espantado, tornou-se adepto.

Mas se pretendemos sê-lo, devemos, no mínimo, parecê-lo. E o que se passa, neste cada vez mais difícil mundo desportivo português, à volta dos nossos campos em dia de jogo, não pertence a este mundo edílico que pretendemos transmitir aos de fora. Espectadores, antigos jogadores na sua maioria, insultam árbitros e adversários, chamam nomes a quem bem querem e comportam-se como rufiotes numa constante demonstração arruaceira, deixando - para inglês ver - a proclamação da pretendida boa educação.

O jogo de râguebi não é fácil de gerir. Os árbitros, como os jogadores, têm dificuldades na análise da sequência pela rapidez da acção e pelo número de intervenientes. Mas próximos e se pertencentes ao mesmo patamar, vêem melhor e analisam quase sempre melhor.

E, na grande maioria dos casos, tomam a decisão correcta e são os espectadores que, ignorantes da Lei, protestam violentamente, impondo a emoção à razão, pressionando para que a sua cor, apesar de faltosa, deixe de ser "roubada!". Nada deste comportamento se justifica ou ajuda o râguebi português no seu desenvolvimento e progressão.

Pelo contrário: desfocaliza jogadores, pressiona treinadores e árbitros de forma desadequada, retira lucidez aos intervenientes e transforma o jogo num espectáculo nada dignificante e que só diminui o campo de influência da modalidade.

Precisamos de melhorar todos os dias o râguebi que se joga em Portugal. Para o que necessitamos de melhores treinadores, melhores jogadores, melhores árbitros, melhores dirigentes. Numa vontade que dispensa claramente os piores exemplos da Blood, Sweat and Beers de antanho.

O râguebi tem que ser, no espaço do campo, no espaço dos espectadores, aquilo que diz ser: um desporto de gente bem-educada. E se, em vez do visível comportamento trauliteiro e para começar o novo ano, fizéssemos um esforço para aprender as Leis do Jogo e a sua aplicação prática?

Um esforço para que os treinadores fossem exigentes com os seus jogadores, educando-os de acordo com as Leis do Jogo; um esforço dos dirigentes para imporem o rigor das Leis do Jogo nas equipas dos seus clubes e decente comportamento aos seus adeptos; um esforço dos espectadores para que se comportassem como gente bem-educada.

E se não há, como também sabemos, jogos sem árbitros - sejam eles oficiais ou encontrados de acordo com os regulamentos - e para um futuro com tudo a correr pelo melhor, porque não tentar uma parceria: criar o hábito de convidar os árbitros para se treinarem semanalmente com os diversos clubes.

Talvez assim pudéssemos fazer compreender a marca da nossa diferença: no râguebi, a vitória, sendo importante e o objectivo de cada equipa, não é o mais importante; o mais importante é poder pertencer, com aceitação plena, a uma comunidade muito especial - a comunidade “rugbística”.

(Base: Texto sobre o mesmo tema escrito em Janeiro de 2009)