PS avança com providência cautelar para impedir venda de Mirós
Deputada Gabriela Canavilha revelou esta quarta-feira que os socialistas vão avançar com uma providência cautelar para impedir venda de 85 obras do pintor catalão.
“Esgotados os passos no quadro parlamentar e face à ausência de respostas do Governo às questões sucessivamente formuladas e aos requerimentos apresentados, o PS decidiu partir para uma providência cautelar, intentando uma acção judicial para evitar que esse espólio artístico neste momento português seja vendido em leilão na próxima semana”, declarou Canavilhas, aqui citada pela agência Lusa.
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“Esgotados os passos no quadro parlamentar e face à ausência de respostas do Governo às questões sucessivamente formuladas e aos requerimentos apresentados, o PS decidiu partir para uma providência cautelar, intentando uma acção judicial para evitar que esse espólio artístico neste momento português seja vendido em leilão na próxima semana”, declarou Canavilhas, aqui citada pela agência Lusa.
“Para o PS é fundamental que o Governo aja com responsabilidade e em conformidade com a legislação portuguesa. Consideramos que não estão a ser cumpridos os requisitos previstos na Lei de Bases do Património Cultural, o que leva ao desaparecimento do acesso público português desta colecção de arte. Nesse sentido só nos resta dar o passo seguinte e pedir que as instâncias judiciais se pronunciem sobre esta matéria”, acrescentou Gabriela Canavilhas, sublinhando que esta iniciativa se destina a “evitar que o interesse público seja lesado”.
Juntando-se à colega de bancada, José Magalhães explicou que a existência da providência cautelar e desta iniciativa socialista será divulgada na imprensa espanhola e britânica, para que não restem dúvidas daquilo que está previsto na lei portuguesa. A Christie's, empresa encarregue do leilão, também será informada de que a eventual venda é um acto "incerto e de risco".
Ainda segundo José Magalhães, o PS solicita ao tribunal que, “mesmo antes de apreciar a providência cautelar como tal, decrete uma medida provisória de suspensão da alienação, tendo em vista garantir a liberdade de apreciação e para não autorizar uma espécie de facto consumado”.
Esta acção da bancada do PS, que é também assinada pelos deputados Inês de Medeiros, Pedro Delgado Alves e Vitalino Canas, junta-se a um movimento de cidadãos que já fez chegar à Assembleia da República uma petição para impedir a alienação do espólio e a um projecto de resolução do partido ecologista "Os Verdes" que recomenda a suspensão da venda do acervo para efeitos de inventariação e classificação.
No documento com data de 24 de Janeiro que os Verdes fizeram chegar esta quarta-feira às redacções, os deputados Heloísa Apolónia e José Luís Ferreira acusam o Estado português de se estar a preparar para, "inacreditavelmente", "vender ao desbarato" uma colecção de "jóias artísticas" que tem potencial para enriquecer o país cultural e economicamente. Os parlamentares garantem ainda no mesmo projecto de resolução que os 35 milhões de euros que resultam da avaliação que a Christie's fez da colecção representam uma quantia "ridícula". A venda acrescentaria, pois, um "negócio ruinoso" a outro "negócio ruinoso" (o da própria nacionalização do BPN), agravado pelo facto de a exportação das obras não ter respeitado o disposto na Lei de Bases do Património Cultural.
O que diz a SEC
Na quarta-feira, por e-mail, através do seu assessor, João Póvoas, a Secretaria de Estado da Cultura (SEC) recusou ao PÚBLICO a consulta do dossier relativo à alienação dos 85 trabalhos em pintura, escultura, desenho e colagem de Joan Miró. A SEC alega que o processo ainda tem a sua “instrução em curso com vista à tomada de uma decisão final”.
Questionada sobre como pode este dossier carecer de decisão final quando as obras estão em Londres há mais de uma semana indo à praça dia 4, a SEC recusou quaisquer novos esclarecimentos. “Não há nada a acrescentar sobre o assunto em questão”, escreveu o mesmo assessor.
A SEC também não esclareceu qual a data constante na licença de exportação de que, por lei, têm de se fazer acompanhar todos os bens culturais que deixam o país e sem a qual a sua circulação transfronteiriça é considerada ilegal. Essas licenças são passadas pela Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC) que, tal como a SEC, também ontem, não prestou quaisquer esclarecimentos.
De acordo com os procedimentos em vigor na DGPC, uma licença de exportação pode ser passada penas após a emissão de pareceres especializados favoráveis. No caso da colecção Miró, o PÚBLICO sabe que a DGPC consultou pelo menos dois especialistas.
Um dos nomes, o do historiador de arte Pedro Lapa, actual director do Museu Berardo, foi tornado público com a sua presença, na semana passada, na Assembleia da República. Chamado a prestar esclarecimentos na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, Lapa explicou aos deputados que o seu parecer foi contrário à alienação das obras. E do dossier que a DGPC fez subir à SEC constará ainda um parecer de David Santos, o novo director do Museu do Chiado, que será favorável à integração das obras nas colecções do Museu Nacional de Arte Contemporânea, pedindo, assim, a permanência destas no país.
Ambos especialistas recusaram ontem a partilha pública das fundamentações que fizeram chegar à DGPC. O PÚBLICO sabe, no entanto, que esta documentação deu entrada no organismo competente no dia 15, apenas seis dias antes da inauguração, em Londres, de uma exposição pública em que a Christie’s reuniu os 85 trabalhos do artista catalão, apresentando-os ao público e eventuais compradores.
Até à hora de fecho desta edição, não foi possível apurar junto da Christie’s qual a exacta data de recepção das obras em Londres.
A SEC não concedeu até hoje à imprensa acesso ao dossier do polémico “caso Crivelli”, oito meses depois de se ter sabido que o actual Governo autorizou o empresário Miguel Pais do Amaral a vender no estrangeiro uma obra para a qual vários especialistas pediram o mais alto grau de protecção patrimonial português: o estatuto de Tesouro Nacional.
Foi precisamente o caso Crivelli que Canavilhas evocou para defender esta tarde que a acção judicial promovida pelo PS é o único meio de impedir que a colecção de Miró “nunca mais seja recuperada” pelo Estado Português. “Estamos convictos de que a venda das obras de Miró se iria realizar em condições altamente irregulares, porque vai contra a Lei de Bases do Património Português”, concluiu. com Lucinda Canelas