Governo da Ucrânia demite-se, mas as ruas continuam a pedir mais

Demissão do executivo e revogação das leis antiprotestos podem marcar início de um compromisso. Libertação de manifestantes presos é debatida nesta quarta-feira.

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Kiev acordou com o anúncio da demissão do primeiro-ministro, Mikola Azarov, que foi mais tarde aceite pelo Presidente, Viktor Ianukovitch. A decisão de Azarov, que adoptou sempre uma postura dura face aos protestos, tem o objectivo de “criar condições para um compromisso político para resolver o conflito pacificamente”, nas suas próprias palavras. A demissão de Azarov, no cargo desde 2010, precipitou a queda da totalidade do executivo, que vai ficar em funções até que um novo governo seja indicado e será liderado interinamente pelo vice-primeiro-ministro, Serhi Arbuzov.

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Kiev acordou com o anúncio da demissão do primeiro-ministro, Mikola Azarov, que foi mais tarde aceite pelo Presidente, Viktor Ianukovitch. A decisão de Azarov, que adoptou sempre uma postura dura face aos protestos, tem o objectivo de “criar condições para um compromisso político para resolver o conflito pacificamente”, nas suas próprias palavras. A demissão de Azarov, no cargo desde 2010, precipitou a queda da totalidade do executivo, que vai ficar em funções até que um novo governo seja indicado e será liderado interinamente pelo vice-primeiro-ministro, Serhi Arbuzov.

No Parlamento (Rada Suprema), a revogação das leis antiprotesto teve o voto favorável de 361 deputados, num total de 412 presentes. As leis, aprovadas a 16 de Janeiro, foram muito contestadas por restringirem liberdades básicas dos cidadãos e deram origem aos protestos mais violentos da semana passada.

Para o líder do partido da oposição Udar (Murro), Vitali Klitschko, a demissão de Azarov é "um passo para a vitória", dando a entender que não é apenas a queda do Governo que procuram. As medidas tomadas agora “devem acalmar as pessoas um mês no máximo”, afirmou o ex-pugilista ao jornal alemão Bild Zeitung. “Agora temos de quebrar o sistema”, acrescentou.

E a quebra do sistema irá passar precisamente por aquilo que não foi discutido no Parlamento e que representa as restantes reivindicações dos manifestantes: a amnistia aos detidos nos protestos, a revisão da Constituição e a marcação de eleições presidenciais antecipadas.

As conversações sobre a concessão de uma amnistia aos presos durante as manifestações dos últimos meses “não são fáceis”, como admitiu o presidente da Rada, Volodimir Ribak, no final da sessão. Esta quarta-feira será essa questão a ser votada pelos deputados, numa discussão que não será tão consensual como a das leis antiprotestos. O Partido das Regiões, de Ianukovitch e maioritário no Parlamento, quer que o perdão aos detidos seja concedido apenas quando os manifestantes abandonarem as ruas, condição que não terá acolhimento pela oposição.

Klitschko reafirmou a importância da aprovação da amnistia. “O terror começou em toda a Ucrânia quando as pessoas foram detidas e presas sem razão”, afirmou. O líder da oposição garantiu ainda que não desistiu do objectivo de retirar Ianukovitch do poder, cuja demissão considera “lógica”.

Nas ruas de Kiev, o ambiente era calmo e houve palmas quando se soube da revogação das leis polémicas, mas a desconfiança ainda é dominante. “As nossas reivindicações incluem a demissão de Ianukovitch, eleições legislativas antecipadas e uma nova Constituição.” “Que confiança podemos ter nas manobras de Ianukovitch? Apenas nos importa a sua demissão e as pequenas reuniões da oposição não nos interessam.” As palavras de Petro, um taxista entrevistado pelo jornal Kyiv Post, e de Mikola, que falou ao Le Monde, reflectem a perseverança que anima a Praça da Independência.

Europa aguarda compromisso
As decisões desta terça-feira foram saudadas pelas diplomacias europeias, que as encaram como uma oportunidade para se continuar a resolver a crise no campo político. O ministro dos Negócios Estrangeiros da Alemanha, Frank-Walter Steinmeier, espera que "com a demissão do primeiro-ministro os dirigentes da Ucrânia dêem um sinal à oposição de que vão organizar novas discussões" e que se encontre um "compromisso político".

O chefe da diplomacia francesa, Laurent Fabius, afirmou que "a França saúda a revogação, pelo Parlamento ucraniano, das leis que restringiam de forma inaceitável as liberdades públicas". "Essa decisão, bem como o anúncio do primeiro-ministro da sua demissão, deve reabrir a via do diálogo", acrescentou, citado pela AFP.

A sessão parlamentar coincidiu com a chegada da chefe da diplomacia da União Europeia, Catherine Ashton, a Kiev onde vai reunir-se com Ianukovitch e com os líderes da oposição. A “profunda preocupação com a crise política na Ucrânia” de Ashton levou-a a antecipar 48 horas a visita ao país.

As primeiras concessões à oposição aparecem depois de 70 dias de protestos que, de um teor inicialmente pacífico, degeneraram em violência. A estratégia de Ianukovitch continua a ser a do jogo da espera. Enquanto vai concedendo alguns trunfos aos seus opositores, consegue adiar a discussão sobre a sua própria liderança. Mas os analistas não têm dúvidas que o Presidente ucraniano já cedeu mais do que esperava quando os protestos começaram. As concessões, que há dois meses pareciam longínquas, parecem hoje insuficientes.