Não culpem os extraterrestres
Em vez de divulgar a história, o canal História oferece-nos um cardápio de especulações fundamentadas em objectos voadores não identificados. E não deixa de colocar uma cereja despenteada no topo do bolo: Giorgio Tsoulakos
Subscrevo a tese da crónica de João Nogueira Dias: o canal História é uma telenovela. A hipótese de seres avançados terem passado umas férias no nosso planeta é divertida, estimulante e supimpa. Explicar a mitologia, ou a religião, com pseudociência torna a coisa ainda mais curiosa e singular. O busílis disto tudo é que o Canal História dedica generosas horas de emissão aos extraterrestres — que interesse terão os nossos antepassados se temos criaturas que vieram do espaço sideral e trouxeram sofisticações como o telecomando?
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Subscrevo a tese da crónica de João Nogueira Dias: o canal História é uma telenovela. A hipótese de seres avançados terem passado umas férias no nosso planeta é divertida, estimulante e supimpa. Explicar a mitologia, ou a religião, com pseudociência torna a coisa ainda mais curiosa e singular. O busílis disto tudo é que o Canal História dedica generosas horas de emissão aos extraterrestres — que interesse terão os nossos antepassados se temos criaturas que vieram do espaço sideral e trouxeram sofisticações como o telecomando?
Em vez de divulgar a história, este canal oferece-nos um cardápio de especulações fundamentadas em objectos voadores não identificados e tecnologia similar à do Dr. Emmett L. 'Doc' Brown (Regresso ao Futuro). E não deixa de colocar uma cereja despenteada no topo do bolo: Giorgio Tsoulakos. O look do “historiador”, por ordens de razão que desconheço, faz-me lembrar o Hairdresser On Fire. Talvez seja o trecho da canção de Morrissey: “is it real!?” — o ponto de exclamação é mero acaso arbitrário.
Todavia, já que estou no rumo das especulações, que tal aventar uma suposição que explica todas as maravilhas da Antiguidade, sem culpar os extraterrestres? A possibilidade mais verosímil para as grandes proezas da tecnologia dos nossos antepassados é o facto de o cérebro humano ser engenhoso, capaz de produzir e criar obras portentosas, sendo, porém, mais eficaz a dar cabo delas. Há poucos dias, num dos cursos que estou a acompanhar no Coursera (Perspectivas Críticas na Gestão de Empresas), fiquei a saber da logística e tecnologia que os romanos utilizaram para alimentar a turba de Roma — a primeira cidade a atingir mais de um milhão de habitantes, estatuto que manteve por muitos séculos até ser superada por Londres. Os antigos foram capazes de façanhas espetaculares, se estas desapareceram ou obliteraram-se, e se hoje são uma miragem do que foram, é sinal que sucumbiram, tal como Roma.
Francis Fukuyama anunciou o fim da história. Não me parece. A história pode continuar a oferecer abundantes retrocessos e exemplos de decadência — como é o caso do referendo sobre a co-adopção. Volto à crónica de João Nogueira Dias, se algum de vós está céptico no facto da humanidade poder regressar ao passado, prestem atenção à quantidade de “bigfoots” que estão à vossa volta. Tenho a certeza que, se fizeram bem a contagem, o optimismo quanto ao inquebrantável progresso humano recua, tornando o pessimismo um quanto mais plausível.