Isolamento favorece opção pelos Açores para transbordo de armas químicas sírias

Neutralização de gases tóxicos no alto-mar durará entre 45 a 60 dias.

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As águas do Atlântico ao largo dos Açores Miguel Madeira

“Não é possível um estranho aparecer na ilha Terceira sem ninguém dar por isso”, afirmou Miguel Monjardino ao PÚBLICO, acrescentando que a proximidade da base das Lajes pode também dar alguma tranquilidade aos norte-americanos. Um atentado ou um acidente durante a operação de transbordo são riscos a ponderar, embora a acção esteja a ser conduzida por equipas altamente experientes da Organização para a Proibição de Armas Químicas (OPCW).

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“Não é possível um estranho aparecer na ilha Terceira sem ninguém dar por isso”, afirmou Miguel Monjardino ao PÚBLICO, acrescentando que a proximidade da base das Lajes pode também dar alguma tranquilidade aos norte-americanos. Um atentado ou um acidente durante a operação de transbordo são riscos a ponderar, embora a acção esteja a ser conduzida por equipas altamente experientes da Organização para a Proibição de Armas Químicas (OPCW).

O primeiro carregamento de armas químicas sírias que será destruído em alto-mar saiu na terça-feira, 7 de Janeiro, do porto sírio de Latakia, a bordo de um cargueiro dinamarquês, e dirigiu-se para águas internacionais, sob escolta de navios de guerra da Rússia e da China, entre outros países.

O destino esperado do navio era um porto italiano. Taranto, no Sul do país, tem sido apontado como o local para a realização da operação de transbordo do armamento químico para o navio norte-americano Cape Ray, que está sediado em Norfolk, nos Estados Unidos, e foi especialmente preparado para essa operação em alto-mar, que nunca terá sido feita antes.

“Não tenho conhecimento de uma operação deste tipo no alto-mar”, disse ao PÚBLICO Miguel Monjardino. O navio norte-americano procederá à destruição da parte mais perigosa do arsenal químico sírio, país que declarou possuir 1290 toneladas. “Estamos a falar de coisas muito perigosas, como gás sarin, gás mostarda e VX, que são muito voláteis e instáveis. Julgo que é por isso que nenhum país aceitou recebê-las e destruí-las em terra”, acrescentou o investigador.

O navio dinamarquês transportará cerca de 500 toneladas daqueles gases.

Em declarações recentes ao New York Times, numa visita ao Cape Ray, o subsecretário norte-americano da Defesa, Frank Kendall, disse que a capacidade dos EUA para levar por diante uma operação desse tipo é recente. “Há um ano, não estávamos em posição para o fazer”, declarou.

Uma vez transferidas para bordo do Cape Ray, serão destruídas através de um processo de hidrólise, que consiste na injecção de uma combinação de água a temperatura elevada que separa os componentes, de acordo com o diário francês Le Monde. O processo demorará entre 45 a 60 dias, segundo o mesmo jornal. “Os resíduos da operação terão que ser reprocessados na Alemanha”, afirmou ainda Miguel Monjardino.

Na semana passada, o Governo de Berlim disponibilizou instalações industriais perto da cidade de Munster, no Norte do país, para ajudar à destruição do armamento químico sírio, noticiou o New York Times.

O ministro dos Negócios Estrangeiros de Berlim, o social-democrata Franz-Walter Steinmeier, antecipou eventuais críticas do movimento ecologista alemão e do Partido Os Verdes, mas disse que a decisão do Governo alemão visava manter a credibilidade do país na questão síria. “Ninguém que tenha responsabilidades internacionais pode seriamente dizer que não neste caso”, afirmou o ministro.

A escolha de um porto italiano – além de Taranto, foram avançadas outras hipóteses, como Cagliari ou Brindisi, mas Taranto tem uma base naval importante – foi autorizada pelo Governo italiano. A ministra dos Negócios Estrangeiros italiana, Emma Bonino, frisou a importância de ser um porto “longe de centros urbanos densamente povoados”. Era esperada ontem uma decisão do Parlamento italiano quanto ao porto a escolher, de acordo com o jornal Gazzetta del Sud. A principal vantagem do Mediterrâneo para realizar esta operação decorre do facto de as suas águas serem mais calmas do que as do Atlântico.