Homossexuais católicos contra proposta de referendo à co-adopção por casais gay

Parlamento debate na quinta-feira, dia 16, um projecto de resolução do PSD que propõe realização de referendo. ILGA fala em "manobra dilatória" da direita.

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O projecto do PS permite apenas a co-adopção de crianças filhas de um dos cônjuges NUNO FERREIRA SANTOs

Na quinta-feira, o Parlamento irá debater um projecto de resolução do PSD que propõe a realização de um referendo sobre a possibilidade de co-adopção pelo cônjuge ou unido de facto do mesmo sexo e sobre a possibilidade de adopção por casais do mesmo sexo, casados ou unidos de facto.

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Na quinta-feira, o Parlamento irá debater um projecto de resolução do PSD que propõe a realização de um referendo sobre a possibilidade de co-adopção pelo cônjuge ou unido de facto do mesmo sexo e sobre a possibilidade de adopção por casais do mesmo sexo, casados ou unidos de facto.

Para o coordenador nacional da associação Rumos Novos - Homossexuais Católicos esta proposta "não faz sentido", porque o sistema jurídico-constitucional assenta na representatividade e não na democracia directa. As questões relativas "a franjas minoritárias da população" devem ser acauteladas "por legislação devidamente salvaguardada e respaldada nos representantes da nação e não numa situação de referendo que mais não é do que tentar impor um determinado ponto de vista à sociedade", defende José Leote.

Para José Leote, esta proposta de referendo é "uma tentativa de alguns sectores da sociedade portuguesa de fazer reverter a legislação devidamente aprovada pela Assembleia da República". Leote alude ao projecto-lei do PS que estabelece que "quando duas pessoas do mesmo sexo sejam casadas ou vivam em união de facto, exercendo um deles responsabilidades parentais em relação a um menor por via da filiação ou adopção, pode o cônjuge ou o unido de facto co-adoptar" a criança.

Este projeto foi aprovado na generalidade em Maio do ano passado, com 99 votos a favor, 94 contra e nove abstenções e debatido na especialidade na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. Contudo, no projecto de resolução, os deputados do PSD consideram que "esta matéria não foi objecto de discussão pública aturada e repetida, como merecem ser as questões que implicam directamente a assumpção comunitária de um caminho de não retorno e cuja decisão final, sem comprometer a liberdade democrática que avaliza a discórdia, não admite tibiezas no cumprimento daquela que é a vontade maioritária".

Para o coordenador da Rumos Novos, o projecto socialista, "verdadeiramente equilibrado" e que "salvaguarda um conjunto de situações" pretendeu "estender o guarda-chuva do instituto da adopção a situações que já existem e que era necessário tutelar no âmbito do direito". "Se eventualmente temos receio de que a lei possa ser subvertida e utilizada noutro espírito do que aquele que estava inicialmente na mente do legislador, então que se regulamente a lei no sentido de impedir esses eventuais excessos", defende.

Na proposta, os deputados do PSD consideram "ser imperativo proporcionar ao povo português a oportunidade de se pronunciar sobre esta questão que toca em valores e direitos fundamentais que devem ser assumidos na base da liberdade das convicções de cada um".

 

"Manobra dilatória", aponta a associação ILGA

Também a associação ILGA Portugal considera a proposta de referendo sexo uma "manobra dilatória" que revela "falta de respeito" pelo processo parlamentar, mas também pelas crianças e famílias. Para o presidente da ILGA - Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual e Transgénero, o conteúdo da proposta "é ilegal" porque incide sobre mais do que uma questão, "o que não é possível por lei".

"São duas matérias diferentes, uma das quais não tem nenhum tipo de processo legislativo iniciado no Parlamento e, portanto, não está de acordo com o que seria o requisito para ser admissível", argumenta Paulo Côrte-Real. Que critica também o facto de esta proposta surgir após vários meses de trabalho na especialidade sobre o projecto-lei do PS para a co-adopção por casais ou unidos de facto do mesmo sexo.

"Esta proposta de referendo não é séria", comenta, lembrando que a discussão do projecto envolveu várias entidades e teve contributos de instituições europeias. "É uma manobra dilatória que revela falta de respeito pelo processo parlamentar e por todas as entidades envolvidas" e, sobretudo, pelas crianças e famílias que já existem e precisam dessa proteção legal, frisa.

Por outro lado, aponta, vai contra as indicações e recomendações do Conselho da Europa. Lembra que o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos condenou recentemente a Áustria por não contemplar esta protecção legal para crianças criadas por casais do mesmo sexo e "condenaria também Portugal" caso a situação chegasse a este tribunal.

"Temos uma situação urgente a resolver", reitera Paulo Côrte-Real, sublinhando que "Portugal é dos poucos países do Conselho da Europa que tem esta discriminação". Os outros países são a Rússia, a Roménia e a Ucrânia, "que obviamente não são paradigmas do cumprimento dos direitos humanos". Esta situação "não só viola, mais uma vez, compromissos de Portugal a nível internacional", no âmbito dos direitos humanos, "mas viola sobretudo a garantia de protecção do bem-estar de crianças que precisam de ver reconhecidas na lei as suas mães e os seus pais".

Para o responsável, é necessário "enfrentar com seriedade" esta questão e "garantir a possibilidade de votação final global de um projecto-lei que, no processo de especialidade, veio tornar claras essas duas questões".