Viver com sentido em 2014. Ainda e sempre com o Eusébio

2013 não foi um bom ano. A conjuntura não o permitiu, mas a estrutura já não o possibilita há muito: enquanto as “Jotas” não forem constitucionalmente proibidas e os políticos não respeitarem, sem necessidade de coação, o livro da democracia, não será razoável, com esperança, esperar.

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2013 não foi um bom ano. A conjuntura não o permitiu, mas a estrutura já não o possibilita há muito: enquanto as “Jotas” não forem constitucionalmente proibidas e os políticos não respeitarem, sem necessidade de coação, o livro da democracia, não será razoável, com esperança, esperar.

Enquanto tal não ocorre, procuremos, cada um por si e de si para todos, um sentido nas nossas vidas. A nossa felicidade em 2014, que, a acontecer, será indecentemente aproveitada pelo discurso político como um efeito dos seus feitos económicos, é bem mais importante do que esse previsível oportunismo. Tão previsível que até dá para afirmar que, mantendo-se o atual estado de coisas, manter-se-á a vergonhosa relação de identificação entre a política e a vulgaridade. Sim, a política, quando reduz as decisões dos que a fazem à previsibilidade, faz dos que as tomam homens vulgares.

O sentido nas nossas vidas emergirá desde que cada um de nós faça o que é objetivamente válido, apreciando-o no seu íntimo. Esta tese não é minha. É de Susan Wolf, uma reconhecida filósofa norte-americana, mas subscrevo-a por inteiro. Se cada um de nós estiver consciente de que aquilo que faz tem valor intrínseco e sentir prazer ao fazer isso que faz, o olhar aprovador dos outros coincidirá com a nossa sensação de realização pessoal. O dentista, ao levantar-se, percebendo que sem ele os rostos se inflamam, e que os doentes dos dentes vivem vidas infelizes – e dolorosas! –, sorri ao chegar ao consultório. O homem do lixo, tomando consciência de que sem ele a cidade está substantivamente “lixada”, com contentores a tombar por excesso e epidemias a advir da insalubridade pública, recolhe a sujidade com a sensação de estar a satisfazer uma dupla necessidade: sua e dos outros.

Que melhor exemplo de uma pessoa que experimentou o sentido na vida que Eusébio? Cada um daqueles golos resulta da sua alegria em ser jogador de futebol. Cada um daqueles golos contagia, na alegria, os que deles são simples espectadores. Cada um daqueles golos é uma síntese: é a junção do útil ao agradável. Desde que apreciado com moderação, o futebol é objetivamente útil: dele, como Eusébio, vêm pessoas que inspiram nações. Desde que jogado com o coração, o futebol é subjetivamente agradável: nele, como Eusébio, há jogadores que amam a modalidade, amando os que também os amam. Cedo o seu coração falhou por sofrer de mais por todos nós. Tanto que nesta triste semana, já sem poder jogar, ainda quis ir ao relvado marcar, para nós, o seu último golo: dar-nos uma última alegria. Deu-nos um corpo cuja alma era o bem maior.

Foi-se Eusébio e com ele as festas. Foram-se os Reis e com eles Eusébio. Fica-nos dele o exemplo de uma vida com sentido. E os exemplos servem para serem seguidos. Sigamos Eusébio fazendo os nossos afazeres com alegria, e com a sensação de que, sem cada um de nós, o mundo era um lugar pior para se viver. Que o digam o dentista e o homem do lixo. Disse-o tão bem Eusébio.

Professor