Ano Novo, vida velha
“Metas”, dizem eles, e de preferência ambiciosas. O novo ano tornou-se sinónimo de imposição de mudanças. Mas, pelas minhas contas, a esperança média de vida de uma resolução de ano novo ainda consegue ser inferior à de uma libelinha
Enviámos votos de boas festas iguais para todos os contactos do telemóvel, comemos e gastámos mais do que era suposto, rimos com o Sozinho em Casa como se fosse a primeira vez, apreciámos a hipocrisia das mensagens de Natal transmitidas na televisão e suspirámos de alívio quando encontrámos o talão de troca. Afinal de contas, também disto é feito o Natal.
Ainda a fazer a digestão de metade de um cabrito e doze rabanadas, sou assediado por uma questão: “Então e a passagem de ano?”. Pois é, falta pouco para o ?réveillon (como dizem os mais sofisticados) e muitos de nós ainda não sabem onde vão abrir o espumante.
Chegar a dia 31 e não ter nenhum programa é como ir ao baile de finalistas sem par. No entanto, à semelhança de anos anteriores, acabamos por conseguir um sítio onde não faltem os aperitivos encarquilhados que concedem desejos, uma bebida com uma rolha que sai disparada e um fogo-de-artifício colorido para assinalar que já chegámos a Janeiro. E como nos filmes da Disney, acaba sempre tudo bem.
Tal e qual como acontece com a sexta-feira, o fim do mês ou os 15 dias em Agosto, depositamos no novo ano a esperança de uma vida mais feliz. Acreditamos que será nesses 365 dias que a existência fará mais sentido. As badaladas da meia-noite tocam alinhadas com os desejos que sussurramos para nós mesmos. Pedimos para dentro aquilo que gostávamos que acontecesse cá fora. “Este ano é que vai ser!”, gritamos nós no meio de beijos, brindes e abraços. Mas será que vai?
“Metas”, dizem eles, e de preferência ambiciosas. Se não planeares e prometeres, idealmente por escrito, aquilo que tem de acontecer a partir de Janeiro, então não estás a fazer as coisas como devem ser. O novo ano tornou-se sinónimo de imposição de mudanças. Somos coagidos a comprometermos-nos com algo, caso contrário levam-nos a crer que estamos a estagnar. Portanto, nós — à semelhança de uma qualquer multinacional — fazemos o balanço do ano que passou e traçamos objectivos. Não importa o sentido, o importante é crescer.
Vamos inscrever-nos no ginásio. Arranjar um trabalho onde se ganhe mais e se trabalhe menos. Ganhar coragem de dizer à nossa chefia o que realmente pensamos dela. Terminar o namoro que nos condiciona. Começar aquela dieta. Viajar mais. Fazer voluntariado. Ler mais. Ser mais. Balbuciamos todos estes compromissos porque tem de ser, porque é o que toda a gente faz, porém, e porque a imitação não fica por aqui, fingimos que nos esquecemos de assinar em baixo. Sabemos pedir, mas será que conseguimos acreditar?
Basta olharmos para o nosso cadastro que ficamos logo a saber o que, na verdade, irá acontecer. Vai “faltar tempo” para o ginásio. É melhor não arriscar, este trabalho não é assim tão mau. Não importa se é um chefe desumano, tem é de gostar de mim. Talvez não deva acabar o namoro porque, provavelmente, não arranjarei melhor. Comer um bolo por dia e beber mais Coca-Cola do que água não faz assim tão mal. Viajar tem tempo, quero é mudar de carro. Não conheço nenhuma associação com a qual possa colaborar (é melhor nem procurar). A mensalidade da Netflix fica mais em conta que um livro. Ser mais ou menos chega.
E, desta forma, o primeiro dia do ano regista, sistematicamente, a maior taxa de natalidade de promessas. Infelizmente, passados poucos dias assinala-se também a maior taxa de mortalidade dessas mesmas promessas. Pelas minhas contas, a esperança média de vida de uma resolução de ano novo ainda consegue ser inferior à de uma libelinha.
Sejamos sinceros. Da mesma forma que não precisamos de esperar pela ?happy hour para ficarmos alegres, também não precisamos de aguardar pelo novo ano para nos renovarmos. A vida acontece, sem calendários, nem horários. Chega de ilusões do “agora é que vai ser”, chega de fazermos buracos na areia e enfiar lá a cabeça à procura de resoluções de ano novo que não queremos assim tanto. Não vale a pena esperar pelas doze passas, por alguém que nos salve, pelo tempo que não temos ou pelo dinheiro que nunca mais aparece. ?É importante recorrer à única pessoa que realmente nos pode ajudar: nós próprios. As rédeas são nossas, é hora de escolher pegar nelas. E, para isso, acreditem que não precisam de um ano novo, basta um instante. Experiment?em.
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Enviámos votos de boas festas iguais para todos os contactos do telemóvel, comemos e gastámos mais do que era suposto, rimos com o Sozinho em Casa como se fosse a primeira vez, apreciámos a hipocrisia das mensagens de Natal transmitidas na televisão e suspirámos de alívio quando encontrámos o talão de troca. Afinal de contas, também disto é feito o Natal.
Ainda a fazer a digestão de metade de um cabrito e doze rabanadas, sou assediado por uma questão: “Então e a passagem de ano?”. Pois é, falta pouco para o ?réveillon (como dizem os mais sofisticados) e muitos de nós ainda não sabem onde vão abrir o espumante.
Chegar a dia 31 e não ter nenhum programa é como ir ao baile de finalistas sem par. No entanto, à semelhança de anos anteriores, acabamos por conseguir um sítio onde não faltem os aperitivos encarquilhados que concedem desejos, uma bebida com uma rolha que sai disparada e um fogo-de-artifício colorido para assinalar que já chegámos a Janeiro. E como nos filmes da Disney, acaba sempre tudo bem.
Tal e qual como acontece com a sexta-feira, o fim do mês ou os 15 dias em Agosto, depositamos no novo ano a esperança de uma vida mais feliz. Acreditamos que será nesses 365 dias que a existência fará mais sentido. As badaladas da meia-noite tocam alinhadas com os desejos que sussurramos para nós mesmos. Pedimos para dentro aquilo que gostávamos que acontecesse cá fora. “Este ano é que vai ser!”, gritamos nós no meio de beijos, brindes e abraços. Mas será que vai?
“Metas”, dizem eles, e de preferência ambiciosas. Se não planeares e prometeres, idealmente por escrito, aquilo que tem de acontecer a partir de Janeiro, então não estás a fazer as coisas como devem ser. O novo ano tornou-se sinónimo de imposição de mudanças. Somos coagidos a comprometermos-nos com algo, caso contrário levam-nos a crer que estamos a estagnar. Portanto, nós — à semelhança de uma qualquer multinacional — fazemos o balanço do ano que passou e traçamos objectivos. Não importa o sentido, o importante é crescer.
Vamos inscrever-nos no ginásio. Arranjar um trabalho onde se ganhe mais e se trabalhe menos. Ganhar coragem de dizer à nossa chefia o que realmente pensamos dela. Terminar o namoro que nos condiciona. Começar aquela dieta. Viajar mais. Fazer voluntariado. Ler mais. Ser mais. Balbuciamos todos estes compromissos porque tem de ser, porque é o que toda a gente faz, porém, e porque a imitação não fica por aqui, fingimos que nos esquecemos de assinar em baixo. Sabemos pedir, mas será que conseguimos acreditar?
Basta olharmos para o nosso cadastro que ficamos logo a saber o que, na verdade, irá acontecer. Vai “faltar tempo” para o ginásio. É melhor não arriscar, este trabalho não é assim tão mau. Não importa se é um chefe desumano, tem é de gostar de mim. Talvez não deva acabar o namoro porque, provavelmente, não arranjarei melhor. Comer um bolo por dia e beber mais Coca-Cola do que água não faz assim tão mal. Viajar tem tempo, quero é mudar de carro. Não conheço nenhuma associação com a qual possa colaborar (é melhor nem procurar). A mensalidade da Netflix fica mais em conta que um livro. Ser mais ou menos chega.
E, desta forma, o primeiro dia do ano regista, sistematicamente, a maior taxa de natalidade de promessas. Infelizmente, passados poucos dias assinala-se também a maior taxa de mortalidade dessas mesmas promessas. Pelas minhas contas, a esperança média de vida de uma resolução de ano novo ainda consegue ser inferior à de uma libelinha.
Sejamos sinceros. Da mesma forma que não precisamos de esperar pela ?happy hour para ficarmos alegres, também não precisamos de aguardar pelo novo ano para nos renovarmos. A vida acontece, sem calendários, nem horários. Chega de ilusões do “agora é que vai ser”, chega de fazermos buracos na areia e enfiar lá a cabeça à procura de resoluções de ano novo que não queremos assim tanto. Não vale a pena esperar pelas doze passas, por alguém que nos salve, pelo tempo que não temos ou pelo dinheiro que nunca mais aparece. ?É importante recorrer à única pessoa que realmente nos pode ajudar: nós próprios. As rédeas são nossas, é hora de escolher pegar nelas. E, para isso, acreditem que não precisam de um ano novo, basta um instante. Experiment?em.