Independentes reclamam alterações à Lei Eleitoral Autárquica que “beneficia escandalosamente os partidos”
Três meses depois de terem sido eleitos, os autarcas das listas independentes dizem que estão “mais livres” para responder aos cidadãos e acusam as “máquinas" partidárias de tomarem conta dos lugares.
Treze municípios, mais seis do que em 2009, são agora geridos por independentes que reclamam alterações à Lei Eleitoral Autárquica (LEA) porque, alegam, “favorece escandalosamente os partidos políticos”, e tentam fazer frente a uma das maiores chagas sociais que varrem o país: o desemprego.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Treze municípios, mais seis do que em 2009, são agora geridos por independentes que reclamam alterações à Lei Eleitoral Autárquica (LEA) porque, alegam, “favorece escandalosamente os partidos políticos”, e tentam fazer frente a uma das maiores chagas sociais que varrem o país: o desemprego.
Eleitos há apenas três meses, alguns dos autarcas independentes estão ainda a dar os primeiros passos na gestão municipal. Mas não ignoram as dificuldades que têm pela frente e afirmam que “vai levar ainda muito tempo” a terem uma representação equiparada à dos partidos políticos tradicionais em órgãos de particular importância como é o caso da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP).
Rui Moreira admite que algumas das promessas feitas na campanha “não vão poder ser concretizadas num prazo tão imediato” como gostaria, devido a várias restrições que se prendem, segundo afirma, não apenas com a transferência de verbas da administração central, mas também com a indefinição do próximo Quadro Comunitário de Apoio.
O presidente da Câmara do Porto disse ao PÚBLICO que o mandato “está a decorrer sem surpresas” e mostra-se “muito satisfeito” com o acordo de governação feito com o PS. “Hoje já nem nos lembramos por que partido é que Manuel Pizarro e Manuel Correia Fernandes foram eleitos”, afirma o autarca, que lamenta que o “modelo de decisão nas câmaras seja lento”. “É a natureza da nossa lei autárquica”, remata.
Também Luís Filipe Mourinha, reeleito pela segunda vez para a Câmara de Estremoz, critica a LEA, porque esta “favorece escandalosamente os partidos políticos”. E não entende por que é que um independente que seja eleito presidente de câmara necessita de recolher novamente assinaturas, se quiser recandidatar-se em próximas eleições. “Um independente sufragado a primeira vez deve ficar com condições de igualdade relativamente aos partidos”, argumenta o autarca eleito pelo Movimento Independente por Estremoz. Mourinha presidiu ao município durante três mandatos, tendo sido agora eleito como independente nas listas da CDU.
O presidente faz reparos aos procedimentos administrativos a que as câmaras estão obrigadas e deixa um desafio ao Tribunal Constitucional para que fiscalize os programas dos partidos políticos com assento parlamentar. “Os políticos concorrem com base em programas eleitorais, afirmam-se sociais-democratas, mas depois tomam decisões liberais que não constam dos programas pelos quais foram eleitos”, argumenta.
Autarcas filiados obrigados à obediência partidária
O novo presidente da Câmara de Vila Nova de Cerveira, o independente João Fernando Nogueira, considera que as “pessoas estão saturadas dos partidos tradicionais” e assume que é “mais fácil governar como independente do que governar debaixo da sigla partidária”. No entanto, reconhece que a liberdade de um independente “tem custos” face ao “peso dos lobbies partidários que se organizam para tomar conta dos lugares em organismos como a ANMP”.
O autarca independente, que sucedeu ao socialista José Manuel Carpinteiro, não tem dúvidas de que “vai levar muito tempo para que os independentes possam ter assento em alguns organismos importantes que se encontram nas mãos das máquinas partidárias”.
Guilherme Pinto, que tirou a Câmara de Matosinhos ao PS – durante muitos anos o seu partido –, respira agora de alívio porque acabou a intriga. “Durante sete anos, a gestão não teve um minuto de descanso para poder responder aos ataques. Agora é muito mais fácil chegar aos cidadãos, já não há ninguém a tentar desmerecer as iniciativas só para fazer política como acontecia até aqui”, constata Guilherme Pinto, sublinhando que venceu as eleições “por mérito próprio”.
Com a saída de Rui Rio e a entrada de Rui Moreira, o independente enfatiza a relação que em tão pouco tempo se estabeleceu entre Matosinhos e o Porto e mostra-se “espantado” com o facto de os “partidos ignorarem o peso dos autarcas independentes, não os consultando para nada”.
Salvaguardando que cada caso é um caso, Guilherme Pinto, que sucedeu a si próprio, dá conta das dificuldades que os independentes enfrentam e afirma: “Ou os candidatos já têm uma presença forte junto da comunidade pela qual vão ser eleitos, como aconteceu com Rui Moreira, ou têm um percurso – como é o meu caso – que os credibiliza.”
Nos elogios que deixa a Rui Moreira, o autarca de Matosinhos acredita que o presidente da Câmara do Porto irá fazer “uma boa gestão” e que a sua performance “poderá desencadear o aparecimento de candidaturas independentes noutros concelhos”.
O ex-autarca do PS não poupa o partido liderado por António José Seguro, deixando críticas à direcção nacional e à distrital do Porto pela “escolha profundamente errada para Matosinhos e por não terem feito até hoje um acto de contrição pela derrota”.
De maneira diferente pensa Adelaide Teixeira. A independente que agora lidera a Câmara de Portalegre concede que os autarcas independentes “não estão sujeitos às indicações partidárias a nível da gestão municipal”, mas empenha-se em não dar grande importância ao pendor partidário. “O que se pretende é fazer uma gestão equilibrada, rigorosa e transparente”, afirma a nova presidente do município alentejano. “É evidente que os autarcas que são filiados têm uma obediência partidária, mas a nível da gestão do dia-a-dia não há grandes diferenças”, sustenta.
Eleita em Setembro numa lista independente, a autarca, que já liderava a câmara da capital do distrito desde a saída do social-democrata Mata Cáceres, em Junho de 2011, diz que a sua candidatura a Portalegre aconteceu por “um imperativo de consciência”. Adelaide Teixeira argumenta que o facto de nunca ter pertencido a qualquer partido (em 2009 integrou a lista do PSD como independente) lhe dá uma grande serenidade e revela que até agora não encontrou da parte do Governo entraves de nenhuma natureza.