Paris até perder de vista
O propósito da viagem era unicamente trabalho. Três dias passados em La Défense, de onde não se vê a Torre Eiffel
A perspetiva de ir a Paris é sempre sedutora. Mesmo quando se sabe que se vai passar três dias a trabalhar. Nos breves momentos de fuga, o esforço de procurar o nosso espaço no controverso bairro de La Défense viria a ser altamente recompensado.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
A perspetiva de ir a Paris é sempre sedutora. Mesmo quando se sabe que se vai passar três dias a trabalhar. Nos breves momentos de fuga, o esforço de procurar o nosso espaço no controverso bairro de La Défense viria a ser altamente recompensado.
Projetada no final dos anos 50 com o objetivo de se tornar um centro de negócios, La Défense é, em termos de área, o maior centro empresarial da Europa.
Com três fases de desenvolvimento, nas décadas de 60, 70 e 80, a região afirmou-se também no horizonte de Paris, com as suas enormes torres envidraçadas, sedes de grandes empresas, a criarem um novo ponto de fuga na perspetiva da cidade.
Entre os edifícios que fazem o queixo ficar em ângulo raso com o pescoço, a pioneira Torre Initiale, de 1966, a renovada Torre CB21, de 1974 e a toda ela espelhos Torre Total, de 1985, são as que se destacam em tamanha selva de pedra.
Talvez selva de pedra não seja a expressão ideal. À boa maneira de um jardim francês, as construções vanguardistas de La Défense parecem planeadas segundo uma intenção muito precisa.
A sensação é a de ter descolado de Paris e entrado numa estação espacial. A sinalética, a enorme laje pedonal, os declives, os jardins suspensos e as colunas labirínticas levam para muito longe do imaginário parisiense.
O Grande Arco, sobranceiro, construído no eixo histórico de Paris (é vê-lo desafiar o outro, quilómetros à frente), inaugurado em 1989, completa o cenário pós-espacial.
Os frágeis jardins e a galeria de arte ao ar livre La Défense não se limita, porém, ao planeamento e ao sentimento retro de que estamos no espaço sideral. Há um esforço em humanizar um polo que passou a ser também habitacional e comercial. Um segundo olhar mostra-nos um ambiente quase gracioso. Foi ao terceiro dia que as escadarias do outro lado do Grande Arco pareceram o local perfeito para tomar o pequeno-almoço comprado no Quatre Temps. Os jardins prolongam o eixo histórico da cidade e deixam esquecer que estamos rodeados de espelho, mármore, granito e ferro.
A imensa passarela sobre o verde expõe toda a vulnerabilidade de La Défense. Evocando os quatro elementos naturais, as rochas, os bambus, as pequenas fontes e os asiáticos miscanthus contrastam com a rigidez dos negócios.
La Défense é também um museu ao ar livre. Ao longo de toda a laje pedonal estendem-se obras de arte impressionantes, de artistas como Miró ou Baldaccini. Sem bilhete de ingresso. São 64 esculturas espalhadas por um percurso que se faz a pé, evitando assim o metro. Entre elas, a Cheminée Moretti, de Raymond Moretti, projeta uma quantidade de linhas multicolores em fibra de vidro diretamente para o céu.
Na hora da despedida, La Défense deixou de ser simplesmente um híbrido entre Manhattan e Brasília. Também já não evoca apenas uma enorme plataforma espacial. Não é Paris mas é um animal em constante evolução, abrindo ainda as asas para voos mais altos.
Da janela do quarto do hotel, La Défense era sobretudo o ninho de falcões bebés que resolveram que aquela torre era o espaço ideal para nascer. Foram precisamente eles que deram sentido a todo aquele imenso sonho futurista.