Ministro do Interior da Guiné foi quem exigiu embarque dos 74 sírios para Portugal
De acordo com o relatório da comissão de inquérito divulgado na manhã desta segunda-feira, “houve de facto uma intervenção directa” do ministro, que alegou “motivos de segurança interna” para a saída dos sírios do território guineense. Segundo o documento, “não houve coacção nem física nem armada em relação à tripulação da TAP, nem ao chefe de escala” da companhia aérea. O relatório conclui também que a ordem do embarque dos 74 sírios foi dada pelo director-geral de escalas das delegações da TAP em África, a partir de Lisboa.
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De acordo com o relatório da comissão de inquérito divulgado na manhã desta segunda-feira, “houve de facto uma intervenção directa” do ministro, que alegou “motivos de segurança interna” para a saída dos sírios do território guineense. Segundo o documento, “não houve coacção nem física nem armada em relação à tripulação da TAP, nem ao chefe de escala” da companhia aérea. O relatório conclui também que a ordem do embarque dos 74 sírios foi dada pelo director-geral de escalas das delegações da TAP em África, a partir de Lisboa.
Entretanto, Suka Ntchama estava ao início da tarde a ser ouvido por dois magistrados no Ministério Público em Bissau sobre o sucedido a 10 de Dezembro, acompanhado do seu advogado.
Tal como o PÚBLICO tinha noticiado em meados de Dezembro, foi António Suka Ntchama que deu directamente a ordem, por telefone, ao chefe de escala da companhia de aviação nacional. Na semana seguinte, o ministro acabou por colocar o seu cargo à disposição. Na sequência deste incidente, a TAP suspendeu os voos para Bissau, estando a transportar os passageiros que tinham reservas efectuadas de e para este destino através de ligações alternativas, em parceria com a Air Senegal.
O documento não foi divulgado na totalidade pelo ministro da Justiça, Saido Baldé, que presidiu à comissão de inquérito, pelo facto de se encontrar, segundo o governante, em segredo de justiça. Saido Baldé admitiu que o aeroporto de Bissau está a ser utilizado "por uma rede internacional" de tráfico de imigrantes, nomeadamente pessoas que fogem de países em guerra, tendo adiantado que o Governo de Bissau vai pedir à Interpol para ajudar as autoridades guineenses a identificar as pessoas envolvidas neste tipo de ilegalidades. Vai, ainda, solicitar à TAP a retoma dos voos directos entre Bissau e Lisboa.
O presidente da comissão de inquérito referiu que o ministro do Interior guineense terá feito "uma pressão" por telefone ao chefe da escala da TAP em Bissau para que este autorizasse o embarque dos sírios. Pressionado, "via telefone e não com recurso a armas de fogo", o chefe da escala da TAP em Bissau "teria informado o seu superior hierárquico em Lisboa, Sérgio Bagulho, de quem terá recebido indicações no sentido de deixar embarcar os sírios para que a questão fosse resolvida em Portugal", refere o relatório.
"A responsabilidade pela partida do voo (de Bissau para Lisboa) não é exclusiva do ministro do Interior, terá sido partilhada com o chefe da escala, director-geral da TAP", disse Saido Baldé. O presidente da comissão de inquérito explicou que o seu colega que detém a pasta do Interior entendeu que os sírios não podiam ficar em Bissau, uma vez que "estavam de passagem" pela Guiné-Bissau. António Suka Ntchama terá concluído que, por não terem vistos de permanência na Guiné-Bissau, deviam seguir viagem para o seu destino final. Caso contrário, "os outros passageiros também não podiam ir" de Bissau para Lisboa, acrescentou Saido Baldé.
O governante afirmou, por outro lado, que o Governo de transição guineense "não comunga" das afirmações do ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, Rui Machete, que comparou o incidente com o avião da TAP a um acto de terrorismo.
Os resultados das averiguações ao incidente com o avião da TAP vão agora ser entregues ao Ministério Público, para que os implicados no caso sejam judicialmente responsabilizados, uma vez que, de acordo com Saido Baldé, os factos apurados na investigação preliminar "consubstanciam indícios criminais". O presidente da comissão de inquérito referiu ainda que não caberá apenas ao Governo, de forma isolada, retirar as consequências políticas deste caso, mas a todas as autoridades políticas do país. "Os envolvidos vão ser responsabilizados directa e indirectamente", declarou, adiantando que "algumas pessoas" envolvidas no embarque forçado "já foram suspensas" de funções. Um comerciante guineense de 51 anos, apontado como tendo sido o responsável pela ida dos 74 sírios de Marrocos para Bissau, encontra-se detido desde 11 de Dezembro.