Sem barulho
A esquerda “sem filiação” devia arranjar outra maneira de se entreter.
O dr. Carvalho da Silva não é evidentemente obrigado a pensar hoje o que pensou ontem; e de toda a evidência nada lhe garantia ser o n.º 1 de uma lista eventual do “Partido Livre”. Apareceu, assim, um manifesto, o “manifesto 3 D”, que oferece uma espécie de paraíso aos portugueses, desde “erradicar a pobreza” a “pôr fim aos resgates, com esse ou outro nome”. Não falta nesse caderno de encargos nada que um adolescente analfabeto não pudesse querer, excepto a ideia um pouco obsoleta de ressuscitar os mortos.
Os 3 D do Partido Socialista em 1974 eram “descolonizar, democratizar e desenvolver”. Os 3 D de hoje são “a dignidade, a democracia e o desenvolvimento”. Aparentemente, 40 anos não chegaram para o trivial, apesar dos fundos da “Europa” e muita parlapatice. Como os promotores do “movimento” dizem, e dizem bem, “é tempo” de tratar seriamente do caso. Infelizmente, a grande maioria desses promotores já tentou e já falhou na missão urgente de salvar a Pátria. Vieram do PC, do Bloco, do PS, do vaporoso “Partido Livre”, mesmo do lúgubre PRD do general Eanes. Ou seja, arrastam atrás de si uma carreira de tristeza e fracasso, de inutilidade e arrependimento. Muitos estão, de resto, reformados e não se deviam meter em aventuras liceais, deviam ficar em casa a beber chá e a ler os livros que não leram.
O actual modo de vida dos “promotores” também não inspira uma especial confiança. Há dúzias de professores de Lisboa e de Coimbra, artistas de vária pena e pinta, um doutorando em “estudos de cinema” e um humorista. Mas ninguém, ou quase ninguém, ligado a uma empresa, ou a uma câmara, ou a qualquer serviço da administração central. O “programa” do “manifesto” mostra esta ignorância essencial. Parece que os “promotores” imaginam que a sua vontade só por si, reunida, por exemplo, num hotel ou no Teatro Trindade, basta para mudar o mundo e o país. Não basta, como é óbvio. Bastará talvez para eleger Manuel Carvalho da Silva (ou um anónimo solitário) deputado ao Parlamento Europeu, onde o mandarão calar como ele merece. A esquerda “sem filiação” devia arranjar outra maneira de se entreter. Sem barulho.
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O dr. Carvalho da Silva não é evidentemente obrigado a pensar hoje o que pensou ontem; e de toda a evidência nada lhe garantia ser o n.º 1 de uma lista eventual do “Partido Livre”. Apareceu, assim, um manifesto, o “manifesto 3 D”, que oferece uma espécie de paraíso aos portugueses, desde “erradicar a pobreza” a “pôr fim aos resgates, com esse ou outro nome”. Não falta nesse caderno de encargos nada que um adolescente analfabeto não pudesse querer, excepto a ideia um pouco obsoleta de ressuscitar os mortos.
Os 3 D do Partido Socialista em 1974 eram “descolonizar, democratizar e desenvolver”. Os 3 D de hoje são “a dignidade, a democracia e o desenvolvimento”. Aparentemente, 40 anos não chegaram para o trivial, apesar dos fundos da “Europa” e muita parlapatice. Como os promotores do “movimento” dizem, e dizem bem, “é tempo” de tratar seriamente do caso. Infelizmente, a grande maioria desses promotores já tentou e já falhou na missão urgente de salvar a Pátria. Vieram do PC, do Bloco, do PS, do vaporoso “Partido Livre”, mesmo do lúgubre PRD do general Eanes. Ou seja, arrastam atrás de si uma carreira de tristeza e fracasso, de inutilidade e arrependimento. Muitos estão, de resto, reformados e não se deviam meter em aventuras liceais, deviam ficar em casa a beber chá e a ler os livros que não leram.
O actual modo de vida dos “promotores” também não inspira uma especial confiança. Há dúzias de professores de Lisboa e de Coimbra, artistas de vária pena e pinta, um doutorando em “estudos de cinema” e um humorista. Mas ninguém, ou quase ninguém, ligado a uma empresa, ou a uma câmara, ou a qualquer serviço da administração central. O “programa” do “manifesto” mostra esta ignorância essencial. Parece que os “promotores” imaginam que a sua vontade só por si, reunida, por exemplo, num hotel ou no Teatro Trindade, basta para mudar o mundo e o país. Não basta, como é óbvio. Bastará talvez para eleger Manuel Carvalho da Silva (ou um anónimo solitário) deputado ao Parlamento Europeu, onde o mandarão calar como ele merece. A esquerda “sem filiação” devia arranjar outra maneira de se entreter. Sem barulho.