Estado recusa-se a pagar 15 mil euros a homem preso por engano durante um mês
No recurso interposto para o Tribunal da Relação do Porto, o Ministério Público reclama a absolvição ou, pelo menos, "ser condenado no pagamento de uma indemnização em montante substancialmente reduzido", invocando decisões do Supremo Tribunal de Justiça em casos idênticos de perda da liberdade.
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No recurso interposto para o Tribunal da Relação do Porto, o Ministério Público reclama a absolvição ou, pelo menos, "ser condenado no pagamento de uma indemnização em montante substancialmente reduzido", invocando decisões do Supremo Tribunal de Justiça em casos idênticos de perda da liberdade.
O acórdão do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia proferido em Outubro passado explica que em 2008 o verdadeiro autor do crime, depois de detido, identificou-se "falsamente" na Polícia Judiciária do Porto e foi presente a primeiro interrogatório judicial como sendo Bacar Balde, sem que os inspectores confirmassem a veracidade da identidade que então apresentou. O homem ficou sujeito à medida de coacção de termo de identidade e residência. Em Outubro de 2009, Bacar Balde foi acusado de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência. Após várias tentativas falhadas de notificação foi julgado e condenado, à revelia, a três anos e meio de prisão.
O acórdão do Tribunal de Gaia frisa que autoridades detectaram o "erro na detenção do verdadeiro autor" do crime depois da realização de testes de ADN, os quais comprovaram que o homem na casa dos 30 anos que estava a cumprir pena no Estabelecimento Prisional de Lisboa "nada tinha a ver com os factos denunciados". Quando foram emitidos os mandados de libertação, já Bacar Balde tinha cumprido um mês da pena.
O acórdão de primeira instância atribuiu as responsabilidades à actuação dos investigadores e explica que "em nenhum momento" o tribunal poderia "antecipar" que estava a julgar a pessoa errada. O Tribunal de Gaia critica ainda o comportamento do lesado por "nada requerer no processo" que permitisse evitar a sua prisão, uma vez que, "tendo antecedentes criminais" [por outro tipo de crimes], conhecia o funcionamento do sistema de justiça. Este é outro dos fundamentos do recurso do Ministério Público, apesar de o acórdão de primeira instância acrescentar que a actuação omissiva" de Bacar Balde "não exclui a responsabilidade" da administração, servindo, porém, como atenuante no cálculo da indemnização a pagar pelo Estado.
"Esse comportamento omissivo, revelador de culpa censurável, sendo determinante para a privação da sua liberdade [do lesado], deve acarretar a exclusão de qualquer indemnização a suportar pelo réu [Estado]", sustenta o recurso enviado para a Relação do Porto.
Fonte ligada ao processo adiantou que o verdadeiro autor do crime de abuso sexual continua por identificar.