França inicia intervenção militar na República Centro-Africana
Mais de 1000 soldados vão tentar pôr fim a 12 meses de violência extrema no país. Segundo a Unicef, 6000 crianças estarão a ser treinadas para combater.
O objectivo da operação Sangaris é conter a extrema violência que tem assolado o país desde a deposição do Presidente François Bozizé, em Março, pela milícia Séléka, uma aliança de grupos rebeldes de maioria muçulmana.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
O objectivo da operação Sangaris é conter a extrema violência que tem assolado o país desde a deposição do Presidente François Bozizé, em Março, pela milícia Séléka, uma aliança de grupos rebeldes de maioria muçulmana.
Se esta sexta-feira não houve notícia de gande violência, um grande número de habitantes de Bangui, a capital, juntou-se nos arredores do aeroporto, onde o Exército francês e a força da União Africana presente no território têm as suas bases, por receio de represálias nos seus bairros, diz a AFP. No quarteirão da Assembleia Nacional, a Cruz Vermelha encontrou dezenas de cadáveres abandonados após os violentos confrontos da véspera e de matanças indiscriminadas, com armas de fogo ou machetes.
"Temos de garantir a segurança, temos de desarmar os grupos. Temos de garantir que os vândalos, os bandidos, as milícias saibam que não podem usar as ruas de Bangui para as suas batalhas", disse o ministro francês da Defesa, Jean-Yves Le Drian, através da Radio France Internationale, anunciando o início da segunda intervenção francesa em África neste ano, depois do Mali.
No total, são 1200 os soldados franceses que vão tentar pôr fim a uma vaga de massacres e violência entre muçulmanos e cristãos que fez pelo menos 281 mortos só em dois dias em Bangui. O contingente que já se encontra no aeroporto envolveu-se na quinta-feira em confrontos com um grupo de combatentes de origem desconhecida. "Homens armados chegaram aqui em carrinhas de caixa aberta e dispararam contra as posições francesas. Nós respondemos e os combatentes foram mortos", disse à Reuters um porta-voz do Exército, Gilles Jarron.
A intervenção francesa – resguardada por uma autorização dos 15 membros do Conselho de Segurança das Nações Unidas – vai reforçar também a presença da União Africana, que conta com 2500 soldados na República Centro Africana. O plano inicial é pôr termo aos combates nos próximos seis meses, mas o actual primeiro-ministro considera que esse prazo não será suficiente.
"Seis meses parece-me pouco. Devemos precisar de um ano. Se eles [os militares franceses] conseguirem resolver os problemas, tanto melhor, mas preferia que ficassem um ano", disse Nicolas Tiangaye à Radio France Internationale.
O anúncio do envio de soldados franceses foi bem recebido pela maioria da população, mas os relatos de massacres na região da capital e no Norte do país continuam a chegar.
Um dos habitantes da área PK12, à saída de Bangui, disse que combatentes da Séléka estavam a fazer uma operação porta a porta, para "pilhar e matar pessoas". O homem, que pediu para não ser identificado por razões de segurança, disse ainda que os militantes acusavam toda a gente de pertencer aos grupos anti-balako – grupos armados de cristãos que combatem os Séléka.
A República Centro-Africana, afirma o arcebispo Dieudonne Nzapalainga, entrou num "ciclo de violência". Uma violência que afecta de forma particular os mais desprotegidos, como as crianças, lembra a Unicef, em comunicado.
"Passado um ano sobre o início do conflito na República Centro-Africana, 2,3 milhões de crianças estão a ser afectadas por esta crise e a ser cada vez mais alvo de violência e recrutamento forçado, entre outras atrocidades", lê-se no texto enviado aos media nesta sexta-feira.
O director executivo da Unicef, Anthony Lake, lamenta a "demora" na intervenção externa no país e apela à protecção urgente das crianças. "Não pode haver mais demoras na tomada de medidas efectivas; não pode haver mais desculpas para não actuar em defesa das crianças e famílias da República Centro-Africana."
Segundo os números da Unicef, sete em cada dez crianças em idade de frequentar o ensino primário não voltaram às escolas desde Dezembro do ano passado. À imagem do próprio país, a rede de ensino foi praticamente dizimada: 80% das escolas da República Centro-Africana fecharam as portas nos últimos 12 meses. Para além dos casos de violência sexual contra menores, "incluindo violação colectiva", a Unicef estima que 6000 crianças estejam nas mãos dos grupos armados, a serem treinadas para combater.