Tempo começa a escassear para a Colômbia alcançar a paz com as FARC

As negociações entre o Governo e as guerrilhas das FARC para pôr fim a um conflito de cinco décadas vão progredindo vagarosamente. As eleições presidenciais de Maio vão ser também a decisão entre o diálogo e o confronto.

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O tráfico de droga foi o assunto mais recente levado para a mesa de negociações. É sabido que por trás da força que as FARC ainda têm está o dinheiro proveniente da comercialização de cocaína, cujas principais rotas passaram durante muito tempo pela Colômbia.

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O tráfico de droga foi o assunto mais recente levado para a mesa de negociações. É sabido que por trás da força que as FARC ainda têm está o dinheiro proveniente da comercialização de cocaína, cujas principais rotas passaram durante muito tempo pela Colômbia.

A organização de inspiração marxista rejeita as acusações do Governo de que as suas actividades sejam financiadas pelo dinheiro do tráfico e propôs, na quarta-feira, que os EUA e a Europa sejam chamados ao debate para assumirem as suas responsabilidades. "A política de luta contra as drogas deve abranger os Estados Unidos e a Europa", afirmou o chefe da delegação de negociadores das FARC, Iván Márquez. "Sem o seu empenho e contribuição para a redução da procura, para o tratamento dos problemas de consumo e da lavagem de dinheiro nos seus países, não haverá solução eficaz para o problema", acrescentou o número dois da organização.

É improvável que a reivindicação das FARC tenha uma resposta positiva da parte de Washington ou da Europa, como nota o colunista Fernando Londoño Hoyos no El Tiempo, ao enfatizar a ironia de os milicianos serem agora "assessores" do Governo para o narcotráfico. "Dirão que é uma grande pena que uma posição tão generosa e sensata como esta não seja compreendida", observa. E assim vão avançando, muito lentamente, as conversações na capital cubana.

A verdade é que algum caminho já foi trilhado no processo de paz. Em pouco mais de um ano, Governo e rebeldes já conseguiram acordos parciais para dois dos seis pontos que integram o roteiro das negociações. Fazendo um paralelismo com um jogo de futebol americano, o ministro da Defesa da Colômbia, Juan Pinzón Bueno, afirmou recentemente que as conversações estão na "zona vermelha", muito perto do touchdown: o acordo de paz.

Pequenas vitórias e muitas dúvidas
Em Maio foi alcançado um acordo relativamente à distribuição das terras que foram ocupadas durante o conflito armado, que deverá constituir uma "transformação radical da Colômbia rural", segundo as partes envolvidas. Há cerca de um mês, o segundo pilar das negociações foi fechado, com a abertura da possibilidade de as FARC participarem futuramente no processo político. Com uma declaração parca em pormenores, foi anunciado que serão criados "círculos eleitorais especiais" nas regiões mais afectadas pelo conflito, onde serão eleitos deputados afectos às FARC.

Esta não seria a primeira experiência política legal da organização guerrilheira. Nos anos 1980 chegou mesmo a ser criada a União Patriota, o braço partidário das FARC. No entanto, mais de 3000 dos seus filiados foram assassinados por organizações de extrema-direita, comprometendo as negociações em curso na época.

As questões deixadas em aberto são mais que muitas. Podem antigos guerrilheiros, muitos deles com mandados de captura, ser candidatos? Como será feita a atribuição de assentos? Quais os perigos de financiar um partido ligado às FARC? Como se vai processar a entrega das armas? A falta de pormenores foi criticada por alguma imprensa colombiana, que se referiu ao acordo como "um papelzito que não vale nada". No entanto, as críticas não impediram Juan Manuel Santos de receber com entusiasmo o progresso. "Chegámos mais longe do que nunca", afirmou.

Com a reforma agrária e a participação política já alcançadas, ficam a faltar quatro pontos essenciais no acordo: o tráfico de droga, o desarmamento, os direitos das vítimas e o acordo de paz.

Entre a negociação e a recusa
A notícia chegou em boa hora para Santos, à medida que o seu mandato se aproxima do fim e as eleições presidenciais, marcadas para Maio, já fazem mexer o país. O processo de paz foi a principal bandeira do actual Presidente e será esse o grande tema que vai mobilizar o período eleitoral. Dias depois do anúncio do acordo político, Juan Manuel Santos revelava que se vai recandidatar com o objectivo de terminar a tarefa. Do outro lado terá Óscar Zuluaga, ex-ministro das Finanças, apoiado pelo antigo Presidente Álvaro Uribe, que não pode recandidatar-se. Uribe continua a ser um dos políticos mais populares na Colômbia e o seu protegido já anunciou que, caso seja eleito, irá terminar qualquer conversação com as FARC, mantendo a linha dura do antigo governante.

O processo de negociação sofreu um revés recentemente, com a revelação, no mês passado, de um plano de uma das facções das FARC para assassinar Uribe, reforçando a posição do anterior Presidente de não negociar com "terroristas".

A seu favor, Santos tem o apoio da maioria da opinião pública à continuação das rondas negociais com os guerrilheiros, apesar de apenas uma pequena parte dos colombianos acreditar no seu sucesso. Logo após o anúncio do acordo político entre o Governo e as FARC, a taxa de aprovação do Presidente subiu para 37%. Acresce ainda o bom momento económico da Colômbia, cujo PIB cresceu 4,2% no segundo trimestre do ano, de acordo com o Wall Street Journal.

A Santos também se deve o sucesso da luta contra o narcotráfico. A imagem de uma Colômbia dominada pelos poderosos cartéis de droga, em que os raptos e homicídios eram frequentes, como narrou o Nobel da Literatura Gabriel García Márquez no livro "Notícia de um Sequestro", é hoje considerada ultrapassada. As grandes rotas do tráfico foram desviadas, nos últimos anos, para o Peru e para o México.

Mas será efectivamente o sucesso das negociações com as FARC que vai determinar o futuro político de Santos. Para isso, o Presidente contou com um importante apoio internacional. Nesta terça-feira, o Presidente dos EUA, Barack Obama, saudou os "esforços corajosos e arrojados" de Santos no processo de paz com a organização guerrilheira. O aplauso da Casa Branca tem um significado maior do que o da mera diplomacia, dado que, na última década, Washington injectou oito mil milhões de dólares (quase seis mil milhões de euros) no Plano Colômbia, destinado a combater os movimentos insurgentes do país, de acordo com a Foreign Affairs.

Mais de 50 anos depois, e 200 mil mortos pelo meio, a "grande noite escura", como descreveu Santos, pode estar próxima do amanhecer, mas há ainda muita madrugada pela frente e a pressão eleitoral, tal como a noite, raramente é boa conselheira.