Ai que me esqueci de entregar o Euromilhões!
A verdade é que não há motivo para alarme nem frustração: tivessem vocês entregado o boletim que ficou em casa, e já nunca mais teria saído a combinação que acabou por sair
Todos aqueles que apostam no Euromilhões (ou em sorteios similares) vivem assombrados por um fantasma: o de se esquecerem de registar uma aposta com uma certa chave e, nessa semana, qual obra do diabo, esses números saírem (o mesmo vale para o caso de não se jogar, numa semana, a combinação de sempre e, nessa semana, ela sair…). Mal soubessem disso, tinham vontade de se bater, de partir coisas ou, no mínimo, de soltar vários palavrões! Porquê? Porque é que o destino me foi pregar uma partida destas! Quanto azar é preciso ter? Se eu tivesse entregado o boletim, agora estava rico…
A verdade faz-nos mais fortes
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Todos aqueles que apostam no Euromilhões (ou em sorteios similares) vivem assombrados por um fantasma: o de se esquecerem de registar uma aposta com uma certa chave e, nessa semana, qual obra do diabo, esses números saírem (o mesmo vale para o caso de não se jogar, numa semana, a combinação de sempre e, nessa semana, ela sair…). Mal soubessem disso, tinham vontade de se bater, de partir coisas ou, no mínimo, de soltar vários palavrões! Porquê? Porque é que o destino me foi pregar uma partida destas! Quanto azar é preciso ter? Se eu tivesse entregado o boletim, agora estava rico…
A verdade, porém, é que não há motivo para alarme nem frustração: tivessem vocês entregado o boletim que ficou em casa, e já nunca mais teria saído a combinação que acabou por sair! É que neste mundo tudo está ligado, e o facto de vocês registarem ou não um boletim vai determinar um certo percurso do mundo (do espaço-tempo) que é único e irrepetível. Se registam, segue-se um percurso em que sairá uma determinada chave do Euromilhões. Se não registam, o percurso já será outro e uma chave diferente sairá (só por muita coincidência, com uma probabilidade virtualmente nula, é que uma chave se repetiria).
Em estatística, costuma-se falar em acontecimentos independentes para classificar os factos que não afectam a probabilidade de outros eventos ocorrerem. Mas isso é apenas uma questão de simplificação. É que se formos extremamente rigorosos, então, tudo está ligado a tudo e não há acontecimentos independentes. Qualquer pequena mudança que seja feita num dado acontecimento passado tem implicações no futuro, fazendo com que os acontecimentos que são muito pouco prováveis (como a saída de uma certa chave específica num determinado momento) nunca se repitam.
Aparentemente diferente é a situação dos eventos que têm grande probabilidade de ocorrência. Esses acontecem repetidamente em mundos diferentes mas, mais uma vez, nunca exactamente da mesma forma. Tomemos a hora a que chegamos ao trabalho como exemplo. Registemos ou não o Euromilhões, diríamos que a hora a que chegamos ao trabalho no dia seguinte em nada dependeu desse evento. Porém, se voltarmos a ser minuciosos, talvez percebamos que, afinal, há uma dependência: é que o tempo que gastamos a registar o Euromilhões desencadeia uma série infindável de acontecimentos que se sucedem de uma forma não exactamente igual àquela que teriam seguido se não tivéssemos gasto esses segundos a registar o boletim. Resultado: no dia seguinte, talvez cheguemos ao escritório às 9h00’30’’ e não às 9h00’01’… Ou seja, continuamos a dizer que chegamos às 9h00 e que o registo da chave nada teve a ver com esse horário de chegada. Mas, na realidade, teve! Ou seja, qualquer futuro depende do passado e, se formos muito minuciosos, constatamos não há futuros iguais com passados diferentes…
Enfim, sei bem que o que digo não parece óbvio. Mas pensem nisto e, se algum dia vos sair um Euromilhões não registado, tentem consolar-se com esta teoria.