O rosto dos neonazis na Eslováquia começa a definir-se e chama-se Marian Kotleba

Candidato do partido A Nossa Eslováquia é o novo governador da maior das oito regiões do país. A sua campanha assentou no fim do "tratamento preferencial injusto concedido a parasitas, e não apenas os ciganos".

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Kotleba é admirador de Jozef Tiso, aliado dos nazis na II Guerra Mundial AFP

Conhecido por usar uniformes nazis e por proferir declarações racistas – pelas quais já foi detido e acusado várias vezes, mas nunca condenado –, Marian Kotleba concorreu ao cargo de governador de Banská Bystrica, a maior das oito regiões eslovacas em área e a quinta em população, com quase 660 mil habitantes.

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Conhecido por usar uniformes nazis e por proferir declarações racistas – pelas quais já foi detido e acusado várias vezes, mas nunca condenado –, Marian Kotleba concorreu ao cargo de governador de Banská Bystrica, a maior das oito regiões eslovacas em área e a quinta em população, com quase 660 mil habitantes.

A principal mensagem, espalhada entre a população em pequenos comícios realizados com meios modestos, encontrou terreno fértil no descontentamento com os crescentes problemas económicos do país: "Acabar com o tratamento preferencial injusto concedido a parasitas, e não apenas os ciganos."

Antigo líder do partido neonazi Irmandade Eslovaca – entretanto ilegalizado pelo Ministério do Interior –, Marian Kotleba é um opositor feroz da NATO, que descreve como uma organização terrorista, e defende o fim de qualquer negociação ou acordo com o Fundo Monetário Internacional.

Presença constante em manifestações contra a comunidade cigana, foi proprietário de uma loja de roupa chamada KKK Anglická moda (KKK Moda Inglesa, numa referência ao Ku Klux Klan norte-americano). Em 2009, formou o partido A Nossa Eslováquia, e logo nesse ano obteve 10% nas eleições regionais para o cargo de governador.

Assume-se como profundamente cristão e admirador de Jozef Tiso, o padre católico que fundou e liderou a República Eslovaca durante a II Guerra Mundial, entre 1939 e 1945, tornado-se aliado de Adolf Hitler e responsável pelo envio de milhares de judeus para campos de concentração.

Apesar de a sua vitória ter também resultado de uma afluência às urnas muito baixa, a rondar os 17%, Marian Kotleba já olha para o futuro, que fica no Governo do país. "O partido A Nossa Eslováquia vai lutar para equilibrar os Orçamentos do Estado, através do cancelamento das missões dos soldados eslovacos no estrangeiro e da saída da organização terrorista NATO. Vamos também cortar o apoio a investidores estrangeiros, em benefício dos investidores eslovacos", disse o líder neonazi um dia antes das eleições, citado pelo The Wall Street Journal.

Já com a vitória confirmada, limitou-se a dizer à agência eslovaca SITA que o seu sucesso não constituiu nenhuma surpresa e anunciou a intenção de reduzir o número de funcionários do seu gabinete de 49 para 40, avança o semanário em língua inglesa The Slovak Spektator.

Entre a vergonha e o choque
Os media e os analistas políticos do país dividem-se entre a vergonha e o choque, tentando encontrar explicações para a vitória, por mais de 55% dos votos, de um homem que tinha sido esmagado na primeira volta pelo candidato apoiado pelo centro-direita, Vladimír Manka, deputado no Parlamento Europeu.

A vitória de Marian Kotleba em Banská Bystrica foi "uma mistura de ódio, impotência e afronta contra as elites", escreve o diário SME.

O actual primeiro-ministro, o social-democrata Roberto Fico, atirou a responsabilidade para as costas da oposição, de centro-direita, que não apoiou o candidato mais bem posicionado para derrotar o líder neonazi. Mas o presidente do Partido Democrático, do centro-direita  que liderou um governo de coligação entre 2010 e 2012  não aceitou assumir sozinho a culpa e preferiu lamentar o resultado das eleições na região de Banská Bystrica. "Temos de afirmá-lo abertamente: é uma derrota da democracia e um golpe que ninguém esperava", disse Pavol Frešo, distribuindo as responsabilidades por "todos os partidos democráticos".

A discriminação dos ciganos na Eslováquia (uma comunidade que constitui cerca de 7% da população) ao longo dos tempos e a alegada falta de combate ao discurso de ódio no país foram também apontadas como explicações. Citado pelo site do The Slovak Spektator, o analista Samuel Abrahám afirma que o principal culpado é o Governo dos sociais-democratas do Smer.

"Todas as representações políticas têm culpa, acima de todas o Smer, que não tem dito absolutamente nada sobre a questão dos roma", disse o analista político e director da Escola Internacional de Artes Liberais de Bratislava. Agora, resta esperar que a vitória dos neonazis sirva, pelo menos, para alargar o debate, afirmou. "Os votos das 70.000 pessoas que votaram em Kotleba não foram votos de protesto, foram uma resposta às palavras de um extremista que lhes agradou. Numa perspectiva cínica, diria que a Eslováquia precisava de Kotleba", comentou Samuel Abrahám, para quem o país deve agora começar a discutir a integração da comunidade cigana, o que seria "um triunfo sobre Kotleba".