Este casal “conspira” comida portuguesa em Londres

O projecto Portuguese Conspiracy já organizou em Londres três jantares, um concerto dos Dead Combo e Norberto Lobo e uma mostra do New York Film Festival

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André Bem-Haja

Rita Maia, gestora, e José Cardoso, designer, saíram de Portugal há três anos. Chegaram a Londres e não se identificaram com o retrato de Portugal que ali encontraram. Decidiram dar a conhecer uma perspectiva mais contemporânea — nasceu assim o Portuguese Conspiracy, um clube que faz da comida o abecedário da cultura. O primeiro passo foi a criação do conceito e de um contexto — o modelo do supper club pareceu-lhes a ponte ideal. É uma prática comum e com bastante adesão em Londres. 

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Rita Maia, gestora, e José Cardoso, designer, saíram de Portugal há três anos. Chegaram a Londres e não se identificaram com o retrato de Portugal que ali encontraram. Decidiram dar a conhecer uma perspectiva mais contemporânea — nasceu assim o Portuguese Conspiracy, um clube que faz da comida o abecedário da cultura. O primeiro passo foi a criação do conceito e de um contexto — o modelo do supper club pareceu-lhes a ponte ideal. É uma prática comum e com bastante adesão em Londres. 

A zona Este de Londres é o palco mais recente para as noites encenadas por José e Rita. Ela chega carregada com caixotes e mochilas atulhadas. Faltam três horas para o início do terceiro Supper Club. O preço é acessível. O menu é fixo mas nunca igual de um jantar para o outro. A divulgação é feita através das redes sociais e entre amigos — já vão no terceiro e os bilhetes esgotaram sempre. Das 40 pessoas que habitualmente comparecem, apenas 30% são portugueses. Além de jantares, José e Rita já organizaram um concerto dos Dead Combo e Norberto Lobo e uma mostra do New York Film Festival. Dia 7 de Dezembro recebem mais dois concertos: os portugueses PAUS e O Filho da Mãe. 

Mariana Saturnino tem 33 anos e deixou Coimbra porque escolheu a moda. É a primeira a chegar a Lower Clapton Road, o espaço eleito para este jantar. Antes de ser fotografada retoca o vermelho dos lábios, os olhos são expressivos. Nos "supper club" assume o papel de relações públicas, disposta a mostrar que Portugal não se resume ao bitoque nem às férias no Algarve. Conta que já viu um casal apaixonar-se num dos jantares e confessa que gostava de contrariar a cultura do pub e das festas grandes e introduzir o hábito dos jantares com “amigos de amigos” que fazia em Portugal.

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Os copos para o vinho e os flutes para o champagne são desempacotados pelo João Metelo. Tem 31 anos e aterrou em Londres por acaso, através do programa INOV. Assume-se um bom garfo e diz que faz um pouco de tudo no Portuguese Conspiracy. O Portugal que quer divulgar é aquele do qual sente saudades. Lembra-se da reacção de quatro raparigas escandinavas à carne de porco à alentejana — antes de provarem estranharam a combinação dos sabores dos coentros, da carne e das amêijoas.

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Rita faz uma pausa e senta-se. É a chef oficial destes encontros. Apesar de passar a maior parte do tempo na cozinha, faz questão de ouvir opiniões no final. A hora marcada aproxima-se e o ritmo das tarefas intensifica-se. A presença de Sara Tomé só é notada quando já se encontra ao pé do balcão. É recebida com abraços rápidos e põe mãos ao trabalho. Costuma "empratar" e fazer cocktails. A portuense elogia a multiculturalidade e a dinâmica de Londres, a única cidade onde consegue conciliar duas paixões —a dança e o ambiente. Fala com orgulho da vez em que exibiram um filme sobre a “Revolução dos Cravos”.


J. Cardoso chega e as mesas já estão postas. Há alguns olhares curiosos mas a inscrição no quadro preto, colocado na entrada, não deixa dúvidas — “Jantar Privado”. Os talheres são envolvidos em guardanapos vermelhos. Ao lado um menu em que cada prato tem direito a uma descrição que, apesar de pormenorizada, não dispensa os detalhes acrescentados pelo Filipe Falé. O lisboeta, vendedor de mobiliário, não hesita em ressalvar o poder da comunicação e defende ainda que o saudosismo não é bem-vindo.

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A açorda foi o prato mais polémico — pareceu-lhes lógico e obrigatório mas recordam que o aspecto provocou estranheza. Quando apresentaram o arroz de polvo houve quem recusasse – “uma amiga minha inglesa pediu-me desculpa quando me disse que não conseguia provar porque tinha medo”, conta Rita entre risos. A sericaia com mel e ameixas foi a sobremesa mais aplaudida e uma das experiências mais engraçadas — os convidados (até) comeram os caroços.


J. Cardoso fala constantemente na mudança trazida pela emigração de profissionais criativos, traduzida em diferentes formas de estar e mais-valias. Acredita que a cultura portuguesa pode conquistar um espaço importante em Londres, se houver persistência e continuidade nas iniciativas. Confessa que não tem planos para a Portuguese Conspiracy e que a estratégia é simples — pegar no passo anterior e melhorá-lo. Diz com certeza que o ar indignado quando alguém não sabe apontar Portugal no mapa devia desaparecer. Torna-nos pretensiosos pensar que somos uma excepção.


As entradas já estão dispostas numa bancada. As luzes menos intensas. O João, a Mariana e a Sara são os primeiros a entrar em cena. Chegam os convidados e Filipe aproxima-se com copos de vinho. Os casacos são pendurados e o casal ocupa dois dos lugares vazios. Rita espreita da cozinha como uma mãe que não perde os filhos de vista. A conspiração mais portuguesa de Londres volta a entrar em cena e promete não sair tão cedo.