O que dizem estas catacumbas sobre mulheres-padres?
Tecnologia laser relança debate a partir dos frescos de uma cemitério subterrâneo em Roma.
Relacionar este tema com o cemitério romano redescoberto no século XVI, escavado 300 anos depois e que acaba de reabrir depois de cinco anos de trabalhos de restauro não é novo, mas agita sempre as águas. De um lado as associações que querem ver as mulheres a desempenhar funções de sacerdotes na igreja católica, do outro, como seria de esperar, o Vaticano e os seus arqueólogos a dizer que as alegações não passam de “contos de fadas”.
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Relacionar este tema com o cemitério romano redescoberto no século XVI, escavado 300 anos depois e que acaba de reabrir depois de cinco anos de trabalhos de restauro não é novo, mas agita sempre as águas. De um lado as associações que querem ver as mulheres a desempenhar funções de sacerdotes na igreja católica, do outro, como seria de esperar, o Vaticano e os seus arqueólogos a dizer que as alegações não passam de “contos de fadas”.
Segundo a agência Reuters, o debate reacendeu-se agora porque os trabalhos de conservação no labirinto subterrâneo com 13 quilómetros dedicaram especial atenção às pinturas murais, que foram cuidadosamente limpas com recurso a tecnologia laser, revelando com maior nitidez pormenores que podem sustentar a tese de que as primeiras comunidades cristãs tinham mulheres-padres. É pelo menos nisto que acreditam as organizações Women’s Ordination Conference (norte-americana) e a Association of Roman Catholic Womenpriests (internacional), que vão buscar dois exemplares de frescos para ilustrar as suas teorias.
Um deles está num quarto conhecido como “Cubiculum da Mulher do Véu” e mostra uma figura feminina de braços erguidos, à semelhança de um padre que celebra missa. Diz a página oficial deste sítio arqueológico que as vestes que usa são litúrgicas e que até tem uma estola, faixa de tecido que faz parte dos paramentos usados pelos sacerdotes. Noutro espaço, “A Capela Grega”, está representado um grupo de mulheres sentado a uma mesa, evidenciando gestos reconhecíveis por quem assiste hoje a uma missa.
Interpretações "sensacionalistas"
Para Fabrizio Bisconti, o superintendente dos sítios arqueológicos religiosos propriedade do Vaticano, estas interpretações são absolutamente “sensacionalistas” e estão longe de serem fiáveis. À leitura dos grupos pró-ordenação de mulheres, Bisconti opõe a sua: o primeiro fresco representa “uma pessoa que morreu e foi para o paraíso” e as mulheres sentadas à mesa estão a participar no “banquete de um funeral” e não numa cerimónia litúrgica.
Os trabalhos de valorização destas catacumbas que têm ainda visíveis algumas ossadas e a que se acede através de um convento beneditino na Via Salaria, em Roma, passaram também pela criação de um pequeno museu destinado às lápides e aos sarcófagos usados na deposição dos corpos, bem como a dezenas e dezenas de fragmentos de esculturas que foram deixados para trás pelos que saquearam este cemitério depois da sua redescoberta, no século XVI.
Para os que não podem viajar até Roma, um protocolo celebrado entre o Vaticano e a Google Maps permite fazer uma visita virtual bem detalhada, associando a antiguidade à tecnologia contemporânea. Assim, muitos mais se poderão juntar ao debate sobre as mulheres-padres do começo do cristianismo e ficar a conhecer as catacumbas romanas que são também famosas por guardarem a mais antiga representação da Virgem com o Menino, um fresco da primeira metade do século III.
Estas catacumbas, das mais importantes de Roma, têm grande parte das suas paredes cobertas de frescos e terão sido nomeadas em homenagem a Priscila, membro de uma importante família da cidade e provavelmente a mulher de Acilius, cônsul que se coverteu ao cristianismo e foi por isso executado (forçado a lutar na arena com um leão) a mando do imperador Domiciano.