O decote indecoroso

Títulos como “Débora quer fazer tatuagem no sexo”, “João experimentou sexo oral aos dez anos” ou “Jovens embebedam-se com álcool nos olhos, ânus e vagina” são apenas três exemplos de jornalismo sem-abrigo

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A apresentadora Gozde Kansu desceu as escadas de forma glamorosa e entrou em grande estilo no epicentro do estúdio, exibindo um decote generoso e um sorriso ainda mais triunfante. O programa era o “Veliaht”, o canal de televisão é turco e chama-se ATV. O porta-voz do Partido Justiça e Desenvolvimento, Hüseyin Çelik, classificou como “exagerado” e “inaceitável” o dito decote e a senhora acabou porta fora para a fila do centro de emprego mais próximo.

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Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

A apresentadora Gozde Kansu desceu as escadas de forma glamorosa e entrou em grande estilo no epicentro do estúdio, exibindo um decote generoso e um sorriso ainda mais triunfante. O programa era o “Veliaht”, o canal de televisão é turco e chama-se ATV. O porta-voz do Partido Justiça e Desenvolvimento, Hüseyin Çelik, classificou como “exagerado” e “inaceitável” o dito decote e a senhora acabou porta fora para a fila do centro de emprego mais próximo.

Ora, se por cá não conheço a existência de episódio semelhante, há outro tipo de decotes indecorosos, os decotes mentais. Títulos como “Débora quer fazer tatuagem no sexo”, “João experimentou sexo oral aos dez anos” ou “Jovens embebedam-se com álcool nos olhos, ânus e vagina” são apenas três exemplos do jornalismo sem-abrigo que, não sendo motivo para despedimento com justa causa, devia originar a abertura de um inquérito pela prática de maus costumes.

Podem os ultraliberais do jornalismo argumentar que isto de notícias é como os lugares nos autocarros: cabe sempre mais um e há lugar para todos. Acontece que nestas coisas de ter a responsabilidade de informar (e já agora, ajudar a formar) vários milhares de pessoas diariamente não deve ser, na minha modesta opinião, uma espécie de albergue espanhol. Ok, são linhas editoriais e sobre isso nada contra. Até porque, nos dois primeiros casos acima citados, as informações foram dadas pelos próprios e servem de “mupi” em causa própria. E, felizmente, temos a liberdade para escolher o que consumir como noticiário.

Mas é com formas de informar como esta que depois surge o jornalismo do “dispara primeiro e pergunta depois”. E o problema é que a mancha alastra. Ou já alastrou. Em alguns meios de Comunicação Social há uma certa tentação para gritar aos olhos e aos ouvidos dos consumidores de notícias (todos nós). O que, objectivamente, provoca ruído e tolhe a capacidade de separar a boa da má informação.

O risco de não traçar linhas bem definidas no campo da informação pode ter consequências a um outro nível: o de misturar notícias com entretenimento, como são os supracitados dois casos. Alhos com bugalhos, portanto. Não raras vezes vemos os noticiários das televisões terminarem, ou abrirem, com “uma nova produção de grande qualidade que promete ser um grande sucesso e estreia já a seguir”. Tenho para mim que este ecletismo é um bocadinho exagerado. Mas isso, se calhar, sou eu que cismo nestas coisas…

Ainda assim, caro leitor, permita-me que lance daqui um desafio: sempre que vir ou ouvir um decote indecoroso, faça-se o favor de mudar de canal, de jornal ou de rádio. A sua sanidade mental vai agradecer-lhe.