2015: o futuro numa carta ao meu filho
Em 2015, haverá jovens que, depois de tanto esforço feito na formação, continuarão a ver serem-lhes fechadas as portas de acesso à vida activa
Filho,
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Filho,
Nesta altura do ano, tão propícia a recomeços, dou por mim a pensar no amanhã, a projectar o que será o nosso e, sobretudo, o teu futuro.
Desde o teu nascimento, o nosso país mudou muito (e, muitas vezes, não para melhor). Não creio que, daqui a dois anos, o desemprego – que afecta tanta, tanta gente, filho – possa ser uma coisa do passado. Estaremos já a salvo deste programa de ajustamento, é certo; mas ninguém nos garante que não estejamos reféns de medidas de austeridade tão ou mais brutais do que as que temos vivido. Em 2015, haverá ainda muitos meninos, da tua idade, que irão para a escola sem pequeno-almoço; haverá jovens que, depois de tanto esforço feito na formação, continuarão a ver serem-lhes fechadas as portas de acesso à vida activa; haverá avós que terão a seu cargo os netos, enquanto os pais desesperam de saudades por estarem longe, a lutar noutro país por aquilo que Portugal ainda não é capaz de lhes oferecer: uma vida digna e honrada.
Daqui a dois anos, terei ainda de explicar-te que a liberdade de expressão não está acessível a todos; irei continuar a demonstrar-te, com o meu exemplo, que a discriminação em razão da cor da pele, da orientação sexual, da nacionalidade (ou seja lá por que razão for) nunca é aceitável, digam o que te disserem; irei inventar histórias para que não percebas (não por enquanto) que há crianças por esse mundo fora que não vão sequer à escola e que são exploradas, que há meninos que são maltratados por aqueles que mais amam, que há meninas forçadas a casar muito antes da idade, que há homens e mulheres que continuam a ser perseguidos, atacados e até mortos de formas brutais, apenas por pensarem diferente, por serem diferentes e por não se resignarem.
Em 2015, continuarei a não deixar que te dêem armas como brinquedo, porque a guerra, existindo embora, é uma coisa má; serei igualmente preocupada em fazer-te perceber que a morte, sobretudo aquela que aparece antes do tempo, é uma inevitabilidade; manter-me-ei firme e activa na luta pelos teus e pelos meus direitos, pelo teu e pelo meu futuro, pela tua (que é a minha) vida.
Tudo isto vai continuar a acontecer, filho. Mas em 2015, também haverá Natal; também plantaremos uma árvore a 21 de Março e também brincaremos no parque no Dia da Criança. Lembrar-nos-emos do avô naquele que seria o dia dos anos dele e vestiremos roxo no dia 17 de Maio. Contar-te-ei, mais uma vez, que a 11 de Setembro de 2001 o mundo mudou, e talvez até possamos ir a Nova Iorque ver o novo World Trade Center. Veremos filmes, leremos livros, continuaremos a cantar juntos as velhas e as novas canções.
E eu, filho, em 2015 e até ao fim da minha vida, continuarei a amar-te sempre mais um bocadinho, todos os dias.
Um beijo da tua mãe.
PS. – O P3, aquele portal onde tu vês, de vez em quando, a foto da mamã, está de parabéns. E tem futuro, um bom futuro, tal como nós.