Mariana Mortágua: a nova deputada do Bloco de Esquerda é uma jovem “igual aos outros”

Aos 27 anos, Mariana Mortágua interrompeu o doutoramento em Londres e regressou a Portugal para ser deputada. Economista entusiasta e uma jovem “igual aos outros”, causou polémica ao ocupar o lugar deixado vago por Ana Drago no parlamento.

Fotogaleria

Mariana Mortágua tem 27 anos e entusiasma-se quando fala de economia. E de política. As duas estão sempre juntas: “O facto de estar na política ajudou-me muito a compreender a economia e a ver a disciplina económica de uma forma diferente”. E o contrário também é verdade.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Mariana Mortágua tem 27 anos e entusiasma-se quando fala de economia. E de política. As duas estão sempre juntas: “O facto de estar na política ajudou-me muito a compreender a economia e a ver a disciplina económica de uma forma diferente”. E o contrário também é verdade.

É conhecida por gostar de discutir a actualidade, reconhece — mas sempre foi assim, mesmo antes de ser militante do Bloco de Esquerda (BE). “A minha conversa acaba por resvalar para as discussões políticas e desde que estou mais activa no BE acabam por ser os meus amigos a espicaçarem-me.” Agora vai poder travar “um combate directo” por aquilo que acredita, enquanto deputada pelo BE à Assembleia da República.

Com Francisco Louçã, figura do partido que admira (Miguel Portas e Luís Fazenda também estão na lista, pelo “papel importantíssimo que tiveram na esquerda em Portugal”), aprende e discute, sobretudo economia. A quatro mãos já escreveram dois livros (A Dívida(dura)—Portugal na crise do Euro e Isto é um Assalto), o último dos quais editado em Fevereiro último com ilustrações de Nuno Saraiva.

“Se este governo insistir numa política de austeridade e cortes orçamentais, como já percebemos que vai insistir, podemos esperar um país muito pior”, diz. “E não só pior porque não cresce, mas porque quando cresce é mais desigual.” Por isso vê como necessário o combate ao programa: “Estamos a falar do país que queremos daqui a dez anos, do nosso plano”.

A economista de 27 anos fala sobre o afastamento da política por parte dos jovens

Uma jovem igual aos outros

Não se acha diferente dos outros jovens portugueses, até porque tem um percurso que se assemelha ao de muitos: deixou a terra onde nasceu, o Alvito, para estudar em Lisboa (no ISCTE); fez Erasmus na Eslovénia; tirou um mestrado também no ISCTE. Passou por uma empresa de consultoria e pelo parlamento, perto de Louçã. Fez investigação no departamento de finanças daquela instituição, sempre ligada ao Bloco.

Foram mais os anos em que foi trabalhadora-estudante do que estudante a tempo inteiro e continua a dividir casa, actualmente com mais quatro amigos. A única coisa que diferencia o seu retrato é a actividade política, que encara como o “papel de qualquer jovem na sociedade” enquanto participação cívica (começou aos seis anos, quando, com a irmã gémea, Joana, pediu ao presidente da Câmara Municipal do Alvito para pintar uma passadeira à frente do portão da escola primária).

“É muito difícil para um jovem hoje em dia conseguir um emprego. E quem consegue tem salários muito baixos e contratos a prazo que são renovados durante algum tempo”, considera. Ao lutar, através do Bloco, contra as políticas de precarização do trabalho — e, mais recentemente, contra o facto de o FMI querer “estender extraordinariamente o número de vezes que o uma empresa pode sistematicamente renovar um contrato precário em vez de passar as pessoas para efectivos” —, Mariana defende que luta pelos direitos dos jovens. De viverem e trabalharem no seu país, sem terem de se sentir obrigados a emigrar.

Mariana desdramatiza a polémica sobre a substituição de Ana Drago no parlamento

É que apesar de sempre ter querido estudar fora (o ano que passou em Londres foi “de muitas horas de biblioteca”), nunca ponderou deixar por completo Portugal: regressar estava sempre nos planos. Hoje em dia admite que, como muitas pessoas e “à medida que as condições se tornam mais precárias e difíceis”, começa a escolher o país para onde poderia ir, mesmo não sendo um objectivo.

De Londres para as swaps 

A partir de 3 de Setembro, Mariana integra a comissão parlamentar dedicada aos swaps e as questões económicas vão estar ainda mais próximas. Não esquece, ainda assim, outros assuntos: “a defesa dos direitos LGBT, o combate cerrado para que a lei da adopção seja aprovada no parlamento e a legalização das drogas leves”. Tudo temas que, considera, “dizem muito aos jovens e também deviam dizer ao país”.

E quando as reuniões plenárias regressarem à Assembleia da República, a 16 de Setembro, Mariana Mortágua vai ocupar o lugar deixado vago por Ana Drago enquanto deputada pelo Bloco de Esquerda, num processo pouco pacífico. Um grupo de militantes do partido questionou a escolha, apelidando-a de “nada transparente”. Para que Mariana ocupasse este lugar, nove candidatos na lista de Lisboa tiveram de renunciar.

Mariana desdramatiza a contestação. “Quem tomou a decisão da substituição foi a comissão política, com base em critérios objectivos que me pareceram coerentes”, explica, dizendo que aceitou por “achar que tinha sentido”. Não foi, contudo, uma decisão imediata, antes “reflectida”.

Estava a viver em Londres, onde fazia doutoramento em economia na School of Oriental and African Studies, com o apoio de uma bolsa de investigação, mas não tinha a vida muito decidida. “Havia a possibilidade de ter de voltar para Portugal e continuar o doutoramento a partir daqui, passando uma temporadas lá e cá, conforme o financiamento”, justifica. Escolheu voltar e agora vai conciliar o desenvolvimento da tese com o trabalho no parlamento, ainda que a primeira, sobre a crise europeia, se vá estender no tempo.