Contado ninguém acredita
Se fosse possível programar uma sessão tripla ou um mini-ciclo temático sobre os efeitos nefastos do “fama show” nos tempos que correm e consequente nivelamento por baixo do discurso mediático global, Dá e Leva seria projectado ao lado do Gangue de Hollywood de Sofia Coppola e da Viagem de Finalistas de Harmony Korine. Porque os três filmes são facetas diferentes de uma mesma fantasia aspiracional que os seus “heróis” se afadigam a tornar realidade como se tudo fosse uma enorme brincadeira e não houvesse consequências. O que complica um pouco as coisas é que, tal como o filme de Sofia Coppola, também Dá e Leva se baseia num caso verídico, só que francamente mais sério do que um roubo de dinheiro e roupas de marca. Três treinadores de um ginásio de Miami decidem dar o salto para se tornarem ricos raptando um cliente para o obrigar a transferir todo o seu dinheiro e bens para a posse deles. Só que, tal como as adolescentes ocas da Coppola, os matulões broncos do filme de Michael Bay (sim, o de Armageddon e dos Transformers) não têm cabeça para perceber o alcance do que estão a fazer.
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Se fosse possível programar uma sessão tripla ou um mini-ciclo temático sobre os efeitos nefastos do “fama show” nos tempos que correm e consequente nivelamento por baixo do discurso mediático global, Dá e Leva seria projectado ao lado do Gangue de Hollywood de Sofia Coppola e da Viagem de Finalistas de Harmony Korine. Porque os três filmes são facetas diferentes de uma mesma fantasia aspiracional que os seus “heróis” se afadigam a tornar realidade como se tudo fosse uma enorme brincadeira e não houvesse consequências. O que complica um pouco as coisas é que, tal como o filme de Sofia Coppola, também Dá e Leva se baseia num caso verídico, só que francamente mais sério do que um roubo de dinheiro e roupas de marca. Três treinadores de um ginásio de Miami decidem dar o salto para se tornarem ricos raptando um cliente para o obrigar a transferir todo o seu dinheiro e bens para a posse deles. Só que, tal como as adolescentes ocas da Coppola, os matulões broncos do filme de Michael Bay (sim, o de Armageddon e dos Transformers) não têm cabeça para perceber o alcance do que estão a fazer.
Vem-nos então à cabeça um quarto filme para o tal ciclo, uma outra personagem de treinador bronco: o Brad Pitt de Destruir Depois de Ler dos irmãos Coen, primo afastado do Mark Wahlberg deste filme (cada vez mais o mais sólido das jovens primeiras figuras de Hollywood). Inspirado pelos lugares comuns de um guru fajuto da auto-estima, Daniel/Wahlberg decide vingar-se do mundo que não reconhece o seu valor com um golpe criminoso para o qual recruta um colega cuja obsessão pelo corpo perfeito tornou impotente (Anthony Mackie) e um ex-presidiário cristão-novo com problemas de dependência (Dwayne Johnson, aliás The Rock). A vítima que escolheram, contudo, é um empresário de mau feitio incapaz de largar o osso a que se afinfa (o grande Tony Shalhoub a roubar o filme sem darmos por isso). O resultado é uma comédia negra, negríssima mesmo que passada ao sol de Miami, filmada por Bay com os requintes de histerismo visual que lhe conhecemos, rodando a voz de narração entre os três criminosos estúpidos que nem pedras, a vítima obnóxia e um detective que nem acredita bem na palermice a que assiste (Ed Harris).
Em rigor, nem nós. Mas raramente Bay terá sido tão ideal para um filme. O seu cinema puramente imagístico e fetichista, todo ele montagem e velocidade vazias, é absolutamente perfeito para ilustrar o dominó de estupidez criado por quem acredita nas promessas recicladas de êxito instantâneo e fama permanente dos gurus gananciosos ou dos concursos televisivos cínicos. Dá e Leva é um filme sobre os dias de hoje, filmado com toda a energia oca de um magazine de celebridades, onde não existe nada para lá da superfície, mas cuja superfície revela tudo o que há a saber sobre a cultura em que vivemos. E o que há a saber, pelo meio dessa superfície, não é nada bonito. Nada mesmo.