Via-sacra com Papa, milhão e meio de fiéis e centenas de manifestantes

Uma manifestação contra o governador Sérgio Cabral, incluindo mascarados, avançou entre os peregrinos, depois de o Papa Francisco discursar em Copacabana.

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Copacabana voltou a encher-se de peregrinos que queriam ver e ouvir o Papa Francisco Stefano Rellandini/Reuters

Centenas de manifestantes avançam a caminho do palco, onde agora há um espectáculo musical. Muitos têm a cara tapada, com máscara, lenço ou capuz, e trazem cartazes e faixas contra Sérgio Cabral, o governador do Rio de Janeiro, responsável pela Polícia Militar (PM): “Fim da PM já!” ou “Ditadura nunca mais”. Furam entre os peregrinos e os soldados da Força Nacional. E atrás vem a tropa de reforço: uma massa com centenas de agentes da PM a desaguar na Av. Atlântica, vindos da Av. Prado Júnior.


É um pico de tensão. Um fluxo de peregrinos começa a escoar pela Prado Júnior, em sentido contrário aos PM. Vários mostram-se perplexos com aquela presença policial maciça, não se aperceberam sequer da entrada dos manifestantes, estão a sair porque o Papa já se foi embora. Outros saem a correr, grupos de mão dada em cordão.


A manifestação concentrou-se no Leblon, junto à casa de Sérgio Cabral, um ponto permanente de protestos nas últimas semanas, e foi juntando gente. Entre os mais jovens de cara descoberta, Lívio, 16 anos, e Gabriela, 15, um par de cariocas mais para fã de zapatistas que de praia. A comparação não é por acaso: “Você conhece os zapatistas?”, pergunta Lívio, para justificar o uso de máscaras nos protestos “como protecção”.


É estudante ainda do secundário, filho de uma professora de Italiano e de um violinista do Theatro Municipal, morador do Bairro de Santa Teresa, barbinha precoce: “Estamos na luta. A gente só está a sair agora por causa da multidão [de peregrinos]. Medo todo o mundo tem, mas quando a gente está organizado e junto não tem polícia que faça medo.”


Mesmo tão novo, Lívio não se estreou agora nos movimentos políticos. Não está em nenhum partido, cita o blogue http:
/organizacaopopular.wordpress.com/
. Pergunta: “Você viu os polícias? Tinha mais polícia que manifestante.” Uma mulher ao lado conta que há contestatários com um projector, projectando frases como: “Peregrino, sabe que o Rio está vivendo uma ditadura?”

Caminhamos pelas ruas internas de Cocabapana, agora tomadas por dezenas de milhares de peregrinos. Na Praça Cardeal Arco Verde nem se consegue ver a entrada do metro. É uma massa de gente, bandeiras de todo o mundo, mochilas. Mas com um aparato policial maior que na véspera: autocarros e carros estacionados. Perto das nove da noite, centenas de polícias começam a vir da praia. Não houve confronto.

E por toda a parte há peregrinos a comer, a cantar, a aclamar o Papa. Difícil incomodá-los.

Ontem, o Ministério do Turismo informou que o fluxo de visitantes no Rio de Janeiro para a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) é o maior da história do Brasil. Sobretudo os peregrinos, cerca de 350 mil inscritos, têm enfrentado caminhadas de horas e filas enormes para voltar para casa.

Antes do discurso do Papa que concluiu a via-sacra, a repórter foi falando com vários peregrinos da JMJ sobre essa outra via-sacra: transportes, comida, casas de banho, informação. Começando pelo acesso a Copacabana, que só se faz a pé, ou com bilhetes especiais de metro. Um dos acessos a pé é pelo túnel que vem de Botafogo e desemboca na Avenida Princesa Isabel. Então centenas vêm caminhando pelo túnel alegremente, cantando, dançando, e, quando desembocam na avenida, nem a podem fazer a pé, porque lá ao fundo está o palco e tudo foi fechada com grades. Mas logo uma fila de voluntários de mão dada os reorienta tão animadamente que, por exemplo, Maria Etelvina e companheiras cantam a informação: “Quarta rua à esquerda! Quarta rua à esquerda!”

Se algum peregrino vinha aborrecido, passa-lhe logo. Para estar ali, Maria Etelvina vem lá da periferia, da Zona Norte, e nem vê o Papa, fica ali de costas, a ajudar peregrinos. “Papai do Céu vai nos dar em dobro, e não é preciso estar vendo o Papa, porque mesmo assim de costas Deus está nos abençoando.”

Etelvina, como vários peregrinos estrangeiros com quem a repórter falou a seguir, desenvolveu uma estratégia para voltar a casa: esperar na praia até o fluxo abrandar.

E desde chilenos a venezuelanos, de colombianos a jamaicanos, de angolanos a polacos, a repórter não encontrou um estrangeiro com críticas à organização. Todos dizem que com tanta gente é normal demorar horas para voltar, que estavam preparados para isso, que os tickets de comida de 30 reais por dia são suficientes, que a comida é óptima. Um jovem polaco disse mesmo que o Rio era a melhor Jornada das que viu: Madrid e Sydney.

Quem meteu o pau, como dizem os brasileiros, era brasileiro: um grupo de paulistas de Marília. “Um caos!”, dizia um. “Uma bagunça!”, dizia outro. Estavam a dormir em Campo Grande, na Zona Oeste, o que seria sempre longe de tudo, mas mesmo assim melhor para chegar a Guaratiba, onde inicialmente a vigília e missa de encerramento iriam acontecer, agora transferidas para Copacabana.

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Centenas de manifestantes avançam a caminho do palco, onde agora há um espectáculo musical. Muitos têm a cara tapada, com máscara, lenço ou capuz, e trazem cartazes e faixas contra Sérgio Cabral, o governador do Rio de Janeiro, responsável pela Polícia Militar (PM): “Fim da PM já!” ou “Ditadura nunca mais”. Furam entre os peregrinos e os soldados da Força Nacional. E atrás vem a tropa de reforço: uma massa com centenas de agentes da PM a desaguar na Av. Atlântica, vindos da Av. Prado Júnior.


É um pico de tensão. Um fluxo de peregrinos começa a escoar pela Prado Júnior, em sentido contrário aos PM. Vários mostram-se perplexos com aquela presença policial maciça, não se aperceberam sequer da entrada dos manifestantes, estão a sair porque o Papa já se foi embora. Outros saem a correr, grupos de mão dada em cordão.


A manifestação concentrou-se no Leblon, junto à casa de Sérgio Cabral, um ponto permanente de protestos nas últimas semanas, e foi juntando gente. Entre os mais jovens de cara descoberta, Lívio, 16 anos, e Gabriela, 15, um par de cariocas mais para fã de zapatistas que de praia. A comparação não é por acaso: “Você conhece os zapatistas?”, pergunta Lívio, para justificar o uso de máscaras nos protestos “como protecção”.


É estudante ainda do secundário, filho de uma professora de Italiano e de um violinista do Theatro Municipal, morador do Bairro de Santa Teresa, barbinha precoce: “Estamos na luta. A gente só está a sair agora por causa da multidão [de peregrinos]. Medo todo o mundo tem, mas quando a gente está organizado e junto não tem polícia que faça medo.”


Mesmo tão novo, Lívio não se estreou agora nos movimentos políticos. Não está em nenhum partido, cita o blogue http:
/organizacaopopular.wordpress.com/
. Pergunta: “Você viu os polícias? Tinha mais polícia que manifestante.” Uma mulher ao lado conta que há contestatários com um projector, projectando frases como: “Peregrino, sabe que o Rio está vivendo uma ditadura?”

Caminhamos pelas ruas internas de Cocabapana, agora tomadas por dezenas de milhares de peregrinos. Na Praça Cardeal Arco Verde nem se consegue ver a entrada do metro. É uma massa de gente, bandeiras de todo o mundo, mochilas. Mas com um aparato policial maior que na véspera: autocarros e carros estacionados. Perto das nove da noite, centenas de polícias começam a vir da praia. Não houve confronto.

E por toda a parte há peregrinos a comer, a cantar, a aclamar o Papa. Difícil incomodá-los.

Ontem, o Ministério do Turismo informou que o fluxo de visitantes no Rio de Janeiro para a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) é o maior da história do Brasil. Sobretudo os peregrinos, cerca de 350 mil inscritos, têm enfrentado caminhadas de horas e filas enormes para voltar para casa.

Antes do discurso do Papa que concluiu a via-sacra, a repórter foi falando com vários peregrinos da JMJ sobre essa outra via-sacra: transportes, comida, casas de banho, informação. Começando pelo acesso a Copacabana, que só se faz a pé, ou com bilhetes especiais de metro. Um dos acessos a pé é pelo túnel que vem de Botafogo e desemboca na Avenida Princesa Isabel. Então centenas vêm caminhando pelo túnel alegremente, cantando, dançando, e, quando desembocam na avenida, nem a podem fazer a pé, porque lá ao fundo está o palco e tudo foi fechada com grades. Mas logo uma fila de voluntários de mão dada os reorienta tão animadamente que, por exemplo, Maria Etelvina e companheiras cantam a informação: “Quarta rua à esquerda! Quarta rua à esquerda!”

Se algum peregrino vinha aborrecido, passa-lhe logo. Para estar ali, Maria Etelvina vem lá da periferia, da Zona Norte, e nem vê o Papa, fica ali de costas, a ajudar peregrinos. “Papai do Céu vai nos dar em dobro, e não é preciso estar vendo o Papa, porque mesmo assim de costas Deus está nos abençoando.”

Etelvina, como vários peregrinos estrangeiros com quem a repórter falou a seguir, desenvolveu uma estratégia para voltar a casa: esperar na praia até o fluxo abrandar.

E desde chilenos a venezuelanos, de colombianos a jamaicanos, de angolanos a polacos, a repórter não encontrou um estrangeiro com críticas à organização. Todos dizem que com tanta gente é normal demorar horas para voltar, que estavam preparados para isso, que os tickets de comida de 30 reais por dia são suficientes, que a comida é óptima. Um jovem polaco disse mesmo que o Rio era a melhor Jornada das que viu: Madrid e Sydney.

Quem meteu o pau, como dizem os brasileiros, era brasileiro: um grupo de paulistas de Marília. “Um caos!”, dizia um. “Uma bagunça!”, dizia outro. Estavam a dormir em Campo Grande, na Zona Oeste, o que seria sempre longe de tudo, mas mesmo assim melhor para chegar a Guaratiba, onde inicialmente a vigília e missa de encerramento iriam acontecer, agora transferidas para Copacabana.