Tribunal trava fecho da Maternidade Alfredo da Costa
Sentença obriga Ministério da Saúde a manter maternidade aberta e a repor serviços entretanto transferidos para a Estefânia.
A acção popular foi apresentada por três dezenas de cidadãos, entre responsáveis da MAC, o antigo ministro da Saúde António Correia de Campos e o bastonário da Ordem dos Médicos, José Manuel Silva, todos representados no processo pelo advogado Ricardo Sá Fernandes.
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A acção popular foi apresentada por três dezenas de cidadãos, entre responsáveis da MAC, o antigo ministro da Saúde António Correia de Campos e o bastonário da Ordem dos Médicos, José Manuel Silva, todos representados no processo pelo advogado Ricardo Sá Fernandes.
"São boas notícias", disse o advogado ao PÚBLICO, confirmando que com esta decisão "não podem fechar a MAC". "Não a podem fechar pelo menos até que se criem condições que repitam o que ali existe. Não estamos agarrados ao edifício", adiantou.
A decisão judicial surge numa altura em que parte dos serviços da maternidade estavam já a ser transferidos para o Hospital Dona Estefânia, também em Lisboa, dando seguimento ao plano de transferência delineado pelo Centro Hospitalar de Lisboa Central (CHLC), a que a MAC pertence.
Porém, na sentença hoje conhecida o tribunal ordena a manutenção de todos os serviços existentes na MAC (nomeadamente número de camas e blocos operatórios) e proíbe o funcionamento dos serviços (quatro blocos operatórios e unidade de cuidados intensivos neonatal) entretanto deslocados para a Estefânia. O tribunal determina ainda a "reposição imediata de funcionamento de todos os serviços — sem qualquer excepção — da MAC, mediante realização de todas as operações necessárias, para o que se fixa um prazo de 15 dias, cujo incumprimento deve ficar sujeito a aplicação de sanção compulsória".
Ministério da Saúde recorre
Em comunicado, o Ministério da Saúde (MS) já reagiu à decisão proferida pelo Tribunal Administrativo de Lisboa, referindo que "o MS e o CHLC respeitam e acatam a sentença nos precisos termos em que foi proferida, nomeadamente os actos sugeridos pela mesma, apesar de não concordarem com os seus fundamentos".
"Sendo a decisão susceptível de recurso, o MS e o CHLC irão recorrer da mesma para o Tribunal Central Administrativo do Sul, demonstrando que a decisão de encerramento das actuais instalações da Maternidade Alfredo da Costa foi ponderada e devidamente fundamentada do ponto de vista técnico, clínico, humano e também financeiro, perante a necessidade de garantir a melhor gestão dos recursos disponíveis e a sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde, em particular na área da Grande Lisboa e nos cuidados materno-infantis", refere ainda a nota de imprensa divulgada esta tarde pela tutela.
Em declarações ao PÚBLICO, Correia de Campos considerou que “o tribunal acabou por fazer aquilo que o poder executivo devia ter feito, que era simplesmente um prudente julgamento nesta matéria”. Insistindo que o encerramento da MAC só poderia ser desencadeado quando fosse possível integrar esta unidade no futuro Hospital de Todos-os-Santos, a construir na zona oriental de Lisboa, o antigo ministro da Saúde volta a criticar o “desmantelamento da maternidade, distribuindo-a por vários sítios dispersos e por salas mal compostas e sem o brilho que merece”.
“Encerrei cerca de dezena e meia de maternidades por razões de falta de qualidade e são essas mesmas razões que me levam a defender a manutenção da MAC”, disse ainda, lamentando que o Ministério da Saúde se tenha “metido nesta aventura que só o desprestigia”.
“Se estou satisfeito com a decisão, estou também triste por ver o ministério que já representei embrulhado numa querela mesquinha, numa birra, num braço-de-ferro personalizado, numa disputa de carácter pessoal. É ridículo. O tribunal repôs o bom senso”, acrescentou.
Sobre o facto de o tribunal exigir a reposição do funcionamento de todos os serviços da MAC no prazo de 15 dias, Correia de Campos considera que esta medida poderá querer salvaguardar um eventual aproveitamento do Governo que, perante decisões já tomadas sobre o processo, poderia “aproveitar um qualquer subterfúgio político e tentar uma política de facto consumado”.
Também o bastonário da Ordem dos Médicos se congratulou com a decisão agora conhecida e defendeu, em declarações à agência Lusa, que travar o fecho da maior maternidade do país é uma oportunidade para uma “reflexão mais aprofundada” sobre a instituição.
“Uma decisão sobre uma instituição, que é um ícone do Serviço Nacional de Saúde […], deve ser uma decisão baseada em estudos públicos e devidamente escrutinados, não pode resultar de uma decisão tomada apenas nos gabinetes”, declarou José Manuel Silva,
Já o médico e coordenador do Bloco de Esquerda, João Semedo, referiu que a decisão judicial traz "alguma luz e alguma lucidez" a um processo muito contestado desde o início e que motivou diversas manifestações populares contra o fecho da maternidade.
"Acabo de conhecer uma boa notícia para o país, uma má notícia para o Governo, a justiça acabou de impedir o encerramento da MAC", afirmou o líder bloquista durante o debate da moção de censura ao Governo que decorre esta tarde no Parlamento.
Notícia actualizada às 18h40: acrescenta reacções de António Correia de Campos, José Manuel Silva e João Semedo