Detroit declara bancarrota

O berço da indústria automóvel norte-americana é a maior cidade dos EUA a cair na falência.

Fotogaleria

As edições online dos principais jornais norte-americanos avançaram com a notícia quando era quinta-feira à noite na Europa: uns citando despachos de agência, outros com peça própria, dão conta de um desfecho que se adivinhava e que acabou por se concretizar.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

As edições online dos principais jornais norte-americanos avançaram com a notícia quando era quinta-feira à noite na Europa: uns citando despachos de agência, outros com peça própria, dão conta de um desfecho que se adivinhava e que acabou por se concretizar.

A cidade que é considerada o berço da indústria automóvel norte-americana, e que foi fundada há mais de 300 anos, não consegue sair do poço de dívidas em que tem vindo a afundar-se e, por isso, pediu protecção judicial ao abrigo do capítulo 9 do código de falências, que só se aplica às entidades municipais. Este artigo não prevê a liquidação da entidade que declara falência – como no caso de uma empresa –, mas antes uma reorganização do município. Um processo que foi usado 60 vezes nos EUA, desde a década de 1950, mas agora está em causa a maior falência municipal.

Em 2009, a Administração Obama ajudou financeiramente a salvar dois dos grandes nomes da indústria automóvel de Detroit, a General Motors e a Chrysler. Mas desta vez, a Casa Branca não pôs dinheiro à disposição do município para tentar inverter uma situação financeira cuja gravidade fica patente no défice orçamental anual de 100 milhões de dólares.

O principal jornal local, The Detroit News, relatava há uma semana a resposta da Casa Branca a perguntas de jornalistas sobre a situação difícil de Detroit. Durante uma conferência de imprensa em Washington, um porta-voz da Administração Obama, Jay Carney, declarou que o Presidente "estava a par da situação de Detroit", e que responsáveis federais e locais continuavam "em contacto", mas frisou que desconhecia "qualquer plano ou proposta que o Presidente tenha". "Mas estamos cientes da situação", frisou.

O valor da dívida, adianta por seu lado o New York Times, não é consensual, variando as estimativas "entre os 18 biliões e os 20 biliões de dólares". Isto dá entre 13.700 milhões a 15.200 milhões de euros, segundo a actual taxa de câmbio. A Reuters cita estimativas de 18.500 milhões de dólares.

De acordo com o jornal de maior expansão, o USA Today, o pedido de protecção formulado nesta quinta-feira dá início a um período de 30 a 90 dias, durante o qual será avaliado se o caso Detroit pode ou não enquadrar-se no referido capítulo 9. Em caso afirmativo, será feita uma selecção dos credores que poderão vir a reaver as dívidas, face aos recursos limitados que a cidade tem para oferecer, explica o mesmo jornal.

O mayor Dave Bing (do Partido Democrata) tem tentado inverter a situação, ao captar investimento privado para a baixa da cidade. Porém, os resultados e proveitos daí decorrentes são uma gota no oceano das dívidas municipais.

Para a cidade, frisam dois jornalistas do NYT, este desfecho, é uma "recordação dolorosa da ascensão e queda da cidade". Na década de 1950, Detroit registava 1,8 milhões de habitantes. Actualmente está reduzida a 700 mil moradores, dezenas de milhares de edifícios vazios e abandonados (78 mil segundo a Reuters) e ruas sem iluminação. "Foi uma decisão difícil e dolorosa, mas acredito que não outra saída viável", argumentou  o governador do Michigan, Rick Snyder (conservador do Partido Republicano), numa carta remetida ao tribunal.

Segundo a Reuters, nessa carta que acompanha o pedido de protecção judicial, o governador declara que aprovou um pedido do gestor externo nomeado para negociar uma saída, Kevyn Orr, que foi quem solicitou o início do processo judicial de protecção contra credores. "A cidade não dispõe de receitas suficientes para assegurar as suas obrigações, e a situação só irá piorar se não for tomada esta medida", escreveu Snyder.

Mesmo que o processo de falência possa ser, a longo prazo, transformado num novo início para Detroit, espera-se que o impacto a curto prazo seja mais desemprego, e mais dificuldades. Além disso, fica também, o estigma. Ao responsável pelas finanças do Michigan, Snyder escreveu ainda que imagina que muitos dirão que a cidade "bateu no fundo". Porém, acredita que será uma hipótese de um recomeço, sem o peso da dívida que não consegue pagar".

Nas últimas semanas, à medida que se adensava o risco de bancarrota, o município tentava negociar com credores e, ao mesmo tempo, com sindicatos de trabalhadores, na esperança de conseguir dilatar prazos de pagamento aos empresários e cortar nos benefícios aos trabalhadores.

Em Junho, há cerca de um mês, Orr apresentou um plano que deixaria muitos credores com muito menos para receber (dez cêntimos por cada dólar em dívida), avisando que recorreria sem hesitação à declaração de bancarrota caso as negociações se embrulhassem num impasse. Recentemente, dizem diferentes jornais americanos, o município falhou o pagamento de 40 milhões de dólares devidos ao fundo de pensões da cidade.

Segundo o gabinete de estatísticas norte-americano, o US Census Bureau, Detroit tinha, em 2010, 10% de população branca, muito longe dos 78,9% de brancos no Michigan. Nesse ano, a maioria da população era negra (78,9%), contrariando a tendência do estado, onde apenas 14,2% da população era afro-americana.

O Michigan, situado na região dos Grandes Lagos, fazendo fronteira com o Canadá, tem dado a vitória aos Democratas nas presidenciais desde 1992. É o nono mais populoso do país e o 11.º em área.