Portugueses estão a adiar o nascimento do primeiro filho por causa da crise

Na década de 1990 verificou-se o adiamento do segundo filho.

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Portugueses adiam o nascimento dos filhos Adriano Miranda

A sociedade portuguesa caracterizava-se por dois traços "interessantes" pois "não tinha um adiamento tão grande do primeiro [filho] mas tinha um adiamento mais intenso do segundo, o que faz com que tivéssemos a visibilidade do filho único já desde os anos 1990", explica Vanessa Cunha. Esta é uma primeira constatação do projecto "A intenção de ter crianças e o adiamento em tempos de incerteza", a decorrer até 2014 e que vai ajudar a compreender o "duplo adiamento".

Vanessa Cunha, a investigadora responsável pelo estudo realizado em parceria com o centro de investigação da Universidade de Évora, refere que Portugal "é dos países da Europa com incidência mais elevada de filhos únicos".

"O padrão ligeiramente mais precoce em relação ao resto da Europa do Sul [era explicado] muito provavelmente" pelos níveis de escolaridade "muito mais baixos e pela inserção mais precoce no mercado de trabalho", mas também pelo início mais cedo da vida em casal, explica Vanessa Cunha.

Deixar a decisão de ser mãe e pai para mais tarde resulta de um conjunto de razões, mas, para a especialista, "a insegurança financeira é a questão central em jogo", relacionando-se com a precariedade económica e as dificuldades ligadas ao custo de educação dos filhos.

A investigadora do ICS referiu que os períodos recessivos, com problemas no mercado de trabalho e desemprego, "são desfavoráveis à natalidade", no entanto, nos países em que "a almofada" dos apoios sociais não desaparece, "em que as pessoas sabem que podem ficar desempregadas, mas existem outras formas de compensação do rendimento, levam a sua vida para a frente".

Quando estas almofadas, ainda que pequenas, começam a ser retiradas "as pessoas sentem uma insegurança enorme", realça.

É grande o número de requisitos actualmente considerados fundamentais para ter um filho, além da vertente económica, incluindo também alguma segurança no trabalho ou nas próprias relações conjugais.

A conjugação da vida profissional e familiar e a perda de alguma independência são outros factores ponderados na decisão.

Muitas vezes, o adiamento acaba por ser definitivo, pois com o avançar da idade, os portugueses podem não conseguir concretizar o sonho de ter filhos, ao deparar-se com a infertilidade.

Relativamente à insegurança laboral, Vanessa Cunha referiu-se ao facto de os portugueses terem direito a determinados benefícios que depois podem desaparecer.

"Na minha perspectiva é uma mensagem política muito negativa aquela de que o Estado não pode apoiar as pessoas que querem ter filhos", com abonos ou licenças de parentalidade, se sozinhas não conseguem ter as condições necessárias, salienta a investigadora. O que se passa nesta situação é que "se cria uma profunda desigualdade no acesso à parentalidade e passa a ter filhos quem pode e não quem quer", critica.
 

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A sociedade portuguesa caracterizava-se por dois traços "interessantes" pois "não tinha um adiamento tão grande do primeiro [filho] mas tinha um adiamento mais intenso do segundo, o que faz com que tivéssemos a visibilidade do filho único já desde os anos 1990", explica Vanessa Cunha. Esta é uma primeira constatação do projecto "A intenção de ter crianças e o adiamento em tempos de incerteza", a decorrer até 2014 e que vai ajudar a compreender o "duplo adiamento".

Vanessa Cunha, a investigadora responsável pelo estudo realizado em parceria com o centro de investigação da Universidade de Évora, refere que Portugal "é dos países da Europa com incidência mais elevada de filhos únicos".

"O padrão ligeiramente mais precoce em relação ao resto da Europa do Sul [era explicado] muito provavelmente" pelos níveis de escolaridade "muito mais baixos e pela inserção mais precoce no mercado de trabalho", mas também pelo início mais cedo da vida em casal, explica Vanessa Cunha.

Deixar a decisão de ser mãe e pai para mais tarde resulta de um conjunto de razões, mas, para a especialista, "a insegurança financeira é a questão central em jogo", relacionando-se com a precariedade económica e as dificuldades ligadas ao custo de educação dos filhos.

A investigadora do ICS referiu que os períodos recessivos, com problemas no mercado de trabalho e desemprego, "são desfavoráveis à natalidade", no entanto, nos países em que "a almofada" dos apoios sociais não desaparece, "em que as pessoas sabem que podem ficar desempregadas, mas existem outras formas de compensação do rendimento, levam a sua vida para a frente".

Quando estas almofadas, ainda que pequenas, começam a ser retiradas "as pessoas sentem uma insegurança enorme", realça.

É grande o número de requisitos actualmente considerados fundamentais para ter um filho, além da vertente económica, incluindo também alguma segurança no trabalho ou nas próprias relações conjugais.

A conjugação da vida profissional e familiar e a perda de alguma independência são outros factores ponderados na decisão.

Muitas vezes, o adiamento acaba por ser definitivo, pois com o avançar da idade, os portugueses podem não conseguir concretizar o sonho de ter filhos, ao deparar-se com a infertilidade.

Relativamente à insegurança laboral, Vanessa Cunha referiu-se ao facto de os portugueses terem direito a determinados benefícios que depois podem desaparecer.

"Na minha perspectiva é uma mensagem política muito negativa aquela de que o Estado não pode apoiar as pessoas que querem ter filhos", com abonos ou licenças de parentalidade, se sozinhas não conseguem ter as condições necessárias, salienta a investigadora. O que se passa nesta situação é que "se cria uma profunda desigualdade no acesso à parentalidade e passa a ter filhos quem pode e não quem quer", critica.