Graffiters ameaçam responder à destruição de pintura de Hazul
Decisão da Câmara do Porto de cobrir com tinta amarela imagem do artista Hazul foi a gota de água para os "writers" da cidade. Página de Rui Rio na Wikipédia foi alvo de alterações sarcásticas
A contenda entre o presidente da Câmara do Porto, Rui Rio, e os "graffiters" está ao rubro. A cobertura, por sinal com tinta amarela, de um graffiti do artista Hazul Luzah, na terça-feira, pelos serviços camarários, representou uma escalada no conflito com os artistas de rua da cidade, que se mostram indignados. Estes autodenominados "writers" já falam em “guerra” para responder à ofensiva das “brigadas anti-graffiti” criadas pela autarquia. “Se querem guerra, é guerra que vão ter”, avisa Mesk, nome artístico de Gustavo, um "writer" licenciado em Artes Digitais e Multimédia.
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A contenda entre o presidente da Câmara do Porto, Rui Rio, e os "graffiters" está ao rubro. A cobertura, por sinal com tinta amarela, de um graffiti do artista Hazul Luzah, na terça-feira, pelos serviços camarários, representou uma escalada no conflito com os artistas de rua da cidade, que se mostram indignados. Estes autodenominados "writers" já falam em “guerra” para responder à ofensiva das “brigadas anti-graffiti” criadas pela autarquia. “Se querem guerra, é guerra que vão ter”, avisa Mesk, nome artístico de Gustavo, um "writer" licenciado em Artes Digitais e Multimédia.
O trabalho do portuense Hazul Luzah, conceituado artista de rua, decorava a Rua Sá de Noronha há cerca de três anos e era um dos muitos que estão espalhados pela Baixa do Porto. Mas Hazul nem é dos mais revoltados com a intervenção da brigada camarária. Encara a ocultação da sua pintura “com normalidade”, por estar em causa arte efémera, mas defende que até a destruição deste tipo de trabalhos não deve ser feita “às cegas”, mas antes ponderada.
As brigadas limpam a eito as paredes das zonas que seleccionam. Removem cartazes e pintam por cima, sem qualquer juízo crítico sobre o valor do que arrancam ou ocultam. Com 28 anos, Mesk “grafita” há mais de dez e apela para que “não se metam as pinturas todas no mesmo saco”. Garante que, “se tivesse um Banksy [artista de rua britânico cujas inscrições chegam a custar 500 mil euros], apagavam na mesma”. Para evitar este tipo de situações, Hazul sugere que, antes da limpeza, se analise “se existe ali alguma obra interessante”.
Graffiti: “uma autêntica praga”?
O combate “sem tréguas” que a Câmara do Porto declarou aos "graffiti" visa tornar a cidade mais limpa e acolhedora, alega a autarquia, que considera este tipo de manifestações “uma autêntica praga”, destruidora da paisagem urbana. O projecto das brigadas anti-graffiti custou cerca de 150 mil euros e, desde Novembro, já interveio em cerca de 20 ruas.
Para Hazul, a câmara deveria optar por outra solução, bem mais simples e barata: permitir que se pintassem os tijolos que emparedam as casas devolutas ou disponibilizar paredes para o efeito. “Qualquer destas opções não necessita de dinheiro, só de vontade”, remata. O "writer" reivindica ainda o apoio do município para aqueles que querem “embelezar o espaço público”, garantindo que “muitas paredes na cidade ficariam enriquecidas se fossem pintadas por um artista”.
André Carvalho, estudante de 24 anos que organiza eventos ligados à arte urbana no Porto, comenta que esta cidade se distingue, a nível nacional e internacional, pela intolerância em relação a estas expressões artísticas. Destaca a política da Câmara de Lisboa e afirma que a capital até já é internacionalmente reconhecida por algumas obras de arte urbana. Apesar da guerra aos graffitis selvagens que também foi declarada este ano pelo vereador do Espaço Público de Lisboa, José Sá Fernandes, a capital tem uma galeria especializada neste tipo de arte — a GAU (Galeria Arte Urbana) — que até resulta de uma parceria com a autarquia. Além de promover workshops, a GAU disponibiliza algumas paredes da cidade para artistas de vários países as usarem como tela.
André e Mesk consideram inaceitável que artistas portugueses reconhecidos além fronteiras não tenham onde criar legalmente no Porto, referindo os casos de Mr. Dheo, Hazul Luzah ou Vhils. Durante uma das operações das brigadas anti-graffiti, a adjunta do vereador do Ambiente, Joana Soares, disse ao PÚBLICO que, se chegasse à autarquia “algum projecto para grafitar”, os serviços não deixariam de lhe dar resposta.
Por sua vez, André e Mesk contam que já chegaram a marcar uma reunião com elementos da Câmara do Porto para discutir propostas concretas, e que, até hoje, ficaram à espera.
As acções anti-graffiti da câmara têm causado algum alvoroço na blogosfera. Depois de terem circulado várias fotos da pintura de Hazul Luzah a ser coberta, não demoraram a surgir comentários negativos sobre a posição do autarca no Facebook. “Telas novas, limpinhas!”, graceja alguém, numa ameaça velada, sobre as paredes homogeneizadas pela câmara.
Na terça-feira o próprio Hazul reagiu à situação na sua página no Facebbook. Legendou a fotografia da cobertura da sua pintura de Sá de Noronha com um lacónico “amarelo Rui Rio”, a cor da tinta que se sobrepôs à sua obra. Seguiu-se um coro de protestos nas redes sociais e ontem alguém acrescentou esta frase à biografia de Rui Rio na Wikipédia: “Recentemente, foi declarado o maior filisteu da cidade do Porto, depois de ordenar a limpeza de algumas das melhores obras de arte de rua da cidade e país”. A biografia também refere que o autarca “foi director financeiro da fábrica de tintas CIN”, mas isso não é um comentário irónico: é um facto.
Artigo actualizado às 14h55.
A idade Mesk foi corrigida