Abrir o circuito fechado
As curtas-metragens são por natureza um formato ingrato. Quase invisíveis fora de um circuito restrito de festivais e sessões especiais, quase impossíveis de distribuir comercialmente sem ser pontualmente em complemento de longas-metragens ou em DVD, têm contudo provado ser um autêntico viveiro de revelações, com um peso importante na construção de uma nova geração de jovens realizadores. Uma opção possível é aquela em que a produtora O Som e a Fúria aposta agora, juntando para exibição comercial três produções recentes apresentadas (e premiadas) em vários festivais internacionais num programa de 75 minutos. São filmes que têm em comum uma mesma sensibilidade autoral, ambiental e oblíqua, claramente influenciada pelo cinema de Sandro Aguilar, senhor de um universo consistente e coerente aperfeiçoado ao longo de uma carreira dedicada quase exclusivamente ao formato.
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As curtas-metragens são por natureza um formato ingrato. Quase invisíveis fora de um circuito restrito de festivais e sessões especiais, quase impossíveis de distribuir comercialmente sem ser pontualmente em complemento de longas-metragens ou em DVD, têm contudo provado ser um autêntico viveiro de revelações, com um peso importante na construção de uma nova geração de jovens realizadores. Uma opção possível é aquela em que a produtora O Som e a Fúria aposta agora, juntando para exibição comercial três produções recentes apresentadas (e premiadas) em vários festivais internacionais num programa de 75 minutos. São filmes que têm em comum uma mesma sensibilidade autoral, ambiental e oblíqua, claramente influenciada pelo cinema de Sandro Aguilar, senhor de um universo consistente e coerente aperfeiçoado ao longo de uma carreira dedicada quase exclusivamente ao formato.
Aguilar, igualmente um dos responsáveis da Som e a Fúria, é o autor do melhor dos três filmes do programa, Sinais de Serenidade por Coisas sem Sentido. Trata-se de uma aproximação enviesada ao cinema fantástico que confirma o seu talento para construir ambientes audiovisuais que substituem uma narrativa convencional e deixam água na boca, mesmo que esta curta, estreada em Vila do Conde 2012, nada traga de novo à marca autoral que já lhe conhecemos. O cineasta é igualmente produtor e montador das outras duas curtas, que partilham a exploração de ambientes com resultados francamente mais desiguais.
Miguel Fonseca consegue em As Ondas (terceira curta) capturar a melancolia crepuscular de um Verão que chega ao fim dobrada de incerteza quanto ao futuro (belíssima fotografia de Mário Castanheira), mas não consegue sustentar equilibradamente os 20 minutos da sua narrativa. Quanto a Mariana Gaivão, montadora experiente em tempo de estreia na realização, tropeça em Solo, ensaio atmosférico sobre uma bombeira perdida, cuja distensão temporal e construção não linear escondem um objecto frágil que parece não saber exactamente o que procura. Em ambos os casos, sente-se menos uma identidade própria do que uma busca de caminhos que passa por uma identificação (consciente ou inconsciente, temporária ou não) com outros percursos; se o programa fica um pouco aquém das expectativas, não há como negar a consistência e deseja-se apenas que a experiência possa vir a ser repetida para permitir a estes filmes existir fora do circuito em que estão maioritariamente fechados.