Contos assim-assim: Economia
Um debate político quase interessante. Escaravelhos e pandas. Um tasco e uma conversa quase agradável
Paulo estava em casa, sentado no sofá, a ver um programa de debate político. Estava atento a pormenores, minudências discursivas e gestuais com potenciais conotações. Um dos políticos gesticulava com suavidade. Esboçava um sorriso, a meio caminho entre o trocista e o palerma, que levou um dos adversários ao desespero.
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Paulo estava em casa, sentado no sofá, a ver um programa de debate político. Estava atento a pormenores, minudências discursivas e gestuais com potenciais conotações. Um dos políticos gesticulava com suavidade. Esboçava um sorriso, a meio caminho entre o trocista e o palerma, que levou um dos adversários ao desespero.
O político sorridente apresentava um conjunto ou, com maior rigor, uma manipulação de dados bastante convincente, capaz de transformar o Governo num conjunto de ilustres. O deputado da oposição mantinha-se agitado e, em alguns momentos do debate, parecia babar-se de raiva. Não se chegou a babar, o que, para Paulo, constituía uma perda de espectacularidade.
Ao fim de uma considerável quantidade de baboseiras, mudou de canal e dedicou-se à vida animal. Estava a dar um programa sobre escaravelhos que fazem bolas de fezes. “Merda por merda, fico aqui”, pensou Paulo. Depois dos escaravelhos, chegou a vez dos pandas. "Muito fofinho."
Quando a televisão deixou de ser interessante, desceu para o café da esquina. Um “tasco agradável”, como gostava de o designar. O dono, conhecido como “Chiclete”, situava-se algures entre o crítico literário e o pugilista. Tanto partilhava impressões sobre literatura com alguns dos seus clientes, como descarregava a sua fúria num saco de boxe.
Gostava de competições. Quem pegava no objecto mais pesado, quem comia mais pataniscas de bacalhau, quem cuspia mais longe. Havia duas hipóteses: ou ganhava ou dizia que a competição tinha sido desvirtuada.
Paulo entrou no café e cumprimentou o Chiclete. Este devolveu, com a boa disposição do costume. Adivinhou que Paulo queria uma cerveja. Adivinhar era outra das competições que disputava com regularidade.
A conversa era sobre política. Mais do mesmo.
- Isto é uma cambada de bandidos. – dizia o Chiclete – Só querem tacho.
Paulo entrou no jogo. Falava-se na solução para a crise e o Chiclete tinha três ou quatro ideias, sobre o tema. Paulo discordava de todas e tentou demonstrá-lo educadamente.
- Paulo, pareces um economista a falar. Esses gajos são bons a jogar à sueca, mas só depois de verem os jogos todos. Durante o jogo, não acertam uma.
- Chiclete, eu sou economista.
- Mas tu sabes umas coisas! Não era sobre ti que estava a falar! – Respondeu o Chiclete, embaraçado.
Do fundo do café, veio um comentário de um dos clientes habituais.
- Chiclete, és como um burro.
- O que queres? O que tens a dizer sobre isto?
- Não sei, não sou economista.
- E mesmo que fosses, não sabias na mesma.
Houve silêncio e um embaraço ainda maior do Chiclete.
- Paulo, desculpa lá. Hoje não acerto uma. Pareço um economista.