Tribunal europeu volta a condenar Portugal com multa milionária por atrasos na justiça

Estão há 18 anos à espera de uma decisão judicial no âmbito de um processo de falência. Tribunal europeu condenou Estado a indemnizá-los por danos morais.

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Demora "excessiva" dos tribunais viola convenção dos direitos do homem Rui Gaudêncio

Em causa está mais uma vez a morosidade da justiça portuguesa. Num acórdão divulgado nesta terça-feira, o tribunal decidiu que 217 cidadãos, entre os quais alguns de nacionalidade estrangeira, devem ser indemnizados por  “danos morais”  por continuarem à espera de decisões judiciais em processos que têm entre 14 a 18 anos de duração e que dizem respeito à devolução de  11,5  milhões de euros de que os queixosos se afirmam credores na sequência de um processo de falência de uma sociedade hoteleira  iniciado em 1993.

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Em causa está mais uma vez a morosidade da justiça portuguesa. Num acórdão divulgado nesta terça-feira, o tribunal decidiu que 217 cidadãos, entre os quais alguns de nacionalidade estrangeira, devem ser indemnizados por  “danos morais”  por continuarem à espera de decisões judiciais em processos que têm entre 14 a 18 anos de duração e que dizem respeito à devolução de  11,5  milhões de euros de que os queixosos se afirmam credores na sequência de um processo de falência de uma sociedade hoteleira  iniciado em 1993.

A 203 dos queixosos o tribunal decidiu que devem ser pagas indemnizações de cinco mil euros. Os outros 15 receberão 4800 euros.  “Fez-se alguma justiça”, comentou ao PÚBLICO o advogado Bernardino Duarte, que os tem representado desde o início nesta saga. Conta que muitos destes seus clientes têm agora 80 ou mais anos e que a sua situação económica também mudou: “Vários deles estão em lares e têm problemas financeiros. Este dinheiro sempre é uma ajuda”.  

Na queixa apresentada em 2009 ao tribunal de Estrasburgo, Bernardino Duarte acusava o Tribunal de Vila real de Santo António e a 6ª Vara Cível de Lisboa de terem  ignorado o que se encontra estipulado na Convenção Europeia dos Direitos do Homem,  que reconhece a qualquer pessoa o direito de ver a sua causa examinada por um tribunal num “prazo razoável”.  Durante o processo, o Governo português, embora tenha reconhecido a demora nos processos,  apelou ao tribunal que tivesse em conta na sua decisão tanto a “complexidade” do caso, como o montante dos créditos ( 34 milhões de euros)  reclamados pelas diversas partes lesadas no processo de falência da antiga sociedade proprietária do Hotel Neptuno , em Monte Gordo.

No acórdão ontem divulgado, os juízes de Estrasburgo reconhecem que o processo reveste “uma certa complexidade”, mas que esta não justifica  uma demora que apelidam de “excessiva” e que não responde à exigência do “prazo razoável” requerido na convenção dos direitos humanos, que consideram ter sido violada pelo Estado português. “O tribunal reafirma que compete ao Estados organizar o seu sistema judiciário de modo a que possa garantir a cada um o direito de obter uma decisão definitiva num prazo razoável”, argumenta-se também na sentença.

Os lesados são pessoas que no final dos anos 80 celebraram contratos promessa para a aquisição de apartamentos situados no então Hotel  Neptuno ( agora Yellow Hotel)  ou para habitação periódica (timeshare). Em 1993, com o início do processo de falência da sociedade proprietária daquele hotel, reclamaram que lhes fosse devolvido o que tinham investido. O processo passou de Lisboa para Vila Real de Santo António e a falência foi decretada em 1996, depois de uma primeira sentença nesse sentido ter sido anulada, mas a lei aplicada pelo tribunal neste caso foi contestada pelos lesados porque não era a que se encontrava em vigor à data do início do processo de falência.  Esta ilegalidade foi reconhecida, em 2001 e 2002, em  acórdãos do Tribunal da Relação de Évora e do Supremo Tribunal de Justiça. Só que quando tal aconteceu  já o edifício do hotel tinha sido vendido, o que segundo Bernardino Duarte foi possível apenas  devido à aplicação, pelo tribunal, da legislação errada.

Entretanto, e ainda antes  da venda do edifício, o liquidatário judicial nomeado pelo tribunal vedou a entrada nos apartamentos aos seus proprietários. Foram interpostas  sete providências cautelares  de restituição da posse destes apartamentos junto do Tribunal d e Vila Real de Santo António.  Só duas foram deferidas, apesar de todos elas terem requerimentos idênticos.   Em Outubro de 2001, o edifício entrou em obras de remodelação profunda e todos os apartamentos foram destruídos para dar origem a suites.

Em 2007, através de Bernardino Duarte, os  lesados apresentaram uma acção contra o Estado português no Tribunal de Vila Real de Santo António que passou depois para o Tribunal Administrativo  de Loulé, onde ainda se encontra pendente.  Afirmam que foram violados, entre outros, o direito à propriedade privada e à inviolabilidade do domicílio e também  “o principio da confiança”. Foi ainda violado, frisam, o “direito a uma justiça célere”. Segundo o advogado, o processo de reclamação dos créditos foi entretanto retirado ao tribunal de Vila Real de Santo António e entregue pelo Conselho Superior de Magistratura a uma juíza de Castelo Branco.  Pelo menos 13 dos lesados morreram desde que o caso foi entregue à justiça.