Bairro do Aleixo perdeu mais de metade dos habitantes
Câmara do Porto critica duramente o sistema judicial, acusando-o de "incapacidade", por causa de processos envolvendo alegados traficantes que moram na Torre 1 do bairro. Torre 4 deve ir abaixo esta sexta-feira.
O Aleixo está a desaparecer, devagar. De cinco torres passou a quatro e, se não houver surpresas, a partir desta sexta-feira restarão apenas três. O que significa que das 320 habitações iniciais do bairro, só ficarão 192 e, destas, 57 já não albergam ninguém. Os números do comunicado emitido, ontem à tarde, pela autarquia indicam ainda que 185 habitações foram desocupadas até este mês, mas que só 141 famílias foram realojadas. Das 44 restantes, 23 entregaram a casa e os elementos de cinco outras morreram. E as restantes 16 foram despejadas por não residirem no bairro em permanência, pela "existência de uma outra habitação própria, débito de rendas à Domus Social e utilização da habitação para actividades ilícitas", refere o documento.
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O Aleixo está a desaparecer, devagar. De cinco torres passou a quatro e, se não houver surpresas, a partir desta sexta-feira restarão apenas três. O que significa que das 320 habitações iniciais do bairro, só ficarão 192 e, destas, 57 já não albergam ninguém. Os números do comunicado emitido, ontem à tarde, pela autarquia indicam ainda que 185 habitações foram desocupadas até este mês, mas que só 141 famílias foram realojadas. Das 44 restantes, 23 entregaram a casa e os elementos de cinco outras morreram. E as restantes 16 foram despejadas por não residirem no bairro em permanência, pela "existência de uma outra habitação própria, débito de rendas à Domus Social e utilização da habitação para actividades ilícitas", refere o documento.
No bairro residem, agora, 188 pessoas na Torre 3, 166 na Torre 2 e 103 na Torre 1. E é nesta última torre que a câmara encontra o grande problema que tem por resolver - como provar aquilo que dá como certo, que "uma parte muitíssimo significativa" dos moradores "está conotada com a prática de actividades ilícitas nas habitações, nomeadamente o tráfico de droga". A câmara quer despejá-los e garante que vai esgotar "todas as formas que possam evitar o [seu] realojamento em outros bairros", mas, para isto, reclama o apoio do sistema judicial, que acusa de estar a falhar.
"São conhecidos processos em que foram absolvidos concessionários do direito de habitação, ou familiares com eles residentes, com fundamento no princípioin dubio pro reo", lê-se no comunicado, que defende: "Numa justiça de malha larga, os arguidos podem escapar pela igualdade das premissas: o produto está em sua casa, mas não é deles; é recebido, preparado, embalado e repartido nas suas residências, mas não dão conta de nada, não se apercebem de nada, não vêem, nem ouvem, nem sabem de nada..."
No documento afirma-se mesmo que a Justiça "parece por vezes "ter razões que a razão desconhece"", defendendo-se: "A incapacidade e ineptidão do sistema judicial revelam-se em muitas fases do processo: por vezes, na deficiente recolha e conservação dos indícios de crime, na sua prova e cabal demonstração em julgamento, nos escrúpulos e garantismos, muitas vezes excessivos, isto para não falar das proverbiais demoras e dilações permitidas pelo sistema. O resultado final não pode ser outro senão um sentimento de alguma impunidade e de frustração, que mina a sociedade nos seus alicerces fundamentais."
A incapacidade de recolher provas para proceder ao despejo dos moradores da Torre 1, suspeitos de actividades ilícitas, é o motivo apresentado pela autarquia para não ter ainda avançado com a implosão deste edifício. Rui Rio deverá, por isso, deixar o futuro desta torre - e das Torres 2 e 3 - para o seu sucessor, já que não é previsível que o autarca consiga avançar com novos processos de demolição antes do final deste último mandato.
Para já, avança a demolição da Torre 4, sem que se saiba ainda, em concreto, o que pretende construir no local o Invesurb, o fundo de investimento que gere o processo do Aleixo e que "ainda não entregou na câmara quaisquer projectos das futuras construções a edificar nos terrenos" do bairro, garante o comunicado. No documento, explica-se que o capital do fundo "foi totalmente realizado", sendo, neste momento, o empresário António Oliveira o principal investidor, com 37%. A Espart detém 33% e a Câmara do Porto 30%.
O município garante ainda que "está em curso a construção e/ou reabilitação do primeiro lote de apartamentos", nas ruas das Musas e de Mouzinho da Silveira, que o fundo se comprometeu a entregar, para realojamento de moradores do Aleixo. Está prevista para este mês a consignação de mais obras e a câmara estima que "até ao fim do Verão estarão concluídos cerca de três dezenas de fogos".
Só o vento pode adiar a implosão
Ninguém entra, só o vento, com caminho aberto nos descascados três primeiros pisos e no 7.º andar da Torre 4. Ainda não há countdown para a implosão de sexta-feira, apenas papéis com números coloridos, por ordem crescente, na sala que foi de um jardim-infantil da Associação para a Promoção Social da População do Bairro do Aleixo. A autarquia entendeu que a "promoção social" passava pelo desmantelamento deste bairro e transferência das pessoas para outros locais.
A Torre 4 será a segunda a vir abaixo, numa metodologia em tudo semelhante à seguida em Dezembro de 2011, para a Torre 5: um perímetro de segurança de 6 hectares, ligeiramente alargado a um quilómetro em volta, a ser controlado, a partir das 8h30, por cerca de 350 elementos de várias forças. Dentro do perímetro, de 410 habitantes, quatro pessoas "com mobilidade muito reduzida", segundo o comandante da Polícia Municipal, Leitão da Silva, terão prioridade na evacuação da zona até à detonação, marcada para as 12h.
O vento que ontem atravessava o prédio já sem vidros, metais e madeiras soprava frio e forte, mas a expectativa é de que sexta-feira as condições meteorológicas sejam bem melhores, assinalava Ricardo Pereira, engenheiro da empresa responsável pela implosão da torre, a Restradas. Em todo o caso, só rajadas superiores a 85 km/h poderiam adiar a detonação e, se chovesse como ontem, as condições até seriam de feição, dada a importância da água para travar a dispersão das poeiras.
Mesmo sem chuva, a água está lá, em dezenas de sacos com pequenas cargas explosivas, no interior dos quatro pisos descascados, em cujos pilares foram instaladas as cargas mais potentes que hão-de mandar o prédio abaixo. A dispersão da água permitirá absorver parte das poeiras, da mesma forma que, no exterior, 16 piscinas insufláveis farão trabalho semelhante, a uma escala maior, impedindo que pó e detritos mais leves sejam projectados para mais longe. De resto, tudo está montado, e sincronizado, para que a torre caia ligeiramente para leste, sobre um terreno vazio, de onde 350 camiões retirarão as 9 mil toneladas de entulho a que será reduzida.