Catarina Alves: Portugal forçou-a a sair, Espanha deu-lhe uma oportunidade

Emigrou com uma mala e dois mil euros para fugir da precariedade. Hoje é directora de um serviço na autarquia de Barcelona

Foto
Catarina Alves tem 34 anos e emigrou para Barcelona em 2007 DR

Já não tem mais do que “dois ou três” amigos em Portugal e do lado de lá da fronteira, em Barcelona, o país parece-lhe “perder a essência” a cada dia. Catarina Alves emigrou “à força” e à aventura em 2007: com uma mala e dois mil euros no bolso. Os amigos foram, aos poucos, fazendo o mesmo - estão em Espanha, em França, na Polónia, no Reino Unido. Em Portugal não.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Já não tem mais do que “dois ou três” amigos em Portugal e do lado de lá da fronteira, em Barcelona, o país parece-lhe “perder a essência” a cada dia. Catarina Alves emigrou “à força” e à aventura em 2007: com uma mala e dois mil euros no bolso. Os amigos foram, aos poucos, fazendo o mesmo - estão em Espanha, em França, na Polónia, no Reino Unido. Em Portugal não.

Para Catarina Alves não foi uma questão de internacionalização. Foi um salto para a frente de quem se cansou dos recibos verdes, dos contratos de poucos meses, de “tirar fotocópias, corrigir cartas, tirar cafés”. A licenciatura em Política Social que não serviu para mais do que isso em Portugal, vale-lhe em Barcelona um emprego na câmara municipal como directora de um projecto de apoio a prostitutas de rua na cidade.

Apesar da elevada taxa de desemprego espanhola, Catarina Alves garante que as oportunidades do lado de lá da fronteira nada têm a ver com as que encontrava no seu país e que fazer parte dos mais de 40 mil portugueses que vivem em Espanha (dados de Janeiro de 2013) ainda compensa. Sobretudo porque a protecção social que o país vizinho dá é bem maior do que existente em Portugal. 

Há um conjunto de soluções “muito simples e económicas” que Catarina Alves lamenta não ver implementadas em Portugal, onde se continua a optar por uma “política de cima para baixo, com programas que não estão adaptados às pessoas”. Em Barcelona “cada bairro tem um centro cívico, organizam-se bancos de horas, mercados, pequenos 'workshops', bibliotecas” e criam-se condições para que “as comunidades se possam entreajudar”, exemplifica. É preciso “reajustar serviços” e abolir “projectos-macro, direccionados para ninguém”.

Catarina Alves tomou a decisão de emigrar depois de tentar uma proposta de trabalho em Lisboa a recibos verdes: 600 euros por mês (líquidos eram 380) a tempo inteiro e com disponibilidade permanente. Foi a gota de água: “Achei ofensivo.” Fez as malas e rumou a Barcelona. Estávamos em 2007 e Espanha longe da crise que hoje também vive. Ao fim de uma semana, Catarina estava empregada numa loja comercial e a ganhar num "part-time" mais do que ganhava em Portugal a trabalhar a tempo inteiro.

O reconhecimento

Depois de concluir uma pós-graduação apostou num voluntariado numa ONG, na área de integração de imigrantes, que acabaria por levá-la ao emprego que tem hoje. “Senti que havia meritocracia, algo que não acontece em Portugal, reconheceram o meu empenho e quando abriu uma vaga contrataram-me”, recorda.

Na ONG, que trabalha dentro da autarquia local, a portuguesa foi evoluindo até uma posição de destaque: de trabalhadora social até directora do Servicio de Atención Socioeducativa, que trabalha junta de prostitutas nas ruas de Barcelona. Ainda este ano completa um mestrado, cuja tese se centra nas mulheres nigerianas que vivem em Barcelona — The European dream amongst female Nigerian migrants in Spain – field work in Barcelona — e que será publicada no Verão. 

Há uma frustração evidente no percurso da portuguesa de 34 anos: “Talvez por ingenuidade altruísta escolhi um curso que tem como objectivo ajudar, dar algo à sociedade. É frustrante que não o possa dar ao meu país.”

Regressar a Portugal é, para já, um cenário “muito improvável”. “Só se tivesse uma oportunidade tão boa ou melhor do que a que tenho aqui e com perspectivas de futuro tão boas ou melhores”, admite. Isto apesar das saudades: da família, da comida, dos rituais. Apesar do arrepio com as manifestações portuguesas (“mais bonitas e com mais poesia” do que as espanholas) e da capa do “El País” no dia 3 de Março: “As pessoas emocionaram-se com os portugueses, com a Grândola e os cravos. Há esse reconhecimento ao nosso povo.”

Reconhecimento que só não se estende aos dirigentes políticos, lamenta: “O Governo sente que tem um compromisso com a troika e que não tem nenhum com o povo. Enquanto for assim nada vai mudar.”