"Grandolar" ainda não chegou a verbo
Esta forma de protesto, o entoar da "Grândola", de tão mediatizada que está a ser, corre o sério risco de ficar banalizada
Para os crentes em forças divinas, o futuro a Deus pertence, pelo que de pouco ou nada servirá estar a fazer exercícios de futurologia sobre como vai ser o jornalismo dentro de “x” anos. À velocidade a que as mudanças tecnológicas, de mentalidades e de realidades se sucedem, creio que é bem mais importante reflectir e agir sobre o modo como o jornalismo está hoje. Agora.
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Para os crentes em forças divinas, o futuro a Deus pertence, pelo que de pouco ou nada servirá estar a fazer exercícios de futurologia sobre como vai ser o jornalismo dentro de “x” anos. À velocidade a que as mudanças tecnológicas, de mentalidades e de realidades se sucedem, creio que é bem mais importante reflectir e agir sobre o modo como o jornalismo está hoje. Agora.
Quanto ao mais, se bem que seja útil discutir e preparar os caminhos que estão por vir, acaba por ser pouco mais do que um interessante exercício mental: há pouco mais de uma década, quem poderia acertar no prognóstico sobre como e em que formatos são veiculadas as notícias em 2013?
Seria bom olhar para alguns dos sinais de alerta deixados no passado para evitar desacertos (digamos assim) semelhantes no presente. Refiro-me em concreto a este momento “viral” que tem vindo a impor-se na actualidade: o “Grândola, Vila Morena”, cantado no auditório de uma escola superior, em Lisboa, à porta de uma reunião com militantes partidários, em Coimbra, à saída de uma palestra, em Londres… Tudo começou, recorde-se, a 15 de Fevereiro, com um grupo de manifestantes a cantar um dos hinos de Zeca Afonso nas galerias do Parlamento, aquando de um debate quinzenal com o primeiro-ministro.
Não estando nunca em causa a liberdade de expressão de quem se sente descontente, e tendo sempre como baliza o cumprimento das regras democráticas, esta forma de protesto, de tão mediatizada que está a ser, corre o sério risco ficar banalizada. Exemplos que podem ser transpostos do passado? Deixo aqui dois: quando, em 2001, Manuel Subtil se barricou nas instalações da RTP, esteve literalmente debaixo do foco mediático e foi notícia em todo o lado; até aqui, era previsível, já que se tratava de uma forma original de protesto (sem julgamentos de conduta); pior foi quando as réplicas se sucederam.
Mais tarde, e após a mediatização de alguns suicídios, houve um acordo entre vários órgãos de Comunicação Social para que fossem redobradas as cautelas para este género de notícia. O livro de estilo da Agência Lusa, por exemplo, refere explicitamente: “A Lusa não noticia suicídios a não ser que a divulgação dessas ocorrências se revista de relevância pública.”
A velocidade da informação
A pressa é, quase sempre, inimiga da perfeição. E se haverá quem defenda a velocidade na transmissão da informação como primado do jornalismo “moderno”, pois uma eventual incorrecção pode ser corrigida logo a seguir, fazer o oposto até pode ser menos apelativo, mas é seguramente o mais acertado. Observar e analisar com minúcia, debater, saber narrar com precisão e ter a preocupação de formar o receptor da mensagem deveriam ser as bases para evitar esta espécie de esquizofrenia informativa.
O que hoje é verdade, amanhã verdade deve ser. O que hoje é coerente, amanhã nexo deve ter. Por isso, não me parece de todo relevante noticiar que dois-cidadãos-dois portugueses tenham entoado “Grândola, Vila Morena”, ainda que em Londres, à saída de um membro do Governo de uma palestra do Fórum Oficial das Instituições Monetárias e Financeiras sobre “O Novo Programa para o Dinamismo Económico de Portugal”. "Grandolar" ainda não chegou a verbo.