"O Impossível", as feridas e os gritos de dor de uma família

Em vários momentos do filme sentimos, efectivamente, medo e terror, sobretudo graças à pureza na representação da realidade que a realização manteve

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Como A. O. Scott, crítico do The New York Times, diz, “O Impossível” é, “à sua maneira, um filme de terror, sendo a natureza a força malévola que ameaça vidas inocentes”. “O Impossível” retrata a história verídica de uma família espanhola que sobreviveu ao tsunami que atingiu a costa sul da Ásia em 2004.

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Como A. O. Scott, crítico do The New York Times, diz, “O Impossível” é, “à sua maneira, um filme de terror, sendo a natureza a força malévola que ameaça vidas inocentes”. “O Impossível” retrata a história verídica de uma família espanhola que sobreviveu ao tsunami que atingiu a costa sul da Ásia em 2004.

Em vários momentos do filme sentimos, efectivamente, medo e terror, sobretudo graças à pureza na representação da realidade que a realização manteve. Uma boa parte do início do filme é dominada por Naomi Watts e Tom Holland (mãe e filho mais velho) que lutam para chegar a terra firme.

Estas cenas foram filmadas em Espanha, num cenário mais fiel ao que vemos do que aquilo que queremos acreditar. Watts e Holland debatem-se com a água e os destroços num tanque gigante, levam com ondas e correntes impiedosas criadas por fortes descargas de água, enquanto estão rodeados de operadores de câmara e luzes. No meio disto tudo: chorar, gritar, mostrar medo e mostrar desespero de forma convincente.

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Leonor Capela, finalista do curso de Ciências da Comunicação, Universidade do Porto

O jovem Lucas diz: “Essa parte foi mais fácil porque, naquele cenário, estava mesmo com medo às vezes!” Desde os primeiros segundos que o realizador Juan Antonio Bayona nos faz sentir o peso de sabermos o que aí vem. Começa sem imagem e apenas com os sons de uma onda aterradora. Depois, um pouco de normalidade. A cada momento estamos em sobressalto, à espera que aquele seja o momento do desastre. Finalmente, a onda atinge a piscina do hotel onde tantos turistas e locais se encontravam e começa, assim, um explícito espectáculo de dor e desespero.

A família que inspirou a história esteve na Tailândia com a equipa de filmagens e os actores para ajudar a manter tudo o mais realista possível. Watts e McGregor estão exímios na interpretação do casal que vê a sua família destroçada pelo inesperado, mas é Holland que nos deixa hipnotizados pelo evoluir da sua maturidade à medida que é abalroado pelos acontecimentos. De acordo com uma entrevista ao jovem actor, a cena mais complexa dá-se no reencontro com a mãe no hospital, em que o realizador lhe pediu para se mostrar zangado com Naomi Watts. Após repetirem algumas vezes, conseguiram o efeito desejado e foi, realmente, um efeito fenomenal que valeu as repetições. Esse e outros momentos específicos durante o filme, tornam-no no gigante emocional que é. São, como era de se esperar, os momentos de interacção humana.

Aqueles que revelam de forma crua a natureza e a fragilidade do ser humano. Por outro lado, estes momentos afastam o filme da natureza de documentário sobre o tsunami e as suas consequências. No entanto, penso que essa sempre foi a intenção de Bayona e da sua equipa: contar esta história especificamente e deixá-la elevar-se ao seu carácter representativo. Embora o tsunami em si se dê no início, é a sua presença atroz ao longo do filme que sensibiliza o espectador.

A história da família Alvarez Belón (no filme apresentada como Bennett) é o centro de “O Impossível” mas as suas feridas, os seus gritos de dor, pedidos de ajuda, as suas lágrimas representam bem os de todas as famílias das 250 mil pessoas que morreram neste desastre. E, impondo-se à dor e crueza desta viagem desumana, vem o factor “verdade” que nos obriga a engolir a falta de esperança, a descrença, o negativismo. O impossível, por vezes, torna-se realidade e não há nada que ninguém possa fazer para o impedir.